segunda-feira, 31 de outubro de 2011

ALERTA! O PODER MILITAR CONTINUA EXERCENDO A TUTELA SOBRE OS TRÊS PODERES DA REPÚBLICA!

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Crédito: i54.tinypic


"...a tutela do poder militar é revelada pelo fato de a Comissão da Verdade, aprovada na Câmara, não passar de uma Comissão “para inglês ver”, ou seja para dar uma satisfação à opinião pública mundial, expressa através das exigências apresentadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA."


Anita Leocadia Prestes (*)

Durante toda a década de 1980 e, em particular por ocasião dos trabalhos da Constituinte e, posteriormente, com a promulgação da Constituição de 1988, Luiz Carlos Prestes denunciou à Nação a tutela exercida pela Forças Armadas – um verdadeiro poder militar – sobre os três poderes da República (o Executivo, o Legislativo e o Judiciário).

Às vésperas da promulgação da Constituição, Prestes assinalava que no Artigo 142 da Constituição é concedida às Forças Armadas, “(quer dizer, aos generais)” a atribuição constitucional de “garantirem... a lei e a ordem”. A seguir, afirmava: “Atribuição constitucional que nem ao presidente da República ou aos outros dois poderes do Estado é tão expressamente concedida”.

Ressaltava, contudo, que a inclusão da afirmação de que “aquela atribuição dependerá da ‘iniciativa’ de um dos poderes de Estado” não passava de uma “reserva evidentemente apenas formal, já que será sempre fácil aos donos dos tanques e metralhadoras imporem a ‘um dos poderes do Estado’ que tome a referida iniciativa”.

Prestes escrevia que o Artigo 142 contraria “conhecido preceito da tradição constitucional de nosso país, que sempre afirmou serem os três Poderes do Estado autônomos, mas harmônicos entre si, não podendo, portanto, nenhum deles tomar qualquer iniciativa isoladamente”.1

A seguir Prestes tratava de não deixar dúvidas quanto à essência do Artigo 142 da Constituição de 1988:
Em nome da salvaguarda da lei e da ordem pública, ou de sua “garantia”, estarão as Forças Armadas colocadas acima dos três Poderes do Estado. Com a nova Constituição, prosseguirá, assim, o predomínio das Forças Armadas na direção política da Nação, podendo, constitucionalmente, tanto depor o presidente da República, como os três Poderes do Estado, como também intervir no movimento sindical, destituindo seus dirigentes, ou intervindo abertamente em qualquer movimento grevista, como vem se fazendo desde os decretos de Getúlio Vargas, de 1931, ou mesmo, voltando aos tempos anteriores, em que a questão social era considerada uma questão de polícia, segundo o senhor Washington Luís.(Idem; grifos meus)

Concluindo, Prestes escrevia: “Muito ainda precisaremos lutar (...) para nos livrarmos dessa interferência indébita e nefasta dos generais, para conquistarmos um regime efetivamente democrático.” (Idem)

Na realidade, o Artigo 142 da Constituição de 1988 continua vigente. Confirma-se a tese defendida por Prestes do poder militar e de sua tutela sobre a Nação.

 Conforme é lembrado pelo diretor do Instituto de Estudos sobre a Violência do Estado (IEVE), professor Edson Teles, “na Constituição de 1988, seu artigo 142 aponta a ingerência militar nos assuntos civis”, questionando a seguir: “Como podem os militares se submeterem aos ‘poderes constitucionais’ (Executivo, Legislativo e Judiciário) e ao mesmo tempo garanti-los?” Edson Teles assinala que, na Constituição atual, “a relação entre militares e civis ficaram quase idênticos (sic) à Constituição outorgada de 1967”, concluindo:
Em uma democracia plena o poder não pode ser garantido por quem empunha armas, mas pelo conjunto da sociedade, por meio de eleições, da participação das entidades representativas da sociedade e dos partidos políticos. Ao instituir as Forças Armadas como garantidoras da lei e da ordem, acaba-se por estabelecê-las como um dos poderes políticos da sociedade.2

A tutela do poder militar sobre a Nação evidencia-se hoje com a existência de documento produzido pelo Estado Maior do Exército, intitulado Manual de CampanhaContra-Inteligência, do qual nem o atual ministro da Defesa tinha conhecimento. Segundo Carta Capital (nº 668, 19/10/11), trata-se de um conjunto de normas e orientações que reúne “todas as paranóias de segurança herdadas da Guerra Fria”, a começar pela prática dos generais de “espionar a vida dos cidadãos comuns”. O manual lista “como potenciais inimigos” praticamente “toda a população não fardada do País e os estrangeiros”, incluindo “movimentos sociais, ONGs e os demais órgãos governamentais”, de “cunho ideológico ou não”.

Da mesma maneira a tutela do poder militar é revelada pelo fato de a Comissão da Verdade, aprovada na Câmara, não passar de uma Comissão “para inglês ver”, ou seja para dar uma satisfação à opinião pública mundial, expressa através das exigências apresentadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA.

 Como diz a deputada Luiza Erundina, “o objetivo expresso do texto do projeto é resgatar a memória para ver a verdade histórica e fazer a reconciliação nacional. Sem tocar em justiça. É incrível, pois todos os países que sofreram ditaduras tiveram comissões da verdade com perspectiva de fazer justiça: Argentina, Uruguai, África, Alemanha” (Carta Capital, nº668) .

Na realidade, o poder militar continua impedindo a apuração dos crimes cometidos pelo Estado durante a ditadura e a punição dos torturadores.

Como era sempre lembrado por L.C. Prestes, tal situação só poderá ser modificada com a mobilização dos setores populares. É necessário, pois, alertar esses setores para o perigo a que todos continuamos submetidos sob a tutela do poder militar!

(*) Anita Leocadia Prestes é professora do Programa de Pós-graduação em História Comparada da UFRJ e presidente do Instituto Luiz Carlos Prestes.

1 PRESTES, Luiz Carlos, “Um ‘poder’ acima dos outros”, Tribuna da Imprensa, R.J., 28/09/1988.

2 TELES, Edson, “Restos da ditadura: por que as Forças Armadas de hoje temem a punição dos torturadores de ontem”, O Globo, Prosa & Verso, R. J., 30/01/2010, p. 5.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Representantes de 21 povos indígenas, pescadores e de povos ribeirinhos ocupam canteiro de obras da Usina Belo Monte


1- Cemig adquire cotas de Belo Monte

2- Ministério público pede ação de inconstitucionalidade do decreto que libera as obras da Usina

O canteiro de obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na região de Altamira (PA), está ocupado por mais de 600 indígenas, pescadores, ribeirinhos e populações ameaçadas pelos impactos sociais e ambientais do grande empreendimento. A ocupação começou na madrugada de quinta-feira (27).
Foto: Rebecca Sommer/ Movimento Xingu Vivo


A Rodovia Transamazônica (BR-230), a partir de trecho em frente ao canteiro, na altura da Vila de Santo Antônio, região de Altamira, está interditada e só passam veículos transportando doentes.  

Em assembleia realizada na manhã de quinta-feira, o movimento definiu como principal reivindicação que o governo federal envie autoridades para negociar com os as populações tradicionais o fim das obras de Belo Monte.

Outra decisão tomada pelos ocupantes é que o acampamento no canteiro de obras será permanente e desde já convocam outras entidades e movimentos a cerrarem fileiras nessa luta que, conforme os manifestantes, não irá parar.

Todo o processo de ocupação ocorreu de forma pacífica e é fruto das discussões entre os povos tradicionais durante o seminário “Territórios, ambiente e desenvolvimento na Amazônia: a luta contra os grandes projetos hidrelétricos na bacia do Xingu”.

Com o encontro, se pretendia analisar a conjuntura em torno de Belo Monte e discutir respostas às situações de risco e impactos geradas pela usina. As mesas de debate foram suspensas em vista da ação de ocupação do canteiro de obras.

São 21 povos indígenas envolvidos na mobilização. “Para mim, as pessoas que estão querendo fazer essas usinas, são uma doença. São um câncer que vai matar o planeta. Nós somos o remédio para essa doença!”, disse Davi Gavião que segue: “Sou filho de quem foi impactado por uma usina.

Faz 35 anos que nosso povo foi retirado da sua área e até agora estamos lutando por uma indenização. Faz 35 anos! Essa Belo Monte vai trazer muitos impactos também. Temos que lutar contra todas as barragens! (sic)”.

Entre os pescadores, Raimundo Braga Nunes: “Tenho certeza que depois de Belo Monte vou ser obrigado a mudar de trabalho, porque peixe não vai ter. Vai morrer, ou vai migrar. Eu não me calo, estou pronto para brigar, preparado. Convido nossos amigos indígenas para somar forças para proteger nosso rio. O Xingu é nosso pai e mãe”.
Foto: Rebecca Sommer/ Movimento Xingu Vivo


Decisão adiada

Quarta-feira (26), as populações impactadas viram o desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) Fagundes de Deus votar contra a Ação Civil Pública que pede a paralisação das obras de Belo Monte. Conhecedor do setor energético, o desembargador se posicionou tendo como base a experiência adquirida na área, pois já advogou para a empresa Eletronorte.  

Impetrada pelo Ministério Público Federal (MPF), a ação é um recurso de apelação onde se pede o cancelamento do licenciamento ambiental e a inconstitucionalidade do Decreto 788/2005 do Congresso Nacional – que libera a obra sem a realização da consulta de boa fé aos povos indígenas do Xingu e populações tradicionais, tal como diz a Constituição Federal e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

A desembargadora Maria do Carmo Cardoso, terceira a votar a matéria durante a sessão desta quarta-feira doTRF-1, em Brasília (DF), pediu vistas da Ação Civil Pública e interrompeu o julgamento – programado para entrar em pauta no dia 9 de novembro.  

Dessa forma, a ocupação é também uma resposta a postura da Justiça que apesar de todas as irregularidades, 11 ações denunciando ilegalidades no processo de Belo Monte em tramitação, além de pareceres contrários à obra trabalhados por um painel de especialistas e MPF, não interrompe as obras. Sobretudo, não reconhece a e leva em conta a opinião das comunidades que agora ocupam o canteiro.

Primeiro voto: a favor da ação

O primeiro voto dos desembargadores do TRF-1, no último dia 17, declarou inválidas a autorização e licença ambiental para Belo Monte.  

“É de nenhuma eficácia a autorização emitida pelo parlamento”. Com essas palavras a desembargadora Federal Selene Maria de Almeida desqualificou o Decreto Legislativo nº 788/2005 do Congresso Nacional que autorizou a construção da usina de Belo Monte. Ela considerou igualmente inválido o licenciamento ambiental de Belo Monte.

Num voto elaborado e denso, a desembargadora acatou a maioria dos pontos apresentados pelo MPF/PA, sendo o argumento mais importante o fato de as comunidades indígenas afetadas pela usina de Belo Monte não terem sido consultadas a respeito, conforme mandam a Constituição Federal e tratados internacionais, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2004 (Decreto nº 5.051/2004).

Ela não deixou dúvidas sobre a necessidade das oitivas: “A Constituinte prescreve que sejam ouvidas as comunidades indígenas afetadas. Para protegê-las”. Em seu voto, Selene reafirmou o posicionamento já adotado pelo TRF-1 quando da primeira avaliação da matéria, em 2006.

A imprensa de Belo Horizonte publica notícias sobre a participação acionária da Cemig e da Light na Usina Belo Monte.(Com o Brasil De Fato)

terça-feira, 25 de outubro de 2011

A PROPAGANDA ENGANOSA E O REFORMISMO​



Nota política do PCB-Partido Comunista Brasileiro

O programa institucional do PcdoB, exibido na televisão na última quinta-feira, revela sem disfarce seu reformismo e oportunismo, além de sua falta de escrúpulos. Assistimos uma grosseira falsificação da história.

Se nosso Partido fosse legalista, poderíamos reclamar no Procon, no TSE, na justiça comum, contra a tentativa de seqüestro da história do PCB: propaganda enganosa, falsidade ideológica, estelionato político, apropriação indébita.

Todas as pessoas razoavelmente informadas, todos os intelectuais, historiadores, militantes políticos e sociais sabem que o PcdoB foi fundado em 1962, por uma insignificante minoria do Comitê Central do PCB, após ser fragorosamente derrotada no V Congresso do nosso Partido. Não foi o único partido maoísta (com nosso respeito ao inspirador político desta corrente) fundado no início dos anos 60.

 Em quase todos os países, invariavelmente por iniciativa de minorias dos Partidos Comunistas fundados na década de 20, no bojo da Revolução Russa, surgiram novos partidos ligados ao Partido Comunista Chinês, então em divergência com o da União Soviética. Esses novos partidos adotaram como receita universal a experiência chinesa de revolução do campo para a cidade. Este também foi o caso do PcdoB que, aprofundando o afastamento das posições soviéticas, alguns anos depois se ligou ao Partido do Trabalho da Albânia, aderindo de corpo e alma às formulações teóricas de Enver Hoxha.

Num roteiro de farsa, o PcdoB, que em 2012 comemorará 50 anos anunciou que completará 90, apropriando-se, de forma oportunista, de uma história que sempre repudiou e negou, sobretudo a ligação do PCB com o Partido Comunista da União Soviética, com o Movimento Comunista Internacional e inclusive com a Revolução Cubana, da qual esses dissidentes foram ferrenhos opositores.

Esta tática – de renegar hoje sua própria trajetória para tentar se apropriar da história que rejeitaram em 1962 - vem sendo aplicada em razão de uma realidade que os dirigentes desse partido nunca imaginaram possível: a reconstrução revolucionária do PCB. Com a transformação do PcdoB numa organização social-democrata na prática (na linha política e no caráter do partido), precisam fingir que são o PCB, fundado em 1922, confundindo a opinião pública.

Para falsificar a história, exibiram como membros do PcdoB camaradas que morreram antes da criação deste partido e outros que, na cisão de 1962, notoriamente ficaram com a maioria, permanecendo no PCB.

A manipulação mais grosseira, absurda e desrespeitosa foi a de querer reivindicar os legendários Luiz Carlos Prestes e Olga Benário como expressões do partido que fundaram em 1962. Na verdade, os principais protagonistas dos embates políticos travados no momento desta cisão foram João Amazonas, que liderou a fundação daquele PCdoB original, e Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança, que ficou no PCB e foi seu Secretário Geral até 1979, quando saiu do Partido, por divergências com a maioria de sua direção.

Se o verdadeiro comunista João Amazonas estivesse vivo ficaria envergonhado de assistir à manipulação de sua própria história e pelo reformismo que tomou conta do partido que criou, pensando que seria revolucionário.

No conteúdo político do programa o reformismo aparece com toda a sua expressão. Em 2011, exibem um programa eleitoral voltado para as eleições de 2012! Como todos os partidos da ordem, passam os anos ímpares se preparando para as eleições dos anos pares!

Com efeitos especiais, exibiram cinco atuais parlamentares que já estão em campanha para prefeituras, uma manobra comum a todos os partidos eleitoreiros. No meio de seus mandatos, sem risco de perder nada, senadores e deputados federais se candidatam a prefeitos de grandes cidades. Ganham de qualquer forma. Vencendo as eleições, se tornam prefeitos. Se as perdem, antecipam em dois anos a campanha para sua reeleição ao parlamento.

O discurso pasteurizado apresentado por esses candidatos não tem qualquer diferença com o de qualquer político profissional da burguesia. Eis os adjetivos com que definem como serão as cidades que governarão, caso eleitos: limpas, tranqüilas, planejadas, de paz, organizadas, humanas, sustentáveis, dignas, justas.

Em 10 minutos de programa, não houve menção alguma ao imperialismo e ao capitalismo. Parece que, para esse partido, nem o imperialismo está inventando guerras contra os povos nem os trabalhadores do mundo estão lutando contra as retiradas de seus direitos, em meio à crise sistêmica do capitalismo. Pelo contrário, a principal proposta apresentada pelo presidente nacional do partido é uma conciliação de classe: um pacto social para um maior desenvolvimento capitalista do Brasil, envolvendo, numa união nacional, o governo, os trabalhadores e o empresariado.

Jovens, certamente aspirantes a vereador, aparecem no programa se dizendo socialistas (não comunistas) e explicam o que significa ser socialista. Segundo eles, ser socialista “é fazer as cidades mais justas”, “é ser ético sempre”, ”é tratar as pessoas com dignidade”, “é ser responsável com o dinheiro público”.

Aliás, por falar em dinheiro público, o PCB, na crítica política e ideológica que faz ao PcdoB, não centrará suas divergências nas recentes denúncias contra o Ministro dos Esportes. Ficamos com o benefício da dúvida, aguardando os desdobramentos do caso e a apuração das denúncias, pela CGU, MPF, Polícia Federal, Procuradoria Geral da República, STF e inclusive pelo TCU, sobre supostos desvios, no total de R$49 milhões, que teriam ocorrido em 67 convênios do Ministério dos Esportes com entes públicos e privados, entre os quais muitas Ongs, algumas de fachada. Esta pode ter sido, inclusive, a principal motivação da candidatura do deputado Aldo Rabelo a Ministro do TCU.

Mas, como dissemos, nossa discussão é no campo político, na tática e na estratégia que devem adotar os que se reivindicam comunistas.

Até porque não somos falsos moralistas e não entramos na onda da direita que trabalha o tema da corrupção (inerente à política institucional na sociedade capitalista) para afastar os trabalhadores de seus verdadeiros partidos e da luta política, indispensáveis para acabar com a exploração. Estimulam o onguismo e o movimentismo, de forma a que os cargos públicos sejam ocupados majoritariamente pelos de cima, alguns originários das classes dominantes, outros terceirizados.

A luta do PCB contra a corrupção é aberta e radical, no sentido de ir às raízes do problema. É parte da luta contra o capitalismo. Dizemos claramente que a corrupção é inerente ao capitalismo, é sistêmica. De alguma forma, mais ou menos ”esperta”, é usada por todos os partidos que apostam e jogam no cassino da democracia burguesa, onde a concorrência depende de financiamentos privados e caixas dois.

Nas eleições de 2010, o PcdoB recebeu doações da Coca-Cola, do Bradesco e do MacDonald's, empresas patrocinadoras das Olimpíadas de 2016 e da Copa do Mundo de 2014, eventos coordenados pelo Ministério dos Esportes.

Independente dos resultados da apuração das denúncias, um fato já é cristalino: integrado ao sistema, o PcdoB, durante os nove anos em que dirige o Ministério dos Esportes e outros espaços de poder, se enredou na promiscuidade com esquemas, públicos e privados, e com delinquentes como o que hoje acusa o Ministro, mas que já foi filiado e candidato pelo mesmo partido do acusado. Não se armam esquemas de financiamento eleitoral sem sujar as mãos, sem acordos pragmáticos e espúrios que levam partidos com história de luta a conciliarem com o agronegócio e o capital em geral, com torturadores e assassinos, com as multinacionais do petróleo. Um partido que se diz comunista mas que participa acriticamente dos governos burgueses que lhe abram as portas, se torna um bombeiro da luta de classes, refém de seu oportunismo, para não perder seus cargos.

É notório que, como nos casos de Ministros caídos e por cair, independentemente de seu partido, sempre há fogo amigo ou inimigo. Os políticos profissionais e a mídia burguesa trabalham com dossiês contra todos, inclusive aliados de ocasião; não se sabe o dia de amanhã! Mas só é abatido na luta pelo poder no estado burguês quem tem telhado de vidro. Não adianta vir agora evocar o anticomunismo como causa das atuais denúncias, até porque não se comportam como comunistas, apesar do nome. Os cinco Ministros que já foram abatidos no governo Dilma eram de partidos da ordem. Um deles era da cota pessoal do maior dos oligarcas brasileiros, o indefectível José Sarney. E assim mesmo caiu!

Na década de 80, eram poucas as diferenças entre o PCB e o PCdoB. Ambos eram reformistas e apostavam tudo na questão eleitoral, em aliança com partidos burgueses. A diferença é que, enquanto a militância do PCB, em 1992, derrotou seus reformistas, no PcdoB os reformistas não só ficaram mais reformistas como se multiplicaram, alguns já sendo deformados desde a juventude, para garantir o reformismo futuro. A UNE, de saudosa memória, transformou-se numa escola de quadros e parlamentares reformistas.

A causa da voracidade por “recursos não contabilizados” é o reformismo deslavado. A prioridade na ocupação de cargos públicos, seja de que esfera ou instância for, é de tal ordem que até a atuação dos seus militantes de base nos movimentos populares (muitos deles honrados e combativos, alguns ainda comunistas) está atrelada aos objetivos eleitorais de um partido que incha, que filia pela internet futuros candidatos, venham de onde vierem, mesmo do PMDB, PSDB ou DEM e até criaturas sinistras que depois se voltam contra seus criadores, por questões de partilha.

Esperamos que um partido intitulado comunista não caia na vala comum dos partidos burgueses, abatido por aqueles que querem o Ministério dos Esportes não para acabar com a promiscuidade, mas para administrá-la. Ou o PcdoB se depura e corrige seu rumo ou que mude de nome, o que seria uma atitude de respeito aos verdadeiros comunistas.

O desgaste provocado pela degeneração do PcdoB tem sido muito grande para a luta dos comunistas e outros revolucionários, permitindo à mídia hegemônica criar uma imagem de que todos são “farinha do mesmo saco”, inclusive os comunistas.

O PCB não pode e não deve abrir mão de se diferenciar dos reformistas e oportunistas, para que os trabalhadores não os confundam com o nosso Partido. Não podemos deixar de zelar pela memória de todos nossos camaradas que honraram o PCB , muitos pagando com a própria vida, e por uma história de 90 anos de luta, heróica, cheia de erros e acertos, de vitórias e derrotas, de perseguições e acusações de toda sorte, mas sempre de mãos limpas.

VIVA OS 90 ANOS DO PCB!

PCB – Partido Comunista Brasileiro

Comitê Central

25 de outubro de 2011

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Conferência Estadual do PCB no Barreiro


Participantes da  Conferência Municipal de BH



Conferência Política Estadual - 29 e 30 de outubro de 2011

Etapa Estadual Conferência Política Nacional


Inscrições :

PCBMINAS@IG.COM.BR - (31) 32016478

Taxa de colaboração - R$10,00.


PROGRAMAÇÃO:


29 de outubro de 2011 (Militantes e convidados do Partido)


11 horas - Abertura.


12 horas - Almoço


13 horas - Primeira parte - UMA ESTRATÉGIA SOCIALISTA


18 horas - Jantar


19 horas -

Plenária da Corrente Sindica UNIDADE CLASSISTA


Plenária da União da Juventude Comunista - UJC


30 de outubro de 2011 (Militantes)


07 horas - Café da manhã.


08 horas - SEGUNDA PARTE - Mediações na Luta de classes (tática) e operações táticas.


12 horas - ELEIÇÕES DOS DELEGADOS À CONFERÊNCIA POLÍTICA NACIONAL DO PCB.

Local: Alojamento MST-MG: Av. Olinto Meirelles, n 2634, bairro Barreiro de Cima

domingo, 23 de outubro de 2011

Orlando Silva. Imagem: ABr

    É preciso separar o joio do trigo

Rogério Castro (*)

Se ainda há algum espaço para um debate ideológico na atual cena pós-moderna, eis então um que não tarda por esperar. No último final de semana, a revista Veja publicou mais uma falcatrua envolvendo o chamado Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Como nos conta ninguém menos que Leandro Konder, após a morte de Stalin, na antiga URSS, e as denúncias proferidas pelo novo secretário-geral do PCUS Khruschev sobre o que ele chamou de "culto à personalidade", os abalos no movimento comunista internacional se fizeram sentir em toda parte, inclusive aqui no Brasil.

O PCdoB, surgido dum racha do PCB, é produto desse processo. Sob o impacto da revolução na China, esse partido se insere na luta armada, na crença de que a revolução iria se encaminhar da periferia (“campo”) para o centro (“cidade”). O massacre do Araguaia, pode-se dizer, foi o auge daquela malfadada tentativa de promover mudanças estruturais na sociedade brasileira.

Os tempos mudaram, e as táticas, agora para se chegar ao poder, também. O PCdoB, depois dos anos 80 com a concorrência do PT, não se importou em ser o aliado coadjuvante deste partido e, mais tarde, das chamadas “frentes populares”.

As suas práticas, para quem conhece o movimento popular brasileiro por dentro, são assaz conhecidas: vão das fraudes sem limites (de atas, documentos até eleições) e ameaças de agressão física no movimento sindical às criações de entidades de fachada, de cima para baixo, sem nenhuma organicidade, feitas única e exclusivamente para forjar (e monopolizar) uma representatividade inautêntica e ilegítima do segmento em questão.

A União Nacional dos Estudantes, outrora orgânica e combativa, sob o domínio ininterrupto em sua direção desse partido, desfigurou-se, deixou de ser sinônimo de rebeldia e ousadia para ser o que hoje ela é: um espaço onde os jovens, ao invés de pioneirismo e rebeldia característicos, são objeto de manipulação segundo os interesses do partido, e todo vigor de suas energias e criatividade é desviado dos problemas centrais e contemporizado com questões menores. Aliás, o ministro que a Veja acusa de ter recebido “dinheiro na garagem” vem de lá; podemos dizer que sua escola política foi esta UNE.

Certa vez, indagado por um entrevistador sobre o PPS, o atual secretário-geral do PCB – o Partido Comunista Brasileiro –, Ivan Pinheiro, respondeu: “Aquilo lá é um caso de Procon”. A ironia feita por Pinheiro era em relação ao termo “socialista” representado pela última letra daquela sigla.

O mesmo serve aqui, por analogia, para o “caso” do PCdoB. Ninguém vai duvidar, ou é preciso ser muito incauto, que quem frauda urnas em eleições sindicais, ou faz do voto na época da eleição moeda de troca (você me dá seu voto, e aqui está sua recompensa), vai ter o pudor de no ministério, “administrando” quantias milionárias de recursos, governar sem se servir de expedientes ilícitos.

 Mas aqui se interpõe um dilema: “Não será que os fins justificariam os meios?”. Mas, então, quais seriam os “fins” do PCdoB, para que a interpretação "maquiavélica" portasse algum sentido digno?

Essa é a questão. O PCdoB não faz nada – nem no campo político, nem no campo popular –, na prática, para justificar a manutenção em sua sigla da letra “C”, a que abrevia “Comunista”.

O seu “Programa Socialista para o Brasil”, apesar de aparentemente antenado com o debate em curso e de toda sua retórica (em tese), não passa, na prática, de uma construção abstrata, aponta para uma sociedade ideal nunca a ser alcançada, mas para a qual devemos marchar, como se esta viesse um dia, sem data e hora marcadas, do céu ao encontro da terra.

Mas o problema é que da fé que têm os cristãos no apocalipse os “comunistas” do PCdoB são todos ímpios.

Em que consistiria, então, o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento, vinculado à transição para o socialismo, defendido no Programa? Qual é o núcleo desse projeto e, por conseguinte, da sua “perspectiva de socialismo”?

Aqui se desfaz o castelo de areia. Como não é uma construção abstrata, segundo os fundadores do socialismo científico a sua proposta consiste única e exclusivamente na superação, do ponto de vista concreto, do trabalho assalariado pelo trabalho “livre-associado”, ou emancipado, como dirá um dos seus signatários, o filósofo alemão Karl Marx.

Como a sociedade no seu todo se estrutura a partir do trabalho, a mudança na sua forma, superando a parcela do trabalho que não é paga pela repartição de toda a produção conforme as necessidades de toda a coletividade social, já sem classes, significaria, por consequência, o fim dos conflitos econômicos, do Judiciário como regulador dos mesmos, da escassez, da destruição ambiental, etc. Seriam, portanto, estas as diferenças concretas da sociedade vigente para a socialista, bem como os indicadores de uma e de outra numa perspectiva de transição orgânica para a segunda, também conhecida como primeira fase do comunismo.

O PCdoB – já que um dos seus inspiradores teóricos não desvencilhava nunca teoria da prática, ao contrário, dizia ser esta última o critério da verdade – está por demais longe de uma consistente convergência programática com os postulados do materialismo histórico e dialético defendidos pelos fundadores do socialismo científico.

Não faz jus, programática e praticamente, ao que a matriz fundante desta tradição, permeada de desvios e deturpações, legou e ressoou como bases para edificação de uma nova sociedade. O episódio do ministro Orlando é só mais um entre vários outros a confirmar esta tese.

(*) Rogério Castro é jornalista e mestre em serviço social

(Publicado pelo sítio do PCB)

sábado, 22 de outubro de 2011

Vamos desfazer qualquer dúvida que ainda possa haver


As principais diferenças entre o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e o Partido Comunista do Brasil (PC do B)

Igor Grabois e Edmilson Costa 
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(São Paulo – 2009)
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Geralmente, grande parte das pessoas não compreende a existência de dois Partidos Comunistas no Brasil. Muitos até confundem as duas organizações como se fossem a mesma coisa. Até mesmo parte dos militantes também acha que a diferença entre PCB e o PC do B é apenas tática, afinal os dois partidos se reivindicam comunistas.

 No campo internacional, há também certa confusão sobre a existência de dois Partidos Comunistas no País, afinal já não existe mais a União Soviética, nem o maoísmo do Livro Vermelho ou o albanismo de Enver Hoxha. Para esclarecer essa aparente confusão, decidimos colocar claramente, tanto para as pessoas pouco familiarizadas com as sutilezas da esquerda, quanto para os militantes em geral, as principais diferenças históricas, políticas, estratégicas, táticas e de concepção partidária entre o PCB e o PC do B, de forma a reduzir a confusão e deixar claro essas diferenças.
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Parte I

.1.1 As Condições Históricas
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1) Primeiro, é necessário enfatizar o caráter histórico desta questão. O PCB (Partido Comunista Brasileiro) é o partido histórico dos comunistas brasileiros, reconhecido pela Internacional Comunista e pelos partidos comunistas que se alinhavam com a antiga União Soviética. Fundado em 1922, com o nome de Partido Comunista do Brasil e a sigla PCB, no início dos anos 60, em função da possibilidade de legalização e para evitar provocações da direita, que afirmava ser o PCB apenas uma sucursal da Internacional Comunista, o partido trocou o nome de Partido Comunista do Brasil para Partido Comunista Brasileiro, de forma a enfatizar o caráter nacional do Partido. Essa foi uma decisão da absoluta maioria do partido visando a sua legalização.
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2) A partir de relatório do XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PC URSS), que denunciava os desvios à legalidade socialista e o culto à personalidade nos tempos de Stalin, ocorreu uma grande discussão no interior Partido, na época uma organização com cerca de 50 mil militantes em todo o País. Um pequeno grupo de companheiros, inconformados com o apoio do partido ao Relatório Kruschov e com o documento conhecido como Declaração de Março, de 1958, no qual o partido adequava sua política às novas circunstâncias, resolveu abandonar o PCB e criar outra legenda.
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3) Liderados por Mauricio Grabois, João Amazonas e Pedro Pomar lançam a Carta dos Cem (Em defesa do Partido, assinada por cem militantes, em quatro Estados do País) e iniciam a formação de um outro partido. Vale ressaltar que esses companheiros foram derrotados no V Congresso do PCB, realizado em 1960, por amplíssima maioria. No entanto, após a derrota, esses companheiros se apropriaram do nome anterior do PCB (Partido Comunista do Brasil), e colocaram no novo partido a sigla PC do B, que aparece pela primeira vez na história política brasileira – isso em 1962.
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4) Antes do golpe militar, em 1963, os dirigentes do novo PC do B tentaram o reconhecimento da União Soviética, mas não obtiveram êxito. Da mesma forma, tentaram aproximação com Cuba, tanto que foi exatamente Maurício Grabois, o principal líder dos dissidentes, quem traduziu para o português o clássico Guerra de Guerrilhas, de Ernesto Che Guevara. Mesmo assim, também não conseguiram o apoio dos cubanos. Talvez seja por isso que em 1965 o PC do B tenha publicado um documento chamado Resposta a Fidel, acusando o líder cubano de aderir ao revisionismo soviético.
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1.2 O golpe militar e o posicionamento dos partidos
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5) Após o golpe militar, esse pequeno grupo dissidente passou a alinhar-se às teses do Partido Comunista Chinês e à forma de luta com a qual os chineses derrotaram as forças conservadoras naquele País – a guerra popular prolongada, na qual o campo deveria cercar as cidades, sob a direção de um exército popular de base camponesa. Foi baseado nestas teses que a direção do PC do B desenvolveu a estratégia da guerrilha rural para o Brasil, mais conhecida como Guerrilha do Araguaia.
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6) Esta nova política foi sintetizada, em 1969, no documento Guerra Popular – Caminho da Luta Armada no Brasil, no qual afirmava a superioridade de sua estratégia sobre o foquismo então vigente na maioria das organizações que o praticavam na América Latina e previa a guerrilha e a criação de um território livre no interior do Brasil, a partir do qual faria a guerra popular prolongada contra a ditadura militar. Surpreendentemente, recente coletânea publicada com os documentos do PC do B, de 1960 a 2000 (Em Defesa dos Trabalhadores e do Povo Brasileiro), os editores do PC do B omitiram este documento, talvez por temerem que seu posicionamento do passado pudesse atrapalhar sua linha política atual.
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7) Ainda na primeira metade da década de 60, a direção do PC do B enviou quadros para realizar treinamento militar na China e se transformou no representante oficial do maoismo no Brasil. A partir da segunda metade dos anos 60, deslocou os primeiros militantes para a região do Bico do Papagaio, no Sul do Pará, (uma área de conflitos e luta pela terra) para organizar a futura guerra de guerrilhas na região, colocando em prática sua nova linha política.
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8) Vale ressaltar que nesse período o Brasil era um País industrial, o “milagre econômico” estava começando, a classe operária aumentando exponencialmente, o processo de urbanização acelerando-se com a intensa migração do campo para a cidade e a grande maioria da população vivia nas grandes metrópoles. Enquanto isso, os companheiros do PC do B tinham uma avaliação do País inteiramente diferente, na verdade um profundo desconhecimento da realidade brasileira.
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9) Em sua resolução política de 1967 afirmavam o seguinte: “A tática do partido exige que sua atividade se realize fundamentalmente no interior do País. Isso é determinante não só pelo fato de que os homens do campo constituem a força básica da revolução, mas também porque o interior é o cenário mais favorável à luta armada (…) Nele reside o maior potencial revolucionário do País. A quase totalidade da população é pobre e vive em condições dificílimas. Esta sofrida e vasta população do interior é que constitui a mola real da revolução”.
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10) No mesmo documento o PC do B procurava diferenciar suas posições da linha política do PCB. “A frente única defendida pelo partido reformista (se referia ao PCB) é tipicamente reformista. Decorre da concepção de que é possível libertar o País gradualmente pelo caminho pacífico (…) O partido reformista trata de alcançar algumas liberdades democráticas, eleições diretas, etc. Ao contrário, a frente única preconizada pelo PC do B deriva da concepção de que não se pode livrar o País do imperialismo e da reação sem a derrubada violenta do poder das atuais classes dominantes”. 
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11) Ressalte-se que o Brasil conquistou a democracia pela via pacífica, através da Frente Democrática, com os limites e debilidades próprios da correlação de forças na sociedade brasileira, a guerrilha do Araguaia foi aniquilada e quase todos os seus heróicos integrantes (quase todos jovens estudantes) foram massacrados pelas Forças Armadas, muitos dos quais assassinados após serem capturados vivos. No entanto, surpreendentemente, o PC do B não realizou no período qualquer balanço crítico ou autocrítico dessa estratégia de luta.
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1.3 A fusão com a Ação Popular (AP)
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12) A partir do final da década de 60 o PC do B começou as primeiras discussões com um grupo político de origem cristã, a Ação Popular (AP), que também na época estava muito influenciado pelas teses de Mao-Tse-Tung. Essa aproximação posteriormente iria mudar radicalmente o destino do PC do B. Oriundo da esquerda católica, com forte influência no movimento estudantil universitário e secundarista e com trabalho político no movimento camponês, em função de suas ligações com a igreja católica, a Ação Popular também simpatizava com as teses maoistas de Guerra Popular Prolongada. Ao abandonar o cristianismo, a AP encontrou no maoísmo a nova bandeira para preencher seu vazio ideológico e no PC do B o irmão mais velho que realizava a caminhada segura rumo à luta armada.
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13) É importante frisar que a Ação Popular era um agrupamento político muito maior que o PC do B, com uma base social na cidade e no campo que o PC do B não possuía. A simpatia pelo maoísmo serviu para aprofundar as discussões, aparar arestas e buscar identidades. Esse processo culminou com a decisão da maioria AP de se incorporar ao PC do B em 1973. Ressalte-se que inicialmente a direção do PC do B manifestou resistência em relação à fusão com a Ação Popular porque considerava esta organização pequeno burguesa e inconseqüente do ponto de vista da luta armada. Esta avaliação está no documento (Acerca da Proposta da AP) - também surpreendentemente omitido na citada coletânea de documento do PC do B -, onde se avaliava que a estratégia das duas organizações era diferente: o PC do B tinha uma estratégia etapista (nacional libertadora), enquanto a AP tinha como estratégia a revolução socialista.
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14) Por influência dos chineses, que queriam um partido com maior influência política e numérica para se contrapor aos partidos de linha soviética, a Ação Popular rebaixou a sua estratégia, reconheceu o PC do B como legítimo partido do proletariado brasileiro e incorporou no PC do B toda a sua estrutura nacional de organização, indicando ainda seus principais quadros para o Comitê Central do PC do B, o que prontamente foi aceito. Naquele momento os oriundos da AP equivaliam a um terço do Comitê Central do PC do B.
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15) Essa união iria mudar os rumos do PC do B, especialmente após a derrota da Guerrilha do Araguaia. Aliás, a tragédia da guerrilha foi dramática para os quadros históricos do PC do B: o comandante militar da guerrilha, Mauricio Grabois, a principal liderança teórica e política do PC do B, morreu em combate. Posteriormente, em 1976, foram assassinados outros dois dirigentes históricos, Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, no episódio que ficou conhecido como O Massacre da Lapa.

A derrota no Araguaia, as quedas de 1972, e as mortes na Lapa praticamente dizimaram a direção mais experiente e histórica e com tradição comunista do PC do B: para se ter uma idéia, entre 1972 e 1976 o PC do B perdeu seus melhores quadros: Carlos Danielli, Lincoln Oest, Luis Guilardini, Maurício Grabois, Pedro Pomar, Armando Teixeira Frutuoso, Ângelo Arroyo, todos assassinados pela repressão, inclusive os quadro mais jovens do Comitê Central, como José Humberto Bronca e Paulo Rodrigues, morto no Araguaia e Lincoln Roque, assassinado pela repressão em 1972.
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16) Os quadros históricos mais experientes do Comitê Central foram morrendo posteriormente ou se afastando do partido. Em 1978, Jover Telles foi expulso do PC do B por ser considerado traidor da organização. Diógenes de Arruda Câmara, que esteve exilado em Portugal, morreu naturalmente logo após ter voltado para o Brasil em 1979. Dessa forma, em 1979, a direção histórica do PC do B já tinha praticamente desaparecido, restando apenas João Amazonas, Elza Monerat, Dinéas Aguiar e José Duarte, este último afastado do PC do B pelo Comitê Central em 1987 por divergências com a organização.
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17)A partir daí, os militantes oriundos da Ação Popular passaram a controlar os principais postos de direção no PC do B, a sua política e sua concepção de partido. Progressivamente, os antigos militantes do PC do B foram morrendo ou se afastando da organização por divergir dos rumos políticos tomados pelo PC do B sob nova direção, tanto que hoje resta apenas um dirigente no Comitê Central oriundo do antigo PC do B de 1962. Em outras palavras, o PC do B virou a AP e a AP virou o PC do B.
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18) Se mesmo com os quadros históricos ainda vivos, o PC do B teve uma avaliação equivocada da realidade, com a emergência da Ação Popular à direção do PC do B, o comportamento dessa organização se tornou errático. Em 1978, o PC do B reformulou profundamente sua linha política, mas sem sequer uma palavra autocrítica sobre as posições do passado. Em sua conferência de 1978, passou a ter como centro da tática a luta pela redemocratização do País e a construção de uma ampla frente democrática para derrubar o regime militar, mas ainda mantinha resquícios do passado, quando avaliavam no mesmo documento que se estava “gestando uma situação revolucionária no País”
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19) Ou seja, mais de 10 anos depois da linha traçada pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), no VI Congresso, de 1967, o PC do B conseguiu chegar a conclusões semelhantes. Mas, para se manter fiel às suas oscilações políticas, a partir de 1978 o PC do B começou o rompimento com o Partido Comunista Chinês, sem sequer uma linha de autocrítica. Como é de costume, os companheiros procuraram rapidamente apagar da memória os tempos em que considerava o PC Chinês a vanguarda do proletariado mundial. Rapidamente, o PC do B se alinhou ao Partido do Trabalho da Albânia, do líder Enver Hoxha, e passou considerar a Albânia o “farol do socialismo” da mesma forma que considerava anteriormente Mao Tse Tung o maior marxista da humanidade.
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1.4 A relação com partido albanês
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20) Vale ressaltar que a aliança com o Partido do Trabalho da Albânia foi a mais longeva do PC do B: este partido se manteve fie ao regime albanês até a sua queda, em 1991. Em 1988, por exemplo, o PC do B em seu VII Congresso, ainda afirmava categoricamente: “Não obstante os esforços da burguesia reacionária, com propósito de negar o socialismo, este vive e floresce na Albânia, que resiste firmemente à pressão imperialista-revisionista (…) Sob a direção do camarada Ramiz Alia, que ocupa com destemor o posto deixado pelo saudoso camarada Enver Hoxha, o partido dos comunistas albaneses, o PTA, projeta e realiza à frente do proletariado e do povo a gigantesca obra da edificação socialista, que estimula, pelo exemplo, a luta revolucionária de todos os povos”.
21) Um episódio interessante sobre a coerência do PC do B em relação às suas posições políticas pode ser medido pelo seguinte fato: o Partido do Trabalho da Albânia antes chamava-se Partido Comunista da Albânia, mas por sugestão de Stalin mudou de nome, sob a justificativa de que a maioria dos componentes do partido era de origem camponesa. Quer dizer, o Partido Comunista Albanês pode mudar de nome para Partido do Trabalho e não é considerado revisionista ou traidor do socialismo, mas no Brasil o critério do PC do B é muito diferente.
22) A relação com o partido albanês era tão forte que os militantes do PC do B aprofundaram o culto a Stalin. Em sua conferência de 1978, decidiu que o partido comemoraria 1979 como “O Ano Stalin”. A pequena, camponesa e atrasada economicamente Albânia passou a ser considerada pelos dirigentes e militantes do PC do B “o farol da humanidade”. Muitos dirigentes do PC do B passaram a morar em Tirana, capital albanesa, de onde diariamente transmitiam informações sobre o Brasil através da rádio Tirana.
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23) A partir de Tirana, o PC do B realizou um intenso trabalho de construção de partidos comunistas “marxistas-leninistas” (os chamados MLs) na América Latina e na Europa, agora sob a orientação do Partido do Trabalho da Albânia, cuja atividade principal era denunciar o “imperialismo soviético”, o “revisionismo” dos PCs tradicionais aliados a URSS e a traição da pátria soviética aos ideais do socialismo. Até mesmo em Portugal o dirigente exilado do PC do B, Diógenes de Arruda Câmara, ajudou a construir um outro partido comunista, uma vez que para o PC do B o Partido Comunista Português era revisionista e traidor dos trabalhadores. Nem mesmo o Partido Comunista Cubano escapou do critério exclusivista do PC do B: o comandante Fidel Castro era um revisionista, “vassalo e mercenário do social-imperialismo soviético”.
24) Portanto, a metamorfose atual dos companheiros do PC do B é típica do revolucionarismo pequeno-burguês, que se agravou a partir de meados dos anos 70 com a incorporação da AP ao PC do B: ora é “esquerdista” em função das circunstâncias, ora segue as diretrizes de um País camponês e um líder defasado no tempo, ora é “direitista” para se aproveitar das benesses da conjuntura política. Esse comportamento errático é oriundo também da falta de tradição histórica, da ausência de uma cultura comunista, que foi apropriada apenas superficialmente pelos militantes da AP.
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25) Esse é o principal fator que explica a trajetória do PC do B: no início Mao Tse Tung era “o maior marxista-leninista da atualidade”, depois virou renegado e traidor dos ideais da causa socialista; todos os Partidos Comunistas do mundo que se alinhavam com a União Soviética, inclusive o PC Cubano, eram revisionistas e traidores do socialismo. Agora o PC do B se orgulha de estar inserido no movimento comunista internacional. Mas o estranho é que essa pirotecnia política foi realizada sem uma palavra de autocrítica sobre o passado.
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1.5 Balanço da linha política do PCB e do PC do B
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26) Do ponto de vista da conjuntura nacional após a ditadura, vejamos como se comportaram politicamente os dois partidos: enquanto o PC do B se definia pela luta armada no campo, o PCB construía uma outra linha política no seu VI Congresso, realizado em 1967. Nessas resoluções o PCB identificou a ditadura como um governo de longa duração e propôs a formação estratégica de uma ampla Frente Democrática, com o objetivo de reunir todas as forças sociais e políticas que estivessem dispostas a organizar um amplo movimento nacional, para acumular forças até a derrota da ditadura. O PCB preconizava a entrada de todos aqueles que estivessem contra a ditadura no Movimento Democrático Brasileiro (MDB), ao mesmo tempo em que buscava acumular força nos movimentos operário e juvenil.
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27) Enquanto isso, o PC do B estava organizando um pequeno grupo guerrilheiro, na sua grande maioria composto por jovens estudantes, para realizar guerra popular prolongada no interior do Brasil, na ilusão de que o campo brasileiro iria cercar as cidades, mediante a formação de um exército camponês, derrotaria a burguesia e faria a revolução socialista no Brasil. Tratou-se, como a própria conjuntura demonstrou, não só de uma miragem, mas de uma análise da realidade profundamente equivocada, cujos resultados foram dramáticos para aqueles heróicos camaradas.
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28) Após a derrota da luta armada no campo e na cidade (muitos grupos oriundos do PCB também aderiram à guerrilha urbana), quase todas as forças de esquerda fizeram autocrítica do militarismo e terminaram aderindo ao MDB, inclusive muitos dos que participaram da luta armada nas organizações guerrilheiras urbanas. A vida demonstrou que a linha política desenvolvida pelo PCB no Congresso de 1967 fora vitoriosa, uma vez que foi exatamente o movimento democrático amplo que pôs fim aos 21 anos de ditadura militar no País.
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29) No entanto, o PC do B foi a única organização que não fez autocrítica da guerrilha do Araguaia, apesar de praticamente todos os seus participantes terem sido mortos naquela região. Essa posição causou profundas divergências na direção central do PC do B. Quando foi marcada uma reunião do Comitê Central para um balanço da guerrilha, em 1976, na qual a maioria dos dirigentes já tinha votado uma resolução crítica em relação ao movimento guerrilheiro, por ampla maioria, a reunião foi invadida pela polícia política e todos os dirigentes foram presos, sendo que Pedro Pomar e Angelo Arroyo foram assassinados no próprio local e João Batista Drummond nas torturas no DOI-CODI.
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30) O documento de Pomar sobre o Araguaia era bastante crítico, mas não pôde ser difundido como resolução em função da queda da reunião do Comitê Central do PC do B. Vejamos o que dizia Pomar em seu documento para a reunião onde ocorreu o Massacre da Lapa: “Não há como fugir à amarga constatação de que a guerrilha sofreu uma derrota completa e não temporária. Infelizmente o Comitê Central tem que aceitar a dura verdade de que o resultado fundamental e mais geral da batalha heróica travada por nossos camaradas foi o revés”, diz o documento.
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31) No entanto, o documento que se tornou oficial foi o que definiu a guerrilha do Araguaia, como “uma gloriosa jornada de lutas”. Neste episódio se revela com clareza a herança cristã dos atuais companheiros do PC do B atual: ao glorificar a guerrilha massacrada, sem analisá-la em bases objetivas, se comportam como os cristãos primitivos, que faziam do sofrimento uma glória para alcançar o reino dos céus. A apologia do sofrimento e do sacrifício substituem, no caso, a análise concreta da situação concreta, mitifica o problema e, dessa forma, foge-se da questão central, que é o balanço do trabalho de direção no período, os erros ou acertos da decisão política de se montar a guerrilha.
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1.6 A aproximação com o movimento comunista
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32) Aliás, como se pode notar, o PC do B tem uma enorme dificuldade em realizar uma autocrítica. Quando o socialismo albanês, “o mais puro entre os socialismos”, “o farol da humanidade” se desagregou na esteira da crise do Leste Europeu, o PC do B não realizou nenhuma autocrítica sobre sua linha política anterior. Fez de conta que não tinha nada a ver com a Albânia e seu modelo de socialismo, sequer fez um documento interno analisando sua trajetória comum com os albaneses.
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33) A partir daí, passou a se aproximar de todos os partidos que há pouco tempo chamava de reformistas e traidores do socialismo. Como não foi golpeado orgânica e financeiramente como os PCs tradicionais, aliados à antiga URSS, porque não tinha nada a ver com a União Soviética ou o Movimento Comunista Internacional e já estava reorganizado a partir de meados da década de 80, puderam participar das iniciativas internacionais dos partidos comunistas nos anos 90 como se fosse um deles.
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34) Aproveitando-se das dificuldades políticas e orgânicas do PCB, que sofreu um golpe profundo após a queda da URSS e pela saída da maioria dos dirigentes para formar um outro partido (Partido Popular Socialista (PPS), hoje aliado à direita, o PC do B informava aos camaradas nos encontros internacionais que o PCB praticamente desaparecera, ficando apenas um pequeno grupo remanescente, e que o PC do B era o representante dos comunistas brasileiros. Só alguns anos depois, com o PCB reorganizado nacionalmente e em condições de reatar seus vínculos com o Movimento Comunista Internacional, é que essa informação foi corrigida.
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1.7 O PC do B não é o PCB
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35) Aliás, os companheiros do PC do B têm um costume bastante grave de falsear a história, possivelmente em função de suas próprias origens. Um dos maiores problemas do PC do B é o fato de não ser o partido histórico dos comunistas brasileiros. Mesmo que em seus documentos eles afirmem na cara dura que o PC do B foi fundado em 1922, reorganizado em 1962 e reestruturado em 1985, esse malabarismo histórico não é levado a sério por ninguém. Nenhum historiador, nenhum militante esclarecido, nem mesmo sua militância, acredita nessa lenda. Muitos militantes que saíram dessa organização e vieram para o PCB nos informaram que esse é um problema psicológico que atormenta cotidianamente o PC do B e sua direção.
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36) Realmente, este é um problema de difícil resolução para do PC do B: por mais que não lhes agrade essa realidade, na verdade o PC do B é uma dissidência do PCB, fundado em 1962. Além disso, não podem deixar de constatar a dura verdade: O PC do B não é o PCB! Nem é o Partido histórico da classe operária brasileira. Não é o Partido de Astrojildo Pereira, de Octavio Brandão, de Minervino de Oliveira, de Luis Carlos Prestes, de Olga Benário, de Pagu, de Osvald de Andrade, Cândido Portinari, Di Cavalcanti, de Gregorio Bezerra, David Capistrano, de Edson Carneiro, de Nelson Werneck Sodré, de Caio Prado Jr, de Rui Facó, Jorge Amado, Graciliano Ramos, Solano Trindade, de Milton Caires de Brito, de Paulo Cavalcanti, de Elisa Branco, de João Saldanha, de José Maria Crispim, de Osvaldo Pacheco, de Lindolpho Silva, Mario Schenberg, Samuel Pessoa, de Stanislau Ponte Preta, de Vianinha, Dias Gomes, de Paulo da Portela e Paulo Pontes, de Vladimir Herzog, de Manoel Fiel Filho, de Horacio Macedo, de Ana Montenegro, de Niemayer.
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37) Com esses militantes históricos, o PCB esteve presente nas principais batalhas dos trabalhadores e da população brasileira, nos campos da cultura, das artes e da ciência. Pode-se dizer mesmo que, em função dessas circunstâncias, o PCB produziu, ao longo do século XX, a maior parte dos heróis do povo brasileiro em todos os campos do conhecimento.
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38) Além disso, o PCB não se envergonha de sua história e não precisa omitir documentos com o objetivo de maquiar sua trajetória para parecer diferente. Contamos nossa história por inteiro. Uma história cheia de heroísmo, acertos e também de muitos erros, mas uma história que podemos contar integralmente, sem medo de comprometer nossa posição política em qualquer conjuntura. Por isso, nesses 87 anos de lutas assumimos globalmente nosso passado e dele nos orgulhamos porque faz parte da história de cada um de nossos camaradas.
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Parte II
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2.1 As divergências estratégicas e táticas
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39) Mas as divergências entre o PCB e o PC do B não se resumem apenas ao campo da história, um problema já resolvido e bem documentado. As divergências maiores estão exatamente nas questões da atualidade, envolvendo a estratégia e a tática da revolução brasileira, a concepção orgânica do partido revolucionário, um balanço sobre o socialismo real, e a política em relação ao governo Lula. Independentemente dos problemas históricos, se nestas questões houvesse convergências, não teria sentido a existência de dois partidos comunistas no País. O problema é que as divergências nestas questões entre os dois partidos são tão profundas quanto os problemas já resolvidos pela história.
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40) No que se refere à estratégia da revolução brasileira, as diferenças são grandes. O PCB definiu, em seu XIII Congresso, de 2005, que a estratégia da revolução brasileira é socialista, porque o capitalismo brasileiro é maduro, atingiu a fase monopolista e a burguesia está associada e subordinada ao capital estrangeiro e ao imperialismo. Portanto, esta burguesia não pode desempenhar nenhum papel num processo de transformações sociais. Com esta resolução o PCB rompeu com o etapismo e a chamada revolução nacional-democrática, na qual seria necessária inicialmente uma revolução democrática burguesa e, no bojo dessa revolução, a classe operária se fortaleceria e passaria a hegemonizar o processo revolucionário.
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41) Diz a resolução do PCB: “A estratégia da revolução brasileira aponta para a conquista da hegemonia socialista e do poder político por meio de um amplo movimento de massas, construído com base e sob a hegemonia do bloco formado pelos operários e demais trabalhadores da cidade e do campo, pelos assalariados das camadas médias, pelos servidores públicos, pelos trabalhadores autônomos, precarizados e desempregados e pela pequena burguesia (…) A consecução dos objetivos estratégicos do PCB implica a construção de uma alternativa de poder, representativa da classe operária e dos setores populares. Uma alternativa de poder que se apresente como uma contraposição ao poder burguês, mobilizando as classes exploradas com um programa capaz de produzir uma ruptura na ordem capitalista. Esta contraposição se materializa no Poder Popular, que possui um caráter estratégico, ao se consubstanciar em futuro núcleo de poder, e um caráter tático, ao dar suporte às lutas unificadoras do movimento popular”.
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42) Com a resolução do XIII Congresso, o PCB rompeu com um dos elementos teóricos que mais atrasava a formulação estratégica do Partido e com uma concepção equivocada da realidade brasileira. Ao caracterizar a revolução brasileira como socialista, em função das condições objetivas do capitalismo brasileiro e da globalização, e se definir pela construção do bloco histórico do proletariado, o Partido atualizou sua estratégia em relação à contemporaneidade do capitalismo brasileiro e mundial e desatou as amarras que o prendiam a uma formulação da década de 50, quando o capitalismo brasileiro tinha outra configuração. Ao definir claramente o bloco de forças sociais da revolução, o PCB rompeu com as ilusões terceiro-mundistas e nacionais-democráticas que foram características da esquerda no passado, e definiu claramente que a burguesia nacional não pode desempenhar nenhum papel em qualquer transformação social no País.
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43) Nesta questão estratégica, os companheiros do PC do B se definiam no passado por uma revolução nacional-democrática, num arco de alianças envolvendo inclusive setores da burguesia nacional. Gradativamente, o PC do B foi abandonando qualquer referência sobre a estratégica da revolução brasileira. A última referência sobre os caminhos da revolução foi no VI Congresso, em 1983, quando propunha uma democracia popular rumo ao socialismo. A partir do IX Congresso ocorreu a grande virada para a direita: sua política a partir de então é marcada pelo taticismo permanente, onde todas as alianças são possíveis e justificáveis, tanto no movimento sindical, quando na política eleitoral, inclusive realizando alianças com os partidos abertamente de direita. Ou seja, a política de aliança do PC do B é policlassistas, inclui desde os trabalhadores da até setores da burguesia nacional e do agro-negócio. A estratégia nacional-democrática do passado agora é substituída pelo discurso nacional-desenvolvimentista.
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2.2 As divergências no terreno tático
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44) As diferenças estratégicas parecem diferenças sutis, às vezes mesmo picuinhas entre a esquerda, mas quando essas posições se desdobram para o terreno tático é que se pode ver realmente as divergências. No terreno tático o PC do B se transformou num partido da ordem, semelhante aos outros partidos, perdeu inteiramente seu caráter de classe, sua ideologia proletária, sua concepção orgânica leninista. Se institucionalizou de tal forma que hoje sua independência política foi erodida. Pratica um pragmatismo político tão escancarado que hoje de comunista o PC do B parece só ter mesmo o nome.
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45) O PCB rompeu com o governo Lula antes dos escândalos de 2005, entregou os cargos que possuía no governo, e se colocou na oposição a este governo. Realiza uma política de alianças eleitorais e nos movimentos sociais com a esquerda e na última eleição presidencial foi parte constitutiva da Frente de Esquerda, cuja candidata era a senadora Heloisa Helena. No segundo mandato, continuou em oposição ao governo Lula, muito embora tenha recomendado o voto crítico em Lula no segundo turno, para evitar uma vitória da extrema-direita. A oposição a este governo ocorre em função do fato de que Lula faz um governo para os banqueiros, para o grande capital e o agro-negócio, traindo os trabalhadores e deixando para estes apenas algumas migalhas do festim neoliberal, como o Bolsa Família. Em sua ação política o PCB só faz aliança com a esquerda, quer nas eleições, quer no movimento sindical, juvenil ou social.
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46) Enquanto isso, os companheiros do PC do B fazem parte do governo Lula, contam com ministérios e cargos em vários escalões da administração pública em todo o País, inclusive a presidência da Agência Nacional de Petróleo (ANP), uma agência governamental que se rendeu completamente aos interesses anti-nacionais, sendo hoje odiada por todas as forças nacionalistas e de esquerda. Por sua própria posição no governo, os companheiros do PC do B são obrigados a defender Lula junto à população e a militância. Além disso, por sua estratégia policlassista, desenvolve uma tática política onde é permitido praticamente tudo: alianças com partidos de direita em vários Estados, inclusive com partidos de extrema-direita como o PFL (Partido da Frente Liberal – atual DEM) e com a família Sarney (um cacique político de direita) no Maranhão ao longo de vários anos. Tudo isso para, pragmaticamente, conseguir um cargo administrativo aqui, um vereador ali, um deputado acolá.
47) Por pragmatismo, o PC do B amarrou seu destino ao destino da política do governo Lula e do PT. Defende a política desse governo, no plano nacional e internacional, às vezes com mais veemência que o próprio Partido dos Trabalhadores, mesmo após os escândalos que envergonharam o País. Para salvar as aparências, às vezes esboça alguma crítica a aspectos específicos da política governamental, mas na prática está umbilicalmente agarrado ao governo e nunca contesta os problemas de fundo, como por exemplo, o envio de tropas brasileiras para o Haiti, porque pode perder os cargos no governo.
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48) Essa é a chamada “tática audaciosa” que os companheiros do PC do B formularam em documento recente. Uma tática que não guarda nenhuma relação com uma política de classe e que se amolda convenientemente ao jogo das classes dominantes e subordina a atuação política à lógica eleitoral: ampliar o partido a qualquer custo, inclusive sacrificando a questão ideológica; filiando aderentes sem qualquer critério; aceitando egressos de todos os partidos de direita, inclusive vários vereadores e prefeitos, com o objetivo único de dar amostra de que tem densidade institucional. Um dos motes para a filiação é a promessa de que o parlamentar ou o prefeito, caso se filie ao PC do B, começa a participar da base do governo e, portanto, passa a ter melhores condições para receber as verbas e os benefícios governamentais.
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49) Como conseqüência, os novos aderentes adquirem grande influência nos organismos de direção e na elaboração política, em várias regiões, muito mais do que os militantes tradicionais e ideológicos do Partido. Muitas vezes, quando os militantes não aceitam certas filiações comprometedoras são excluídos dos organismos de direção e até do Partido. Como exemplo dessa tática, é importante citar um conhecido episódio ocorrido no primeiro mandato do governo Lula: o PC do B filiou um conhecido senador de um partido de direita, Leomar Quintanilha, do Estado de Tocantins, e ainda se orgulhava nos seus órgãos de imprensa do seu “senador comunista”. Quintanilha foi para o PC do B porque teve interesses contrariados no seu Estado. Usou o PC do B como legenda de conveniência, pois quando a situação no Estado se normalizou, Quintanilha saiu do PC do B sem dar qualquer satisfação. Mas os companheiros do PC do B sequer fizeram uma nota de autocrítica em relação a este episódio fisiológico.
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2.3 As divergências nas concepções de partido 
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50) Do ponto de vista da concepção de partido, as diferenças entre PCB e PC do B também são acentuadas. O PCB se definiu por um partido de militantes. Portanto, não nos interessam filiados, não nos interessa inchar o partido com pessoas sem o mínimo compromisso ideológico apenas para parecer um partido de massas. Nós só recrutamos militantes políticos, camaradas que despertaram para a luta ou que compreenderam a necessidade da luta ou ainda que estão na luta em qualquer área social ou política. Nosso partido prioriza a organização por células nos espaços comuns de lutas, locais de trabalho, moradia, estudo e lazer, e procurar combinar a luta institucional com a luta não institucional, acreditando ser a luta diretas das massas um instrumento importante para a organização dos trabalhadores e a revolução brasileira.
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51) Já os companheiros do PC do B resolveram apostar todas as suas fichas na questão institucional e, dentro desta, na questão eleitoral. Abandonaram a organização leninista por células. Priorizaram o trabalho parlamentar e o jogo eleitoral, mesmo sendo obrigado a fazer concessões que irão lhe custar um alto preço político no futuro. Nas eleições municipais de 2008, por exemplo, a propaganda de sua candidata a prefeito do Rio de Janeiro não teve mais bandeiras vermelhas, nem o nome PC do B, nem foice e martelo para não assustar o eleitorado, mas apenas o número 65, que é o número eleitoral do PC do B. No Rio Grande do Sul a cor da campanha do PC do B não foi vermelha, mas roxa (“roxo é um vermelho com azul dentro, justificava a candidata,”), fato até destacado com sarcasmo pela imprensa.
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52) O PC do B também não possui critérios de alianças no movimento no movimento sindical: ora participa em chapas com a Força Sindical, uma organização que está a serviço dos patrões, inclusive foi formada com dinheiro de organizações empresariais; ora com a Central Única Trabalhadores (CUT). Recentemente rompeu com a CUT porque se sentia discriminado naquela Central Sindical, mas esse rompimento também teve algo de pragmático: com a reforma sindical recentemente aprovada pelo governo Lula, as centrais sindicais legalizadas têm direito a expressivos fundos financeiros e, por isso, o PC do B formou a sua central, afinal não iria deixar que esse dinheiro fosse para os cofres da CUT.
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53) O PCB desenvolve esforços para a construção da Intersindical, uma articulação do sindicalismo classista, que trabalha no sentido de organizar pela base os trabalhadores e realizar um Encontro Nacional das Classes Trabalhadoras, que reúna todo o sindicalismo classista num grande movimento para a construção de uma central sindical independente do governo, dos patrões, do capital e dos partidos e que possa desenvolver uma política de classe independente.
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54) No movimento estudantil, a política imobilista e de apoio ao governo Lula do PC do B na União Nacional dos Estudantes (UNE) vem desmoralizando a entidade histórica dos estudantes, abrindo espaço para que movimentos trotskistas possam desenvolver uma política divisionista propondo a formação de uma outra entidade dos estudantes. O nível de desmoralização chega a tal ponto que nas recentes lutas que resultaram em ocupações das universidades pelos estudantes, os representantes da UNE sequer conseguiram falar nas assembléias. Nos congressos estudantis, o PC do B, para manter a hegemonia na entidade, faz alianças com a juventude do PSDB (partido neoliberal) e do DEM (juventude de direita). Mesmo reconhecendo a política equivocada desenvolvida pelo PC do B na UNE, o PCB é contrário à divisão da entidade e luta pelo seu fortalecimento e para que esta resgate suas tradições de luta no movimento estudantil.
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55) Por tudo isso, acreditados que as divergências entre o PCB e o PC do B são grandes e tenderão a se aprofundar ainda mais com o acirramento da luta de classe no País, pois enquanto o PCB optou por uma estratégia de longo prazo para a construção das bases da revolução brasileira, combinando a luta institucional com a luta não institucional, o PC do B se transformou num partido da ordem e se institucionalizou completamente. Como tudo na luta política, só o futuro dirá quem está com a razão, muito embora a experiência mostre que resultaram em grande fracasso a política dos partidos comunistas que optaram pelo caminho da institucionalidade.
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56) É com estas ponderações que costumamos afirmar que lugar de comunista é no PCB. A vida está provando que é uma ilusão querer construir uma vanguarda revolucionária descasada ideologicamente do marxismo-leninismo e de suas concepções estratégicas, táticas e orgânicas. Na conjuntura de reorganização da esquerda e dos comunistas no País, após a crise que tirou do Partido dos Trabalhadores a condição de agente das transformações sociais, esperamos que todos os militantes que reivindicam o legado da Comuna de Paris, da revolução Bolchevique de 1917 e da fundação do PCB em 1922 se incorporem às fileiras do PCB, de forma a que possamos construir um Partido Comunista forte, coeso, disciplinado e disposto a lutar pela conquista do poder político no País e pela construção do socialismo em nossa pátria.
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Viva o Partido Comunista Brasileiro!
Viva o Socialismo!
Viva o Comunismo!
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Edmilson Costa, é doutor em economia pela Unicamp, com pós-doutorado no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da mesma instituição, autor de vários livros sobre economia e de vários artigos publicados no Brasil e no exterior. É membro do Comitê Central do PCB, da Comissão Política Nacional e Secretário de Relações Internacionais do PCB.
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Igor Grabois é economista e professor universitário.
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