quinta-feira, 23 de março de 2017

Movimento Popular Pela Libertação da Palestina e pela Paz no Oriente Médio

                                                                                               
Há sete décadas a ONU optou por uma partilha do território histórico da Palestina, prometendo a criação de dois Estados. Mas enquanto um desses Estados, Israel, existe há 68 anos, o povo palestino continua a aguardar o cumprimento da promessa que a Assembleia Geral da ONU lhe fez e que foi sucessivamente renovada através de inúmeras resoluções do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral que Israel desafia diariamente. 

Israel conduz uma política de apartheid em relação ao povo palestino, e essa situação é denunciada num relatório publicado por uma entidade da ONU que Guterres mandou retirar. A posição assumida por António Guterres, cedendo à pressão de Israel e dos EUA, abre um grave precedente que faz temer o pior sobre o desenrolar futuro do seu mandato.

O MPPM encara com preocupação o papel desempenhado pelo Secretário-Geral da ONU, António Guterres, no processo que conduziu à demissão de Rima Khalaf do posto de Secretária Executiva da Comissão Económica e Social das Nações Unidas para a Ásia Ocidental (CESAO).

A sucessão dos acontecimentos merece ser referida brevemente. Na quarta-feira, 15 de Março, a CESAO publicou um documento histórico em que acusa Israel de apartheid, num relatório que concluía que «Israel estabeleceu um regime de apartheid que domina o povo palestino como um todo».

Os autores do relatório — os estado-unidenses Virginia Tilley e Richard Falk, ambos especialistas em Direito Internacional — «conscientes da gravidade desta alegação […] concluem que os elementos de prova disponíveis estabelecem além de qualquer dúvida razoável que Israel é culpado de políticas e práticas que constituem o crime de apartheid, tal como definido legalmente nos instrumentos do direito internacional». 

O relatório «assenta no mesmo corpo de leis e princípios internacionais de direitos humanos que rejeitam o anti-semitismo e outras ideologias racialmente discriminatórias, incluindo a Carta das Nações Unidas (1945), a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1965)» e «baseia-se para a sua definição do apartheid sobretudo no artigo II da Convenção Internacional para a Repressão e a Punição do Crime de Apartheid (1973)». 

Os autores do relatório sublinham que, «embora o termo “apartheid” tenha sido originalmente associado ao caso específico da África do Sul, representa agora uma espécie de crime contra a humanidade segundo o direito internacional consuetudinário e o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional» acrescentando que «o presente relatório reflecte o consenso dos peritos de que a proibição do apartheid é universalmente aplicável e não foi tornada irrelevante pelo colapso do apartheid na África do Sul e no Sudoeste da África (Namíbia)».

O relatório destacou em especial as políticas discriminatórias de Israel no que diz respeito à terra, consagradas na Lei Fundamental do país (o equivalente à constituição). A CESAO também refere algumas das políticas israelitas de «engenharia demográfica»: a concessão a todos os judeus, em qualquer parte do mundo, do direito de obter a cidadania israelita, enquanto impede a entrada de milhões de palestinos com laços ancestrais documentados à terra em que o Estado de Israel foi criado, em 1948; o impedimento do reagrupamento familiar dos cidadãos palestinos de Israel casados com palestinos dos territórios ocupados; a manutenção de comunidades segregadas dentro de Israel, com uma distribuição de recursos extremamente desigual. 

O relatório salienta ainda a importância fundamental dos diferentes códigos legais israelitas que se aplicam aos palestinos dentro de Israel, em Jerusalém Oriental ocupada, na Margem Ocidental e na Faixa de Gaza cercada como «principal método pelo qual Israel impõe um regime de apartheid».

A publicação do relatório foi de imediato alvo de violentas críticas de Israel e dos Estados Unidos, que exortaram o Secretário-Geral, António Guterres, a demarcar-se formalmente do conteúdo do relatório, e exigindo que o mesmo fosse retirado da página oficial das Nações Unidas. Nesse próprio dia, através de uma declaração do porta-voz do Secretário-Geral, Stéphane Dujarric, António Guterres tornava público o seu distanciamento.
                                                                           
Segundo declarações de Rima Khalaf (foto), António Guterres pediu-lhe, em 16 de Março, que retirasse o relatório e, apesar da solicitação de que reconsiderasse, Guterres terá insistido, o que a levou a apresentar a sua demissão. E de facto, a 17 de Março, o relatório já não estava disponível no site da CESAO. A decisão do Secretário-Geral foi saudada pelos embaixadores de Israel, Danny Danon, e dos Estados Unidos, Nikki Haley, assim como pelas organizações do lobby sionista nos EUA.

O MPPM não pode deixar de condenar a actuação neste caso do Secretário-Geral da ONU, António Guterres, premiando o país que mais vezes violou as resoluções da ONU, Israel, em detrimento do martirizado povo palestino, para com o qual a ONU tem uma pesada e irrenunciável dívida histórica. 

Não podemos esquecer que há sete décadas a ONU optou por uma partilha do território histórico da Palestina, prometendo a criação de dois Estados. Mas enquanto um desses Estados, Israel, existe há 68 anos, o povo palestino continua a aguardar o cumprimento da promessa que a Assembleia Geral da ONU lhe fez e que foi sucessivamente renovada através de inúmeras resoluções do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral que Israel desafia diariamente.

O MPPM enaltece a posição de verticalidade assumida por Rima Khalaf e considera a decisão de António Guterres, cedendo perante as pressões de Israel e dos Estados Unidos da América – numa altura em que este último país discute cortes à comparticipação financeira para o orçamento da ONU – como gravemente atentatória do prestígio, independência e da própria razão de ser das Nações Unidas. 

Nesta ocasião, vale a pena recordar que, em Outubro de 2016, aquando da eleição de António Guterres, o embaixador de Israel na ONU, Danny Danon expressava votos que, com o novo Secretário-Geral, a ONU abandonasse a sua “obsessão com Israel”. A posição ora assumida por António Guterres, confirmando os receios suscitados por aquela declaração do representante de Israel, abre um grave precedente que faz temer o pior sobre o desenrolar futuro do seu mandato.

O MPPM reitera nesta ocasião os votos que formulou na carta que dirigiu a António Guterres por ocasião do início do seu mandato como Secretário-Geral da ONU: que este seja o mandato em que as Nações Unidas saldem a dívida histórica que têm para com o povo da Palestina. 

Só revendo a atitude que desta vez assumiu e adoptando uma posição consentânea com as resoluções da ONU, António Guterres defenderá a autoridade e prestígio da organização que dirige, e poderá favorecer uma solução justa do drama do povo palestino. Só assim a ONU poderá contribuir para a paz em todo o Médio Oriente, para a paz mundial.

Lisboa, 22 de Março de 2017

A Direcção Nacional do MPPM

(Com Odiario.info)

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