quarta-feira, 5 de novembro de 2014

MEU RECADO-2

                                         
     
 Nos tempos da Censura

José Carlos Alexandre

Todos nós jornalistas sabemos que a ditadura burguesa-militar de 1964 investiu furiosamente contra a imprensa independente e alternativa.

E continuou a fazê-lo através da sórdida instituição da censura.

Embora sabemos também que existiam os mais realistas que os reis (militares): editores que procuravam adivinhar o que não seria tolerado e já cortavam e cortavam textos...

Algumas proibições do período se tornaram folclóricas: o veto ao nome do cardeal arcebispo dom Helder Câmara, por exemplo.

Havia coisas ridículas na minha área inicial: de cobertura do sindicalismo (ou do que restava dele).

Camponeses, por exemplo, era palavra vetada. 

O editor a substituía por "lavrador" ou "rurícola"...

Dava vontade de se pegar o paletó e ir embora, ainda que para lutar na guerrilha...

A força dos princípios marxistas-leninistas, contudo, falavam mais alto e a gente partia para cada vez mais atuação nas frentes legais e tidas como ilegais contra o arbítrio. 

Isto até cairmos na campanha das Diretas, com ampla mobilização popular, a ida ao Colégio eleitoral, à vitória de Tancredo Neves , a posse de José Sarney e a saída do último ditador pela porta dos fundos...

Pessoalmente sempre vivi ameaçado pela censura...

Mesmo à época do ex-presidente João Goulart, em que até mesmo o livro de Che Guevara, "Guerra de Guerrilha", era vetado.

E dentro do PCB quem ousava ter certa simpatia pela Primavera de Praga era praticamente colocado no limbo...

Ainda que não fizesse coro com os partidários do eurocomunismo...

E havia retaliações internas de doer...

Eu que assinava sob pseudônimo uma coluna e reportagens no jornal central do PCB, "Novos Rumos", cuja sucursal mineira ficava pertinho da Praça Sete.

Perdi meu espaço para um companheiro que está aí na militância até hoje e que poderá confirmar o que aconteceu...

Simplesmente defendi melhores condições de trabalho numa das então grandes lojas do comércio de Belo Horizonte...

O jornal saiu e logo-logo, perdi o espaço, já que os proprietários da grande Loja era da "burguesia progressista" que até dava contribuição financeira para  o Partido...

Meu emprego, contudo,  foi mantido, ainda que poucos dias...

Passei a escrever sobre sindicalismo no campo, com outro pseudônimo, João Pedro Teixeira, líder das Ligas Camponesas, assassinato na Paraíba, enquanto meu colega passaria a assinar minha então coluna...

História de João Pedro Teixeira é contada no filme "Cabra Marcado para Morrer", de Eduardo Coutinho...

Nem cheguei a ver a nova coluna que estrearia: veio o 1º de Abril de 1964 e o jornal foi fechado...

Só retornei a um emprego fixo dois anos depois, fazendo o possível e o impossível para manter-me íntegro, ligado à política sindical e ao PCB, ainda que num dos maiores representantes da "imprensa burguesa"...

E, ao contrário do que pudesse parecer, não nem muito censurado nem perseguido por minhas ideias...

Quando fui candidato ao Legislativo em 1986, quando José Sarney legalizou todos os partidos,

o jornal até me facilitou espaço em suas edições dominicais..., verdade merece ser dita.

Não ganhei as eleições porque, mais do que o PCB, sou ruim de voto (e todos os candidatos sabiam de antemão que sua missão era divulgar o partido que estava voltando à legalidade perdida em 1946).

No jornal em questão acabei por trabalhar por mais de 45 anos...

Onde exerci todas as funções: repórter-auxiliar, repórter, redator, chefe de reportagem e editor (de Cidades e de Internacional), embora a rigor nunca tenha de deixar de cobrir sindicalismo, ainda que me faltasse tempo...

(Céus, como ando prolixo, talvez seja por influência do escritor grego Sófocles. Só no fim de semana li três vezes sua tragédia "Édipo Rei"...Por sinal adoro a Paideia (quem puder deve ler, são mais de 1600 páginas)

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