sábado, 1 de fevereiro de 2014

Dialética Proletária (*)



Bertolt Brecht**


“Não se pode escrever peças inteligentes hoje em dia sem conhecer as teorias de Marx” (Brecht)



Posto que a burguesia produz o proletariado e que cresce em seu seio em um permanente conflito de interesses, que todavia é deslocado e posto na sombra por conflito das duas classes contra outras classes, a concepção de vida da classe proletária depende também da classe que o produz. A burguesia produz a dialética como sua maior criação filosófica. Esta é um modo de consideração que busca e encontra, em formações que surgem unitariamente, contradições crescentes; é um modo de consideração que guia o interesse para as mudanças, transformações violentas, evoluções.

Esta dialética, esta filosofia da revolução experimenta sua grandiosa construção (em Hegel) em uma época em que a burguesia havia passado já mais ou menos por uma revolução e se encontra entregue já à conciliação das contradições de interesses, ao emperramento da evolução, tanto que todavia segue e se vê forçada a completar sua revolução.

A construção da dialética por Hegel tem lugar na relação com o proletariado crescente, sob a pressão para a burguesia de produzir cada vez mais proletariado e de obstaculizar cada vez mais sua ameaçante emancipação. O proletariado adota como filosofia da revolução primeiramente a [filosofia] burguesa. A adota em um surpreendente ato de criação. Esta adoção é uma expropriação, esta aplicação é uma aniquilação. Assim como a burguesia faz tudo quanto está em suas mãos para explorar, em sua exclusividade, a revolução contra o feudalismo, assim também dá a luz a uma dialética que mostra todos os sinais de uma degeneração violenta.

A obscuridade da linguagem hegeliana é a obscuridade de uma linguagem secreta: o mundo está em decadência, a humanidade se transforma. A imagem de Hegel tem isto em conta, porém a burguesia recém chegada, a classe que para fazer sua revolução necessitou de outra classe, do proletariado, e que para consolidar sua dominação deve fortalecer cada vez mais esta classe; a burguesia é um mal e inibido introdutor da dialética.

O melhor introdutor é, por sua situação, o proletariado. A burguesia, contemplando a história, escreve uma história de transformações. Porém, este escritor não está em condições de declarar eficazes para o presente ou nem sequer para o futuro os princípios que encontra no passado: “houve história, (porém) já não há” [Hegel]. Bem, outro escritor escreve mais além: a dialética proletária (substituindo a capitalista) (se transforma em sentido materialista e se realiza pela ação) [Marx].

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(*) Tradução de Nildo Viana.

Nota: Este texto de Brecht foi provavelmente escrito durante seu exílio em Svendborg. Este fragmento não foi, até agora, publicado em livro. As notas entre parêntesis são de Karl Korsch, que fez alguns apontamentos nas margens do manuscrito e elas foram parcialmente recuperadas e aqui acrescentadas e as notas entre chaves são do tradutor.

** Bertold Brecht, nasceu em 10 de fevereiro de 1898, em Augsburgo, Alemanha; com formação em Medicina e Ciências naturais, acaba se dedicando ao teatro, escrevendo sua primeira peça com 20 anos de idade (1918). Passa a morar em Berlim a partir de 1924, que é quando conhece o teatro político de Erwin Piscator e começa a estudar o marxismo. Torna-se amigo de Karl Korsch e se envolve no debate sobre estética com Lukács e outros pensadores considerados marxistas. Com a ascensão do nazismo abandona a Alemanha e mora em vários países europeus, bem como nos EUA, continuando o seu trabalho na área do teatro e cinema. Morre em 14 de agosto de 1956.


FONTE: Revista Sociologia em Rede, vol. 3, num. 3, p. 73-74, 2013. (Com Prestes a Ressurgir)

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