segunda-feira, 28 de novembro de 2011



Editorial da edição 454 do Brasil de Fato


A oportunidade é fundamental para a classe trabalhadora, que se não estiver atenta e coesa poderá sofrer graves derrotas no Ordenamento Jurídico
No momento em que assistimos a uma retomada da capacidade de lutas do movimento sindical, acelerase no Congresso Nacional a votação do Projeto de Emenda Constitucional que trata da Reforma da Estrutura Sindical (PEC 369/2005).
Trata-se de uma antiga reivindicação do movimento sindical classista, que vem lutando contra os entraves que burocratizam as entidades e permitem a sobrevivência de direções sindicais completamente distanciadas da realidade dos seus representados.
A oportunidade é fundamental para a classe trabalhadora, que se não estiver atenta e coesa poderá sofrer graves derrotas no Ordenamento Jurídico.
Em linhas gerais, o Projeto apresentado pelo governo Lula foi resumido pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), da seguinte forma:
a) remete para a lei a regulamentação dos preceitos constitucionais em matéria sindical, inclusive no que diz respeito à abrangência do poder de negociação, dando ampla liberdade ao legislador para desenhar o modelo de negociação e de organização sindical, desde que não contrarie os enunciados do texto constitucional modifi cado;
b) institui o critério de representatividade, de liberdade de organização, de democracia interna e de respeito aos direitos de minorias, o que poderá ensejar, na lei e no próprio estatuto, a proporcionalidade de chapas na direção sindical;
c) autoriza a instituição da pluralidade sindical, desde que respeitados os critérios previstos no item anterior;
d) elimina o conceito de categoria profissional e econômica, sem instituir ramo ou qualquer outro conceito, podendo a entidade sindical representar apenas e exclusivamente seus associados;
e) acaba com a unicidade sindical, com o sistema confederativo e com a contribuição sindical compulsória;
f) reconhece as centrais como entidades sindicais, podendo, nos termos da lei sindical, se estruturar organicamente, criando suas confederações, federações e sindicatos;
g) reconhece, nos termos de lei específica, o direito de negociação e de greve dos servidores públicos;
h) deixa para a Reforma do Judiciário a definição do papel da Justiça do Trabalho, inclusive a eliminação do chamado poder normativo; e
i) mantém inalterado o texto sobre o direito de greve, ou seja, permanece a possibilidade dos líderes sindicais responderem penal e civilmente por eventuais abusos no exercício desse direito.
O projeto contém alterações muito perigosas para a luta da classe trabalhadora. O texto é genérico o suficiente para permitir dezenas de interpretações, podendo a lei definir a nova estrutura com amplas possibilidades de a bancada patronal inserir dispositivos repressivos que limitem ainda mais a capacidade de organização sindical.
Amplia-se a brecha para uma lei regulamentadora da organização sindical estabelecer requisitos que limitem a liberdade organizativa da classe trabalhadora, consagrando um verdadeiro “estatuto padrão”, como nos tempos da ditadura, com limite de dirigentes sindicais, controle de orçamento e destinação de recursos e medidas punitivas.
Aliás, a nova redação do inciso II do artigo 8º da Constituição Federal passa a exigir que as entidades sindicais cumpram os requisitos de representatividade, participação e agregação se quiserem obter a personalidade sindical, que agora passará a ser autorizada pelo Ministério do Trabalho (MTE). Em outras palavras, a velha Carta Sindical é ressuscitada, conferindo definitivamente à caneta do Ministro do Trabalho os poderes para definir a organização sindical. O que é mais grave, a PEC 369 mantém a redação da terrível Emenda 45, que obriga que o Dissídio Coletivo tenha “comum acordo” para ser suscitado. Tal regra, que favoreceu o patronato recusar-se a aceitar o ajuizamento de um dissídio coletivo na Justiça do Trabalho, resultou num terrível achatamento salarial para as categorias menores.
Mantendo e aprofundando a blindagem legal que impede o exercício do Direito de Greve, qualquer alteração legislativa na estrutura sindical será um retrocesso.
Aceitar a atual redação da PEC 369/2005 enfraquecerá a classe trabalhadora e abrirá condições para que a poderosa bancada patronal no Congresso Nacional aprove “leis regulamentadoras”, que servirão de pretexto para reprimir a capacidade de luta das parcelas combativas do movimento sindical, cerceando ainda mais o limitado direito de greve.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

"Grandes avenidas ainda se abrirão por onde passará o homem livre!"




 Salvador Allende

Camaradas que estão me ouvindo: a situação é crítica, estamos diante de um golpe de Estado do qual participa a maioria das Forças Armadas. (...)

Não tenho vocação para mártir, sou um combatente da causa social que cumpre a tarefa que o povo lhe confiou. Porém, aqueles que desejam voltar para trás na história e negam a vontade da maioria dos chilenos, me escutem: ainda que eu não seja um mártir, não recuarei.

 Que eles saibam, ouçam e gravem isso em suas mentes: deixarei o palácio La Moneda quando terminar o mandato que o povo me confiou, defenderei a revolução chilena e defenderei o governo porque é por isso que o povo me elegeu. Não tenho outra escolha. Somente as balas poderiam impedir-me de cumprir a missão que o povo me incumbiu.

Diante desses acontecimentos, declaro aos trabalhadores que não renunciarei! Face a essa virada histórica, pagarei com a vida minha lealdade ao povo. Tenho certeza de que a semente que foi plantada na consciência de milhares de chilenos não poderá ser arrancada. Eles têm a força, eles poderão nos subjugar, mas os movimentos sociais não se controlam nem pelo crime, nem pela força. A história pertence a nós, são os povos que a fazem. (...)

Dirijo-me a vocês e, em particular, à mulher simples do nosso país, à camponesa que acreditou em nós, à operária que trabalhou mais, à mãe que compreendeu nossas preocupações em relação a seus filhos.

Dirijo-me a todos os profissionais, aos patriotas que nunca deixaram de lutar contra a rebelião encorajada pelas corporações profissionais, corporações de classe que também defendiam os privilégios da sociedade capitalista.

Dirijo-me à juventude, àqueles que cantaram e manifestaram sua alegria e seu espírito combativo. Dirijo-me ao homem chileno, ao operário, ao camponês, ao intelectual, àqueles que serão perseguidos, porque o fascismo já está presente em nosso país: através de atentados terroristas, explodindo pontes, cortando ferrovias, destruindo oleodutos e gasodutos, diante do silêncio dos que tinham o dever de reagir. Eles são responsáveis. A história os julgará.

Eles certamente calarão a Rádio Magallanes, e o metal tranquilo da minha voz não chegará mais até vocês. Pouco importa. Vocês ainda a ouvirão. Sempre estarei junto a vocês. A lembrança que terão de mim será pelo menos a de um homem digno, de um homem que foi leal à sua pátria. (...)

Trabalhadores da minha pátria, tenho fé no Chile e em seu destino. Outros homens superarão esse momento cinzento e amargo em que a traição pretende se impor. Nunca se esqueçam que grandes avenidas ainda se abrirão por onde passará o homem livre para construir uma sociedade melhor.

Viva o Chile! Viva o povo! Viva os trabalhadores!

Estas são as minhas últimas palavras e tenho a certeza de que meu sacrifício não será em vão, tenho a certeza de que, pelo menos, será uma lição moral que castigará a perfídia, a covardia e a traição.

(Mensagem de Salvador Allende transmitida pelo rádio no dia 11 de setembro de 1973.Extraído deContre la tyrannie. Paris: Seuil, 2010.)

Maurice Lemoine

é jornalista ee autor de "Cinq Cubains à Miami ( Cinco cubanos em Miami)", Dom Quichotte, Paris , 2010.


Ilustração: Corbis/ Latinstock

Manifestantes chilenos protestam contra homenagem a ex-integrante da policia secreta de Pinochet

                                             
A homenagem ao brigadeiro da reserva Miguel Krassnoff, ex-integrante da Polícia Secreta do governo de Augusto Pinochet (1973-1990) e condenado a 144 anos de prisão por violação a direitos humanos, gerou revolta e protestos ontem (21) no Chile. Cerca de 500 manifestantes ocuparam as ruas da Providência, cidade próxima a Santiago, para protestar contra a homenagem prestada ao militar da reserva pela prefeitura.
Policiais e manifestantes enfrentaram-se quando houve tentativas das pessoas de entrar no clube no qual ocorria a homenagem. Houve uso de bombas de água e força. O diretor do Clube Providência, Alfonso Márques de La Plata, que coordenou a homenagem a Krassnoff, condenou as reações contrárias ao ato.
Porém, o advogado Héctor Salázar, que defende vários parentes de vítimas da ditadura chilena, disse que as denúncias que pesam contra Krassnoff são inúmeras e incluem todos os tipos de violações aos direitos humanos. Segundo ele, o militar da reserva era um dos comandantes da Polícia Secreta chilena.
A homenagem ao brigadeiro da reserva ocorreu no mesmo dia em que era lançada a quarta edição do livro Miguel Krassnoff: Prisioneiro de Servir ao Chile. De acordo com investigações, Krassnoff está envolvido no assassinato do cantor Victor Jara e do líder do Movimento Revolucionário de Esquerda, Miguel Enriquez.
Um dos mais temidos ditadores da América Latina, Pinochet governou o Chile por 17 anos com o apoio das Forças Armadas e da Polícia Secreta – de 1973 a 1990. O general comandou o golpe militar que derrubou o governo do presidente socialista, Salvador Allende. Foi acusado de uma série de crimes, como o desaparecimento de mais de 3 mil pessoas durante a ditadura. *Com informações da emissora pública de televisão do Chile, TVN. (Com o Brasil de Fato)

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Em Atenas, de 9 a 11, o 13o. Encontro Internacional de Partidos Comunistas e Operários

Partido Comunista Greco lamenta morte de embaixador de Cuba

 
 
Nota del CC sobre la muerte de Luis Prado García
Mensaje de Aleka Papariga a Raúl Castro

El Comité Central del KKE expresa su profundo pésame sobre la muerte de Luis Prado García, embajador de la República de Cuba en Grecia, y en su nota destaca:
“El CC del KKE expresa su profundo pesar sobre la muerte, en el sábado 19 de noviembre de 2011, del camarada Luis Prado García, embajador de la República de Cuba en Grecia, después de un accidente cerebrovascular grave que sufrió el lunes 14 de noviembre. (Com o KKE)

domingo, 20 de novembro de 2011

Época só publica entrevista de major-brigadeiro-do-Ar ,defendendo punição de torturadores, na internet





Comissão da Verdade aprovada pelo Congresso é uma novidade positiva para esclarecer o passado, mas é fundamental punir quem torturou e matou durante a ditadura militar. Mais: é “burrice” das Forças Armadas defender o contrário, já que a maior parte dos que fazem parte delas hoje não participou das violações de direitos humanos. As opiniões não são de nenhum militante de esquerda ou familiar de morto ou desaparecido político. São de um militar da Força Aérea Brasileira (FAB), detentor da segunda maior patente da Aeronáutica e herói da Segunda Guerra Mundial.
Maranhense radicado no Rio de Janeiro, o Major-Brigadeiro-do-Ar Rui Moreira Lima, 92 anos, participou de 94 missões de guerra na Itália. Ele não gosta de se definir nem como de esquerda nem como de direita, mas como um democrata. Em 1964, foi um dos poucos militares a resistir ao golpe que deu início a 21 anos de ditadura. No dia 31 de março, pegou um avião e foi localizar as tropas que o general Olympio Mourão Filho guiava de Minas Gerais para derrubar o presidente João Goulart, no Rio de Janeiro. Chegou a fazer alguns voos rasantes sobre as tropas de Mourão. Sem autorização para atirar, voltou para a base de Santa Cruz, no Rio. Cassado, passou cerca de quatro meses preso e ficou proibido de voar por mais de 17 anos.
Com a volta da democracia, Moreira Lima retornou à Aeronáutica. No fim dos anos 70, fundou Associação Democrática e Nacionalista de Militares, entidade que luta pelos direitos de cabos cassados durante a ditadura e defende posições que destoam das que são comumente defendidas por seus colegas de Forças Armadas. Como presidente da entidade, protocolou uma petição para que o Supremo Tribunal Federal mudasse a interpretação da Lei da Anistia, de 1979. No documento, ele advoga pela punição de militares que praticaram crimes durante a ditadura. O STF acabou decidindo manter a interpretação que perdoa as violações ocorridas entre 1964 e 1985.
Amigo do comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, e frequentador dos eventos promovidos pela FAB, Moreira Lima finaliza a tradução para o inglês de seu livro Senta a Pua!, que narra a expedição da Força Expedicionária Brasileira na Itália. Hit them hard! tem previsão de ser lançado ainda neste ano.


Época - Como surgiu a ideia de fundar uma associação de militares para a democracia?

Rui Moreira Lima – Foi em 1979, quando veio a anistia do Figueiredo (João Figueiredo, presidente entre 1979 e 1985). Eu e outros colegas que foram impedidos de trabalhar queríamos garantir os nossos direitos. Quando o Figueiredo anistiou aqueles torturadores, ele cometeu um erro. Qual a lei que pode ajudar um torturador? No mundo inteiro, por meio de diversas convenções, da OEA, ninguém atura a covardia do torturador. É um bandido, um desgraçado, um covarde.

Época - O senhor defende a punição de quem praticou crimes na ditadura?

Lima - Em 1964, me tiraram da Aeronáutica e me proibiram de voar, que era o que eu sabia fazer. Fiquei 17 anos sem poder voar. Fui vender fubá, grão de bico, farinha. O meu retrato estava na base aérea de Santa Cruz (no Rio de Janeiro) para eu ser preso se entrasse lá. Hoje a FAB me estende tapete vermelho, é a minha casa. Mas alguns poucos caras da FAB fizeram isso comigo e eles deveriam pagar por isso.

Época - A Argentina recentemente condenou na Justiça diversos militares por crimes ocorridos durante a ditadura militar do país. O Brasil deveria fazer o mesmo?

Lima - Devia. Isso é fazer justiça. O Figueiredo era um comandante, um homem de cavalaria, mas era soldado, não entendia nada disso. Deu anistia para quem torturou. Não pode fazer isso. A Justiça é uma coisa séria.

Época - A maior parte das Forças Armadas se posiciona contra a punição de militares envolvidos em crimes durante a ditadura. Existe algum constrangimento quando o sr. defende esse posicionamento na instituição?
Lima - Não, todos me tratam muito bem, mesmo. O brigadeiro Saito (Juniti Saito, comandante da Aeronáutica) é amigo meu, é uma pessoa dócil, boa. Sou convidado para diversos eventos. Sou membro do Conselho Cultural da Aeronáutica. Considero a Aeronáutica a minha casa. Nem deveria, mas sou tido lá como um sujeito fora de série.
Época - E por que a maior parte das Forças Armadas é contra rever a lei da anistia?

Lima - Por burrice, corporativismo burro. O mundo inteiro está acabando com isso. Estão mandando os torturadores e matadores para a cadeia. Eu não sou revanchista. Não tem revanche nenhuma. O camarada que não tem nada com isso não tem culpa.

Época - Rever a Lei da Anistia não vai reabrir uma ferida, como dizem os defensores da atual legislação?

Lima - Eu espero que abra uma porta. Não é possível esconder a verdade. Tem muitos companheiros do Exército e da Aeronáutica que não estão de acordo com isso. Não dizem por causa do tal do corporativismo. Mas isso cedo ou tarde vai vir à tona.

Época - O que o senhor acha da Comissão da Verdade, recém-aprovada?

Lima - Ela tem que estar presente. Mas ela é comissão da Verdade, tem que ser de verdade. Eu estou na expectativa. A Comissão da Verdade é obrigatória. Ela tem que dizer quem fez as coisas. E aí quem fez tem que pagar uma prenda por causa disso. Botar o sujeito na cadeia se for o caso.

Época - Mas a ideia da comissão não é colocar ninguém na cadeia.

Lima - Não, a ideia é dizer onde estão os corpos. É um crime não mostrar onde o cara foi enterrado. A verdade tem que ser dita. Ela é feito a rolha, você pode botar ela no fundo do tanque, mas ela salta.

Época - Muitas vezes, quando questionados sobre os militantes que desapareceram durante a ditadura, os militares dizem que os documentos relativos ao período foram destruídos. O senhor acredita nisso?

Lima - Tem muita coisa que foi destruída mesmo. Mas só o fato de existir a comissão e de chamar os caras que estão vivos para falar já é um alento para as famílias que perderam parentes.

Época - Mas o senhor acha que a comissão pode obter resultados concretos?

Lima - Sim, eles podem saber onde estão as ossadas. Alguma evidência vai se conseguir. E aí acaba com isso. Porque quem fez isso (tortura e assassinato de militantes) não foi o Exército nem a Aeronáutica nem a Marinha. Foram sujeitos que nasceram ruins, mal caráteres, com ódio no coração e inveja.

Época - Esporadicamente, ouvem-se notícias de tortura em quartéis e de violações aos direitos humanos nas Forças Armadas. Na opinião do senhor, isso está ligado ao treinamento que era oferecido aos militares durante a ditadura?

Lima - Está ligado sim. Tem um sujeito, Dan Mitrione (americano que ensinou técnicas de tortura a militares brasileiros), que chegou a ter uma rua em Belo Horizonte como o nome dele. Depois mudaram para colocar o nome de um estudante morto. Eu conheço gente, colegas, que foram fazer estudos no Panamá. Sujeito que chegou na polícia do exército e fez tortura. Conhecidos, porque eu não fui amigo desses caras. Mas eles estavam soltos, absolutos, pensando que a revolução (a ditadura militar) ia durar eternamente.

Época - E o senhor acha que essa cultura permanece ainda hoje?

Lima - Olha, ninguém foi para a cadeia porque torturou e ninguém morreu por causa disso. 

Época - Quais são os principais desafios das Forças Armadas hoje?

Lima - Hoje as Forças Armadas estão fazendo o que devem fazer: defender a Amazônia, o mar, o Brasil.



Época - O senhor participou da Segunda Guerra Mundial e se recusou a participar do golpe de 1964. Que princípios guiaram sua carreira como militar?

Lima – Eu entrei nas Forças Armadas no dia 31 de março de 1939. Nesse dia, recebi uma carta de meu pai, juiz, em que ele dizia: “Sê um patriota verdadeiro e não te esqueças que a força somente deve ser empregada ao serviço do Direito. O povo desarmado merece o respeito das Forças Armadas”. Essa carta norteou toda a minha trajetória. Já me perguntaram se eu era comunista. Eu nunca fui comunista, eu fui brasileiro, fui defender o meu país e continuo defendendo. (A entrevista do brigadeiro só  foi publicada na pagina da Época na internet, não saiu na edição impressa que vai para assinantes e para as bancas)

sábado, 19 de novembro de 2011

90 ANOS DO PCB (O Levante Popular de 1935)

Passados quase 76 anos, as classes dominantes de nosso país cumprem anualmente com seu rito de difamação e injúrias contra o Levante Popular de 35. Apesar de derrotado, o Levante expressou pela primeira vez e de forma clara o programa revolucionário do proletariado brasileiro e o caminho para a conquista do poder para as massas populares através da luta armada.

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Revoltosos quando saíam presos do 3º Regimento de Infantaria da Praia Vermelha
Apesar de não ter podido tirar todas consequências práticas de sua própria formulação, ela fora produto de profunda autocrítica das ilusões eleitoreiras e constitucionais. Mas também é notório que os grunhidos e urros da reação enfurecida, que desde então cunhou seu grotesco bordão de "intentona comunista" para difamar democratas, progressistas e comunistas, revela como o velho Estado de grandes burgueses e latifundiários a serviço do imperialismo treme ante uma revolução popular.

Introdução

Apesar das enormes debilidades e carências que marcaram os primeiros anos de vida do PCB, aos 13 anos de sua fundação ele empreendeu um dos feitos mais importantes da nossa história e do movimento comunista brasileiro: o levante armado antifascista conhecido como Levante Popular de 35.
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Recorreremos a longos trechos do texto A Gloriosa Bandeira de 35, sabidamente de autoria do destacado dirigente comunista Pedro Pomar, publicado pela primeira vez em 1975 no jornal clandestino A Classe Operária (então órgão oficial do Partido Comunista), por ocasião dos 40 anos do levante. Ela constitui-se a melhor análise e síntese sobre o Levante Popular de 35 produzidas pelo Partido Comunista do Brasil nesta fase.

Crise do imperialismo e escalada fascista

Com o irrompimento da crise geral, que se aprofundou com o crack da bolsa de Nova Iorque de 1929, o sistema capitalista vivenciou, até 1933, a mais profunda crise que já havia sofrido.
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Para descarregar sobre os ombros do proletariado a conta da crise e deter o ascenso do movimento comunista, os círculos de poder imperialistas passam aos métodos de dominação mais terroristas. O fascismo, como contrarrevolução armada no poder, estende-se por toda a Europa e todo o mundo.
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Em 1931 o Japão invade a Manchúria, nordeste da China, e em 1933 o Partido Nacional-Socialista de Adolf Hitler sobe ao poder na Alemanha. Em outubro de 1935, a Itália de Mussolini invadia a Etiópia e a convertia em sua colônia. A Alemanha de Hitler armava-se febrilmente a fim de rever pela força os tratados de paz do pós-I Guerra, apoderar-se da Europa e arremeter sobre a União Soviética.

O VII Congresso da Internacional Comunista

A primeira onda da revolução proletária tinha adquirido grande impulso em 1917, e refluíra momentaneamente com as derrotas das tentativas de insurreição na Alemanha e Hungria, voltando a adquirir força nos anos de 1920 e 1930, com o crescimento e consolidação dos Partidos Comunistas em grande parte dos países do mundo.
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Fruto dos êxitos da campanha de bolchevização levada a cabo a partir de seu V Congresso (1924), a Internacional Comunista (Cominter) passou de 65 partidos em 1928 a 76 em 1935.
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Nos meses de julho e agosto de 1935, realizou-se o histórico VII Congresso da Internacional Comunista.À base do relatório de George Dimitrov, o Congresso fez uma completa caracterização do fascismo, definindo-o como "a aberta ditadura terrorista dos elementos mais chauvinistas, mais terroristas do capital financeiro". Demonstrou que "seu poder era feroz, mas precário, que sua ofensiva podia ser detida e derrotada. Todavia, o proletariado devia unir-se urgente e imperativamente, e formar uma frente com todas as forças interessadas na defesa das liberdades, do progresso social e da paz".
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Frente à escalada fascista, a Cominter formulará a política da frente única da classe operária contra o fascismo, a fim de arrebatar massas sob influência da social-democracia e outras correntes, para uni-las contra o fascismo e a guerra e na defesa dos direitos democráticos dos trabalhadores, estabelecendo um governo da frente popular onde isso fosse possível.
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Apesar de determinadas imprecisões conceituais, como as que deram margem a ilusões burguesas, particularmente nos partidos dos países imperialistas, sobre uma suposta etapa antifascista antes da revolução socialista, que terminou levando partidos a sérios desvios (Togliatti na Itália, Thorez na França, Earl Browder no USA, etc.), as deliberações do VII Congresso da Cominter foram decisivas para munir o proletariado em todo mundo de uma ofensiva linha política antifascista que resultou fundamental para a derrota do nazi-fascismo.

Ascensão fascista no Brasil

O Brasil, como analisa Pomar, padecendo dos males crônicos do predomínio do latifúndio arcaico e subjugação ao imperialismo, encontrava-se muito afetado pela crise de 1929-32. Em meio às dificuldades financeiras, Vargas dava maiores privilégios aos grupos econômicos estrangeiros e aos latifundiários, agravando as condições de vida e de trabalho das massas.
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Por sua vez, as medidas progressistas reformistas como voto secreto, jornada de 8 horas, nacionalização do subsolo, direito da mulher ao voto, reconhecimento dos sindicatos, têm como objetivo obter uma base social para a nova acomodação de forças no poder e especialmente corporativizar as massas. E, claro, nenhuma medida que tocasse a principal questão: as relações de propriedade da terra e seu o monopólio. Por isso mesmo, Vargas só atacou aquelas oligarquias mais débeis do Nordeste. Conquistando da fração compradora (exportadores, importadores e banqueiros) a hegemonia do Estado, a fração burocrática (industriais) vai utilizá-la para alavancar seus capitais e, em estreita aliança com os latifundiários semifeudais e associado ao imperialismo, impulsionar o capitalismo burocrático no país.
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Olga Benário escoltada por policial após interrogatório na Polícia Central, RJ
Inclusive depois de derrotar a burguesia paulista na guerra civil de 1932, a aliança de Vargas com as velhas oligarquias reforçou-se mais ainda. O Partido Comunista continuava perseguido, na clandestinidade, enquanto os integralistas1 recebiam franco encorajamento ao tempo que Vargas estreitava relações os regimes fascistas da Europa.
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"Em decorrência dessa política, generalizava-se o descontentamento entre o povo. Nas cidades, o proletariado e as massas trabalhadoras lutavam em favor de seus interesses vitais, das liberdades públicas, fortaleciam suas organizações de classe (...) No interior, os camponeses criavam suas primeiras Ligas, pugnavam por justiça e formavam pequenos grupos de autodefesa para se oporem à prepotência dos latifundiários."*

Desenvolvimento do PCB

Após a autocrítica dos desvios de direita de fins dos anos de 1920 e início dos de 1930 (como a linha eleitoreira do BOC) e com maior vinculação com a Cominter, a direção do PCB adquiriu uma base maior de conhecimento do marxismo-leninismo e o trabalho de massas do partido se ampliou consideravelmente nos principais centros operários do país.
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A compreensão das teses desenvolvidas pela IC sobre a revolução nos países coloniais/semicoloniais representa um salto significativo do partido, rompendo com as análises superficiais e subjetivistas sem, entretanto, livrar-se de transposições mecanicistas da experiência internacional à realidade brasileira.
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A partir da III Conferência Nacional (1929) o partido decide pela adoção da linha da revolução democrática, agrária-antifeudal e anti-imperialista, definindo o proletariado, os assalariados agrícolas e camponeses pobres como as forças motrizes da revolução. Na III Conferência dos Partidos Comunistas da América do Sul e do Caribe em 1934, em Moscou, enfatizou-se anecessidade da mobilização de amplas massas na luta contra o imperialismo e seus agentes locais, formando a mais ampla frente anti-imperialista.

A fundação da Aliança Nacional Libertadora - ANL

No dia 1º de agosto de 1934 o Jornal A Classe Operária anuncia a filiação ao partido de Luis Carlos Prestes, herói da Coluna Invicta que recebera seu nome2.
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Para auxiliar o trabalho partidário e a revolução, a Cominter envia importantes quadros, como os alemães Arthur Ewert (Harry Berger) e Olga Benário, o argentino Rodolfo Ghioldi, o alemão Johann de Graaf, o italiano Amleto Locatelli, o soviético Pavel Stutchevski, o estadunidense Victor Allen Baron e outros.
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Em 23 de agosto de 1934 realizou-se, por iniciativa dos comunistas, o 1º Congresso Nacional Contra a Guerra, a Reação e o Fascismo, no teatro João Caetano no Rio, com a participação de cerca de dez mil pessoas. Os choques entre integralistas e antifascistas tornavam-se cada vez mais violentos. No dia 7 de outubro de 1934, uma manifestação de integralistas na Praça da Sé, na cidade de São Paulo, foi dissolvida pelas forças antifascistas, reunidas numa primeira ação conjunta para a qual foi decisiva a iniciativa do PCB.
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Em março de 1935 a Aliança Nacional Libertadora - ANL inicia legalmente e de forma entusiástica suas atividades. Seu programa básico é também um importante avanço ao traduzir as aspirações democráticas revolucionárias das classes populares e, repercutindo rapidamente, mobilizou amplas massas por sua execução. Os principais pontos programáticos são:
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1Suspensão em definitivo do pagamento das dívidas externas, sob o fundamento de que já haviam sido pagas há muito;
2Nacionalização imediata de todas as empresas imperialistas, "arapucas" para as quais o povo trabalhava sob terrível exploração;
3Proteção aos pequenos e médios lavradores; entrega da terra dos grandes proprietários aos camponeses e trabalhadores que as cultivavam, visto serem seus únicos e legítimos proprietários;
4Gozo das mais amplas liberdades pelo povo, nele incluídos os estrangeiros que aqui trabalhavam e eram tão explorados quanto os brasileiros; e
5Constituição de um Governo Popular orientado somente pelos interesses do povo brasileiro.
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Esse programa simples se expressou no lema: Pão, Terra e Liberdade!
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No ato da instalação, o nome de Luis Carlos Prestes foi aclamado para a presidência de honra da Aliança. Após lançada, a ANL logrou se desenvolver rapidamente como relata Pedro Pomar:
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"O entusiasmo com que as massas receberam a Aliança e seu programa ultrapassou as expectativas. Em pouco tempo, estruturaram-se núcleos aliancistas na maioria dos Estados. Só na capital da República, Rio de Janeiro, neles inscreveram-se mais de 50 mil membros. Em suas fileiras incorporaram-se principalmente trabalhadores, soldados, marinheiros, cabos e sargentos — as camadas mais pobres das cidades. (...) Nunca se testemunhara tão poderoso movimento patriótico de massas, tamanho interesse pelo debate dos problemas nacionais (...) Paralelamente, cresciam as organizações sindicais do proletariado, surgiam centros da intelectualidade em defesa da cultura, associações femininas, entidades juvenis (...)."*
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Ainda assim, só após a reunião do Comitê Central, realizado em maio daquele ano, foram derrotadas as posições sectárias na direção do PCB, que propunham "soviets de operários, camponeses, soldados e marinheiros", que restringiam os setores médios (pequena e média burguesias). Foi sancionada a defesa do Governo Popular Nacional Revolucionário (GPNR), sintetizado na consigna sugerida pela IC: Todo poder à ANL!
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No célebre manifesto de 5 de julho3 da ANL, Prestes propagandeia ardorosamente a necessidade de um Governo Popular Nacional Revolucionário, apontando o levantamento armado do povo como único caminho para sua construção. É a partir daí que a consigna de um Governo Popular Nacional Revolucionário é adotada oficialmente pela ANL. Com o manifesto de 5 de julho a consigna Todo poder à ANL! é lançada para todo país.
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Membros do Comitê Revolucionário de Natal, detidos após a derrota
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O PCB luta por assegurar a independência do proletariado e combate as influências reformistas e legalistas no seio da ANL. Em artigo publicado no jornal A Classe Operária, o comunista Lauro Reginaldo da Rocha (Bangú) combate as ilusões de "resolver a situação nacional dentro dos quadros do atual regime, com Getúlio ou outro Getúlio qualquer no governo, dentro da ordem e da lei feudal-burguesa".
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Bangú prossegue enfatizando a importância do campesinato como aliado fundamental do proletariado: "Ao proletariado cabe a tarefa de estar vigilante e iniciar as lutas com o seu fundamental aliado: os camponeses, contra os grandes senhores de terras e contra as empresas imperialistas, conquistando no processo dessas lutas a hegemonia nas lutas pela libertação nacional do povo brasileiro"4.
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O Partido Comunista prega abertamente a luta armada pelo poder, consigna que logo será adotada pela própria direção da ANL já em maio de 1935: "O que nós, da ANL, proclamamos é a necessidade de um governo surgido realmente do ‘povo em armas’",esclarecendo a seguir que "o GPNR não significará a liquidação da propriedade privada sobre os meios de produção, nem tomará sob o seu controle as fábricas e empresas nacionais"5.

A reação recrudesce

"Mal completara três meses de funcionamento legal, em julho, o governo decretou o fechamento da ANL, sob a acusação de que arquitetara ‘um plano comunista para a tomada do poder’. (...) O nazista Filinto Müller, chefe de polícia de Vargas, desencadeou imediata e drástica perseguição não só aos militantes aliancistas como aos dirigentes de sindicatos independentes e demais organizações democráticas. Sedes foram varejadas; ativistas presos e enquadrados na Lei de Segurança como ‘subversivos’, ‘agentes vermelhos a soldo do estrangeiro’.
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Ao mesmo tempo, o governo e a reação continuavam a apoiar por todos os meios os bandos integralistas. Criaram uma polícia especial objetivando espalhar o terror, aumentaram os efetivos da polícia política. Por seu turno, o Exército e a Marinha entregavam-se ao expurgo de praças e oficiais suspeitos de antifascismo, apressavam-se para prevenir qualquer intento do protesto popular." *

A insurreição de novembro

Com a decretação da ilegalidade, a ANL sofre grande refluxo. O partido toma a decisão de desencadear o levante armado antes de recuperar a sua mobilização. Pomar relata os acontecimentos da situação dramática que se criara para o partido. Diz ele: "O Partido Comunista não vacilou: resolveu preparar e desencadear a insurreição armada. (...) em novembro, sentindo que os acontecimentos se precipitavam, contando com a influência da ALN entre praças e oficiais das Forças Armadas e julgando que o nome de Prestes galvanizaria o Exército, a direção do Partido apressou o desfecho da ação armada e lançou a palavra de ordem de Governo Nacional Popular Revolucionário, com Prestes à frente.
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A 23 de novembro irrompeu em Natal, Rio Grande Norte, a sublevação dos soldados, cabos e sargentos do 21º BC, ali aquartelado. Diversos setores da classe operária e do povo, que já vinham realizando greves e manifestações reivindicatórias e anti-imperialistas, juntaram-se imediatamente aos rebelados (..) Os revoltosos aprisionaram os agentes do governo que não conseguiram fugir. Instaurou-se naquele dia o primeiro governo popular revolucionário da história do país.
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Compunham o novo governo: o sapateiro José Praxedes, encarregado do aprovisionamento; o sargento Quintino Clementino de Barros, da defesa; o funcionário público Lauro Cortes do Lago, do interior; o estudante João Galvão, da Viação (transportes); e o funcionário dos Correios e Telégrafos José Macedo, das Finanças. As medidas iniciais adotadas pelo Governo Revolucionário destinaram-se a baratear os preços dos gêneros alimentícios e das tarifas dos transportes, a moralizar a administração pública, a mobilizar forças para o prosseguimento da luta armada.
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As massas populares exultaram com o triunfo, confraternizaram com os insurretos, deram-lhes completo apoio (...) Rapidamente o movimento se estendeu às cidades do Ceará. Pensava-se levá-lo a todo interior do Estado e a Pernambuco, cujas tradições revolucionárias permaneciam vivas.
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Na manhã do dia 24 de novembro, em Pernambuco, sublevara-se o 29º BC próximo a Recife. Mas o levante foi apenas parcial. Também o vigoroso movimento operário e popular da combativa greve dos ferroviários da Great Western, não tivera tempo de tomar armas. E os insurretos do 29º BC, embora portando-se com extrema bravura, ficaram isolados e tiveram que, ao final, renderem-se.
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Ao saber desses acontecimentos, a direção nacional do partido julgou de seu indeclinável dever prestar solidariedade aos revolucionários do Nordeste, fortalecer a luta que se iniciara. Decidiu-se de imediato lançar ao combate as forças sob sua influência no Rio de Janeiro e em outros Estados.
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A reação já estava alarmada e se prenunciavam batalhas duríssimas. "Ainda assim, na madrugada de 27 de novembro, efetivou-se o levantamento de numerosos contingentes de soldados e oficiais do 3º Regimento de Infantaria e do Regimento Escola de Aviação, duas das mais importantes unidades militares do Rio.
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Os núcleos aliancistas e as células comunistas nessas unidades executaram sem vacilações, com intrepidez, as diretivas do Partido e da ANL. Os combates, como se previa, foram violentíssimos. A reação concentrou rapidamente efetivos várias vezes superiores, a fim de cercar e atacar os regimentos sublevados (...) Após quase dez horas ininterruptas de luta os sublevados tiveram que se render.
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Nesse mesmo dia 27, o movimento insurrecional do Rio Grande do Norte também cessou praticamente, ante o ataque de forças imensamente superiores (...) Alguns grupos guerrilheiros que ainda subsistiram no interior do Estado, sem experiência e sem confiança neste formidável método de luta, acabaram entregando-se ou dispersando-se.(sublinhado nosso)
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Após quatro dias, durante os quais despertaram a esperança e o entusiasmo das grandes massas exploradas e oprimidas, travaram batalhas heroicas os combatentes antifascistas, com os comunistas à frente, foram batidos, temporariamente postos fora de ação.
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Sobre os revolucionários derrotados recaiu o pesado e cruel, o castigo dos cruzados da ordem. Fuzilaram sumariamente vários soldados prisioneiros. Os que sobreviveram foram recolhidos a presídios, ilhas, navios, etc. Eram milhares. Vargas reclamou e obteve do Congresso o estado de sítio para todo o país.
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Em seguida, levantaram um coro de calúnias com o propósito de difamar a conduta dos revolucionários; difundiram que haviam assassinado oficiais a sangue-frio, violentado moças, etc. A verdade, no entanto, segundo testemunhas insuspeitas, é que os revolucionários agiram com grande generosidade, jamais desrespeitando os prisioneiros." *
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Com a derrota, praticamente toda a direção do PCB é presa. O dirigente comunista alemão Harry Berger, é submetido as mais bárbaras torturas que se tem notícia, resiste bravamente até perecer de suas faculdades mentais. "Berger entregou a nosso povo não apenas sua vida, mas toda sua razão". Sua companheira Elise Saborowski é entregue junto a Olga Benário à Alemanha nazista, onde são assassinadas em um campo de concentração. O comunista estadunidense Victor Allen Baron é assassinado na tortura.

O golpe fascista do Estado Novo

À derrota do levante seguiu-se profunda desarticulação do partido, tendo seus comitês regionais, com exceção da Bahia, totalmente desmantelados e o comitê central tomado por provocadores e policiais. Só pouco a pouco e principalmente com início da Segunda Guerra Mundial que o partido irá se rearticulando.
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"De 1936 para 1937, a ameaça ‘comunista’ parecia de tal modo inexistente que o ministro da Justiça ordenou a soltura dos presos aliancistas, com exclusão dos mais implicados, dos chefes. Bastou, porém que as correntes populares começassem a dar sinal de vida para que todo o panorama repentinamente voltasse a ficar sombrio."*
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Amedrontadas, as forças reacionárias desencadeiam o golpe fascista de 10 de novembro de 1937, que instaura o chamado Estado Novo, com uma Constituição calcada em modelos fascistas. Vargas teve que recorrer à invenção do famoso Plano Cohen6 para justificar o Estado Novo. Em 1940, no apogeu das vitórias de Hitler, Vargas saudaria a nova era fascista.
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Este golpe se dirige fundamentalmente contra os comunistas, submetidos a um regime de terror, ao mesmo tempo em que atinge vastos setores populares e personalidades democráticas.
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O PCB, mesmo nestas duríssimas condições com seus quadros presos e incomunicáveis nos porões fascistas, além de profundamente infiltrado, defende suas organizações lutando contra o terrorismo estadonovista e continua liderando a campanha antifascista, como a mobilização para a guerra contra o Eixo7.
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Entretanto, embora exaltasse a insurreição de 35, a direção do partido vai abandonando os objetivos revolucionários e se limita a reivindicações mais imediatas, caminhando paulatinamente para o nacional-reformismo.

Imperecíveis lições

Não obstante os heroicos êxitos, a política do PCB e seu trabalho de frente única padeceram de sérias debilidades, que o conduziram à derrota. Especialmente subestimou e desprezou o campesinato. Ainda que o PCB tenha avançado em compreender as forças motrizes e o caráter da revolução, a construção da ANL fora praticamente restrita aos grandes centros urbanos. O partido, mesmo que continuadamente reiterasse o papel dos camponeses, não se lançara seriamente na sua mobilização e organização.
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Tampouco, ao elencar as classes que compunham a frente única, identificou o papel de cada classe no seio da frente, bem como o conteúdo antifeudal da revolução, relegando na prática o papel do campesinato no processo revolucionário, não apenas como aliado seguro, mas como força principal a ser dirigida pelo proletariado.
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Vejamos que em seu relatório ao VII Congresso da Cominter, Dimitrov, esclarecendo o sentido concreto que devia ter a frente única nos países submetidos ao imperialismo, e particularizando o nosso, dizia: "No Brasil, o Partido Comunista, que construiu uma base correta para o desenvolvimento da frente única anti-imperialista com a fundação da Aliança Nacional Libertadora, deve fazer o máximo de esforços para estender ainda mais esta frente e atrair, antes e acima de tudo, as massas de milhões de camponeses com o propósito de orientá-las na formação de unidades do exército popular revolucionário devotado até o fim ao estabelecimento do poder da Aliança Nacional Libertadora"(sublinhado nosso).*
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"Também o inolvidável Harry Berger insistiria na importância da atividade entre as massas rurais. Berger, dirigente comunista alemão que a Internacional Comunista incumbira de ajudar a luta dos trabalhadores brasileiros, assim que chegou ao Brasil passou a estudar pessoalmente a experiência do surgimento das Ligas Camponesas e de guerrilhas na região do Baixo São Francisco, em Alagoas."
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Argumentava que "enquanto os comunistas não se ligassem às massas camponesas e conquistassem seu apoio, seria impossível obter a vitória, bem como a direção do movimento revolucionário pelo proletariado"* (sublinhado nosso).

O caminho da revolução

Como muito bem afirmou Pedro Pomar, onde mais fortemente se manifestaram as deficiências ideológico-políticas do partido foi na concepção e no método da luta armada, que se resumem a estratégia e tática na luta pelo poder. "(...) O Partido, porém, confiava numa vitória fácil, não levando em conta a realidade, a correlação de forças desfavorável e a própria época imperialista."
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O PCB, ainda muito influenciado pelas posições "tenentistas", superestimou o peso de seu apoio e papel da luta nos quartéis. Além do mais subestimou o impacto produzido pela ilegalidade da ANL, que fizera que milhares de núcleos e militantes desaparecessem da noite para o dia.
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Ainda que os manifestos e palavras de ordem tenham sido um importante instrumento de mobilização, convocando as massas de forma clara e ofensiva, estes não encontravam organizações de combate estruturadas à altura destas tarefas. Isto tanto ao nível dos núcleos da ANL, mas também, e principalmente, quanto à preparação ainda que embrionária de um exército popular revolucionário.
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Ao propugnar a palavra de ordem do GNPR e deflagrar o movimento, o PCB e a ANL se defrontaram não apenas com grupos de poder muito bem encastelados, mas com a base mesma de sustentação do capitalismo burocrático no país – o latifúndio, a grande burguesia e o imperialismo – o que inevitavelmente já colocava, dada a correlação de forças, a necessidade de um processo prolongado com o qual as forças do povo poderiam passo a passo, do pequeno ao grande, irem se fortalecendo no combate à reação, enfraquecendo-a paulatinamente até inverter essa correlação de forças.
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Ainda que a inevitável derrota se produzisse nas capitais, estas poderiam se tornar apenas derrotas parciais, se o partido munido de uma direção justa, convertesse todo trabalho acumulado na continuação da insurreição através da guerra de guerrilhas no campo; construir passo a passo um exército guerrilheiro popular para derrotar parte por parte o inimigo, transformando assim o fracasso do assalto ao poder de novembro numa exitosa guerra prolongada.
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Vejamos que, em documento de balanço, de junho de 1936, o Comitê Central do PCB dá importantes indicações dos erros cometidos: "No caso de insucesso nos demais pontos do Nordeste, preparar-se para o prosseguimento da luta armada em pontos estratégicos do interior e onde as condições fossem mais favoráveis para a guerra de movimento, criando guerrilhas em todos os pontos percorridos."
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Lembremos que neste mesmo período (de 1934 a 1936) ocorrera a Longa Marcha na China. E as ideias de Mao Tsetung sobre a guerra popular e o cerco da cidade pelo campo já haviam triunfado no Partido Comunista da China, em janeiro de 1935 na reunião ampliada do Birô Político em Tsunyi, cujo aprendizado é de valor inestimável para todos comunistas e de vigorosa vigência na atualidade. O PCCh, diante da derrota da insurreição operária de Xangai em 1927, com a traição de Chiang Kai-shek e o massacre de dezenas de milhares de comunistas, voltara-se para o campesinato sob a liderança de Mao Tsetung, que organizara o Levantamento da Colheita de Outono. Sob esta base, o PCCh ergueu um poderoso exército de operários e camponeses que, através da guerra de guerrilhas estabelecera a primeira base de apoio revolucionária nas montanhas Tchincan, expandindo-a noutras regiões, resolvendo assim problemas chaves para a revolução nos países dominados, como a questão da revolução de nova democracia, da frente única revolucionária, da construção do exército popular, da guerra popular e de seu caráter prolongado.
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Berger inclusive, "durante os cursos de formação política, fazia brilhante exposição a respeito da revolução na China, onde estivera antes, explicando as razões da hoje chamada Grande Marcha, quando o exército de Mao Tsetung e Chu-Te se deslocaram para o interior, onde se encontravam acuados pelas tropas de Chiang Kaichek a fim de postar-se na retaguarda das tropas invasora do Japão, colocando estas entre dois fogos e organizando assim o que se denominara Guerra de Resistência anti-Japonesa, que propiciara a organização do Governo de Coalizão em Tchumking".8
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Contudo o PCB, sofrendo ainda das influências de sua origem e de uma pouco sólida assimilação do marxismo-leninismo, não soube aprender e considerar essas preciosas lições.

Um marco histórico

Em seu balanço Pedro Pomar afirma:
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"Em 1935, as massas deram um salto em sua consciência sobre a necessidade da revolução, ao perceberem que esta deve ser obra delas próprias, de sua iniciativa, de sua unidade, de seus sacrifícios, de suas ações combativas, de uma orientação justa. (...)
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A importância extraordinária da insurreição de 35 reside no fato de que pela primeira vez situou em forma concreta, em termos práticos, para os militantes comunistas e as forças populares, a tarefa da preparação e do desencadeamento da luta armada.
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Nela foram postulados pela primeira vez e de maneira nova os problemas essenciais da revolução brasileira, na fase atual, melhor caracterizadas suas forças motrizes e seus inimigos fundamentais, indicando o caminho da frente única e o da luta armada, bem como revelada a fisionomia de seu verdadeiro dirigente, o proletariado revolucionário, guiado pelo Partido Comunista do Brasil."*
Notas:
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*Pedro Pomar, A Gloriosa bandeira de 1935, jornal A Classe Operária nº 102, de novembro de 1975.
1 Integralistas-membros de organização brasileira de orientação fascista e com dispositivos paramilitares, fundandada por Plínio Salgado. Utilizavam fardamento militar de cor verde e usavam a saudação em tupi-guarani Anauê!. Eram conhecidos jocosamente por galinhas verdes.
2 Prestes desde o término da Coluna entabulara discussões com o PCB e o Birô Sul Americano da Cominter em Montevidéu, e depois, em Moscou onde residiu, sendo aceito como membro apenas em 1934.
3 O 5 de Julho era uma data memorável da luta anti-oligarquias no país, fora em 5 de julho de 1922 o Levante do Forte de Copacabana e de 1924 a revolução em São Paulo, episódios que conformavam o Movimento Tenentista que deu origem à Coluna Prestes.
4 "O Governo Popular Nacional Revolucionário e o seu programa", maio de 1935 Arquivo Getúlio Vargas (AGV).
5 A Classe Operária nº 180, de 1O de maio de 1935.
6 Plano Cohen — Uma suposta manobra comunista para a tomada do poder através de assassinatos e invasão de lares. O Plano não passava de uma fraude para justificar o golpe de Estado. Frente à suposta "ameaça vermelha", o governo pediu ao Congresso a decretação de estado de guerra, concedido em 10 de outubro de 1937.
7 Forças do Eixo – denominação dada à coligação nazi-fascista formada principalmente pela Alemanha, Itália e Japão.
8 Lima, Heitor Ferreira. Caminhos percorridos – memória de militância. São Paulo, Brasiliense, 1982. Pg. 200.
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