quinta-feira, 25 de abril de 2019

Revolução dos Cravos comemora 45 anos

                                                                        
  Havana, (Prensa Latina) Depois de quase meio século de ditadura, Portugal acordou em 25 de abril de 1974 com uma Revolução insólita, iniciada depois das primeiras notas de uma canção e cujo símbolo seriam as flores vermelhas nas armas dos militares insurgidos.

'Terra de fraternidade/ o povo é quem mais ordena dentro de você/ oh cidade' foram os versos escutados na madrugada desse dia e os detonantes de um levantamento sem precedentes, organizado por oficiais descontentes e respaldados por milhares de cidadãos cansados do silêncio, das torturas e da exploração.

Com Grandola, Villa Morena -do músico e compositor José Afonso- como hino, a rebelião não só pôs fim ao regime de Antônio de Oliveira Salazar (1889-1970) e seu sucessor Marcelo Caetano (1906-1980), mas também restaurou a democracia no país e propiciou a descolonização de Angola, Guiné Bissau e Moçambique.

Ocorrida há 45 anos, a Revolução dos Cravos devolveu a Portugal e ao mundo a fé em um futuro mais justo e na possibilidade de derrotar, mediante a mobilização popular, a governos e defensores de posturas fascistas.

Apesar de ter à Espanha de Francisco Franco como vizinha, os portugueses saíram às ruas para acabar de uma vez e por todas com uma ditadura insustentável e o fizeram em um dia, de forma pacífica.

O que foi concebido como um levantamento militar ou golpe de Estado terminou sendo uma mobilização cidadã com grandes repercussões para a história e o futuro dessa nação.

Em 1974, Portugal encontrava-se à beira de um abismo devido às políticas defendidas durante o chamado Estado Novo por Salazar, que em 1926 tinha sido nomeado titular das Finanças e desde 1932 era o premiê.

Seu longo período à frente do país caracterizou-se pelo autoritarismo, a repressão e assassinato dos contrários a sua administração, a proibição do sindicalismo, da militância em formações opositoras e das liberdades fundamentais.

Para isso se apoiou na Polícia Internacional e de Defesa do Estado, encarregada de reprimir qualquer protesto ou tentativa de sublevação.

Desde sua chegada ao poder, Salazar defendeu um regime totalitarista, que mantinha vínculos com a Alemanha nazista e o franquismo, mas também flertava com Estados Unidos e os aliados e ingressou à Organização do Tratado do Atlântico Norte em 1949.

Apesar da rejeição da população portuguesa e da comunidade internacional, fazia questão de continuar com o colonialismo e optou pela guerra como via para acabar com os movimentos independentistas em países como Guiné Bissau, Angola e Moçambique.

Incapacitado por problemas de saúde, Salazar foi substituído em 1968 por Caetano, que deu continuidade às políticas do Estado Novo.

Depois de 48 anos de ditadura, em Portugal predominava a desigualdade social, a pobreza e o descontentamento pelas guerras no continente africano.

De acordo com o pesquisador Miguel Ángel Pérez, além das carências econômicas e das violações dos direitos, a população estava descontenta pela implementação de um serviço militar de quatro anos, incluídos dois nas colônias, o qual deviam cumprir também os jovens de classe média.

Milhares de rapazes morreram ou sofreram afetações graves devido à decisão do Governo de manter seu controle sobre outras nações.

O anterior provocou uma radicalização do movimento estudantil, entretanto as despesas militares- mais de 45 por cento do orçamento do Estado- puseram o país em uma situação crítica.

Os militares lusos começaram a mostrar sua inconformidade com a situação existente e tomaram consciência de que era necessária uma solução política que fizesse cair à ditadura, explica Pérez.

Nesse contexto, o 25 de abril de 1974, oficiais portugueses agrupados no Movimento das Forças Armadas decidiram pôr fim ao regime iniciado por Salazar e continuado por Caetano, e tomaram as principais ruas e instituições do país.

Apesar da petição realizada aos cidadãos de permanecer em seus lares, milhares deles respaldaram a sublevação militar e o golpe se converteu em Revolução.

Durante as ações desse dia, a jovem Celeste Caeiro presenteou uns tulipas que levavam vários oficiais, que os colocaram em seus fuzis.

O gesto foi repetido por outras pessoas e converteu-se em símbolo das intenções de paz da mobilização.

Seis dias depois, ao redor de quatro milhões de portugueses celebraram no Dia Internacional dos Trabalhadores, livres da ditadura que os oprimiu por tanto tempo.

Os militares, junto aos cidadãos, não só conseguiram a queda do regime e a rendição de Caetano, mas deram o passo para um período de importantes reformas sociais em áreas como a saúde, a educação, a segurança social, os direitos e a igualdade de gênero.

Não obstante, a falta de um programa bem definido e de uma liderança verdadeiramente revolucionária, as divisões e as crises geradas por forças de direita, entre outros elementos, implicaram em uma grande instabilidade que se refletiu na existência de seis governos provisórios em dois anos, a perda do poder popular sobre os bens do país e a volta da burguesía ao poder.

Apesar da sua curta duração, o movimento iniciado em 25 de abril representa, em palavras do político e lutador José Vitoriano (1918-2006), 'a conquista da liberdade e a democracia pelo povo de Portugal e reafirma sua vontade inquebrantável de defender esses princípios'.

O ocorrido em abril de 1974 'é uma lição de patriotismo, um exemplo de amor e uma mostra de que os ideais progressistas saberão sempre encontrar forças e homens capazes dos pôr em prática', assinalou Vitoriano quatro anos após esses acontecimentos.

A Revolução dos Cravos opôs-se à opressão, à violação dos direitos fundamentais, a guerra, o colonialismo, a violência e a fome. Refletiu a negativa dos cidadãos a sacrificar os interesses nacionais e a vida dos jovens somente para satisfazer as aspirações de potências estrangeiras e minorias privilegiadas, sentenciou.

Por sua vez, o dirigente do PCP Jerônimo de Sousa assegurou que o espírito e os valores defendidos naquele tempo continuam vivos nos corações lusos.

Para a deputada comunista Diana Ferreira, os acontecimentos de abril trouxeram liberdade e esperança a Portugal e demonstraram que a luta do povo é imprescindível para uma verdadeira transformação social.

Em sua opinião, a melhor maneira de comemorar essa gesta, 45 anos depois, é não esquecer jamais os tenebrosos 48 anos da ditadura fascista que semeou pobreza, fome, miséria, analfabetismo e doença; impôs o trabalho infantil e submeteu às mulheres; instaurou a corrupção política do Estado, censurou, oprimiu e criou o campo de concentração de Tarrafal.

Apesar da passar dos anos, a Revolução dos Cravos continua sendo um exemplo para quem consideram que um país não pode viver amordaçado, nem seu povo oprimido.

Como em 1974, os versos 'Na cada canto um amigo/ na cada rosto igualdade' retumbam hoje nas ruas portuguesas e recordam o que podem chegar a conseguir os povos quando lutam.

(Com Prensa Latina)

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