quinta-feira, 14 de novembro de 2013

INTERVENÇÃO DO PCB NO XV ENCONTRO INTERNACIONAL DOS PARTIDOS COMUNISTAS E OPERÁRIOS

                                                                       
                          Lisboa, novembro de 2013,XV encontro dos Partidos Comunistas e Operários

"O Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro (PCB) saúda a todos os partidos comunistas e operários presentes neste evento e cumprimenta o partido anfitião, o Partido Comunista Português (PCP), referência para todos os comunistas e trabalhadores do mundo em função de sua histórica luta contra o capital.

O nosso XV Encontro dos partidos comunistas e operários se realiza em meio a uma conjuntura internacional complexa tanto para o capital quanto para os trabalhadores de todo o mundo. A crise econômica mundial vem castigando o sistema capitalista há cerca de seis anos. Trata-se de uma crise longa, profunda e devastadora que está colocando em xeque todo o arcabouço da velha ordem capitalista construída no pós-guerra.

Essa crise evidencia de maneira mais clara a ação articulada do capital no sentido de avançar sobre as finanças do Estado, cortar direitos e garantias dos trabalhadores e se apropriar do patrimônio público. Do ponto de vista político, o capital vem impondo aos povos governos diretamente geridos pelos representantes do capital, cujas ações aprofundam a repressão contra os trabalhadores e colocam mais limites à limitada democracia burguesa.

Estamos diante de um estado de guerra permanente contra os trabalhadores e os povos do mundo, no qual o grande capital busca, de um lado, sair da crise colocando todo o ônus na conta dos trabalhadores e, de outro, promover uma guerra de rapina contra os países periféricos, especialmente aqueles que dispõem de riquezas naturais não renováveis.

O aprofundamento da crise, as dificuldades em administrá-la  e as lutas dos trabalhadores e dos povos contra o capital tem tornado o imperialismo cada vez mais agressivo. Além das invasões do Iraque e Afeganistão, o imperialismo invadiu a Líbia, matou seu presidente e se apossou das imensas riquezas de petróleo do País. Ameaça invadir a Síria e o Irã, realiza ataques com aviões não tripulados contra dezenas de países, violando as leis internacionais e matando inocentes  e desenvolve contínua provocação contra a Cuba, Venezuela e Coréia do Norte.

Diante de um quadro dessa ordem, os trabalhadores vão tomando consciência da conjuntura, num processo de aprendizagem mais rápido que nos tempos de calmaria. Como em todas as crises capitalistas, este é um momento em que o sistema como um todo vê aumentadas as dificuldades para administrar sua hegemonia, fato que abre janelas de oportunidades para a emergência do movimento popular, dos trabalhadores e da população em geral. Aos poucos os trabalhadores vão exercitando as ações de massas, as mobilizações, as greves, vão reorganizando suas forças e a luta de classe se intensifica.

Na primeira onda da crise, a resposta dos trabalhadores foi pouco expressiva, uma vez que todos foram tomados de surpresa diante da crise. No entanto, à medida em que os governos começaram a tomar medidas concretas contra os salários, pensões, direitos e garantias, os trabalhadores começaram a resistência contra os ajustes, com mobilizações, manifestações de rua e greves gerais. Essas manifestações foram se espalhando por todos os continentes, da Europa ao Norte da África, da Índia à América Latina, inclusive nos Estados Unidos.

Ressalte-se que na Europa ocorreu no final do ano passado um fenômeno promissor: pela primeira vez na história, os trabalhadores conseguiram realizar uma greve geral internacional, envolvendo 25 países, atualizando dessa forma a palavra de ordem dos fundadores do marxismo, que é proletários do mundo, uni-vos! 

Muito embora essas lutas ainda tenham um caráter espontâneo, sem uma vanguarda revolucionária para conduzir os trabalhadores no enfrentamento ao capital, nem um programa anticapitalista unificador, podemos dizer que atualmente a luta de classe mudou de patamar e as fissuras abertas na velha ordem imperialista abrem espaço para a emergência da luta popular.

Num mundo globalizado em que a velocidade das informações circula de maneira extraordinária, as lutas e mobilizações em um determinado país também funcionam pedagogicamente para outras regiões, apesar da grande manipulação realizada pelos meios de comunicação. Mesmo assim, não podem mais esconder as manifestações populares e isso influencia a psicologia das massas para a luta – as pessoas vão perdendo o medo e despertando energias para as ações coletivas.

Numa conjuntura dessa ordem, achamos fundamental realizarmos o combate não só contra o capitalismo e o imperialismo, mas também ao reformismo. Aliás, os reformistas, mais do que nunca, são grandes inimigos da revolução socialista, pois iludem os trabalhadores e os desmobilizam, facilitando o trabalho do capital. 

Em cada país, as classes dominantes forjam um bipartidarismo conveniente em que as divergências, cada vez menores, se dão no campo da administração do capital.

Cada vez mais também faz menos sentido a “escolha” de aliados no campo imperialista e mesmo entre seus coadjuvantes emergentes. Nós entendemos que não há um imperialismo do “bem” e um imperialismo do “mal”. A diferença é apenas na forma, não no conteúdo. Isto não significa subestimar as contradições que vicejam entre eles, mas entender que  têm objetivos idênticos.

Não podemos conciliar também com ilusões de transição ao socialismo por vias fundamentalmente institucionais, através de maiorias parlamentares e de ocupação de espaços institucionais. A luta de massas, em todas as suas formas, adaptada às diferentes realidades locais, é e continuará sendo a única arma de que dispõe o proletariado para a conquista do poder.

Temos avaliado também que o atual modelo de encontros de partidos comunistas e operários vêm cumprindo importante papel de resistência, mas precisa se adaptar às complexas necessidades da conjuntura mundial, com suas perspectivas sombrias no curto prazo e suas possibilidades de acirramento da luta de classes, com a emergência das lutas operárias. Pensamos que é preciso romper com o “encontrismo” em que, ao final dos eventos, nossos partidos formulam um documento genérico e decidem a sede do próximo encontro e se despedem até o ano seguinte.

Para potencializar o protagonismo dos partidos comunistas e do proletariado no âmbito mundial, é necessária e urgente a constituição de uma coordenação política que, sem funcionar como uma nova internacional, tenha a tarefa de organizar campanhas mundiais e regionais de solidariedade, contribuir para o debate de ideias, socializar informações sobre as lutas dos povos.

Mas, para além da indispensável articulação dos comunistas, parece-nos importante a formação de uma frente mundial mais ampla, de caráter antiimperialista, onde cabem forças políticas e individualidades progressistas, que se identifiquem com as lutas em defesa da autodeterminação dos povos, da paz entre eles, da preservação do meio ambiente, das riquezas nacionais, dos direitos trabalhistas, sociais e políticos; contra as guerras imperialistas e a fascistização das sociedades. Em resumo, as lutas em defesa da humanidade.

Deixamos claro que o nosso Partido valoriza todas as  formas de luta. Não podemos cair no oportunismo de fazer vistas grossas ao direito dos povos à rebelião e à resistência armada. Em muitos casos, esta é a única forma para fazer frente à violência do capital e de superá-lo. Os povos só podem contar com sua própria força.

Por isso, saudamos nossos irmãos colombianos que, nas cidades e nas montanhas, resistem, através de variadas formas de luta, contra o estado terrorista de seu país. Entendemos que não há solução militar para o conflito colombiano. Nesse sentido, saudamos os diálogos que têm como objetivo buscar uma solução política para o conflito. Este diálogo só foi possível pelo surgimento e desenvolvimento da Marcha Patriótica, um combativo e amplo movimento de massas colombiano.

Saudamos os povos que hoje enfrentam as mais duras batalhas. Saudamos os trabalhadores gregos, portugueses, espanhóis, que já se levantam em greves nacionais e mobilizações e os demais trabalhadores da Europa, que enfrentam terríveis planos do capital para tentar superar a crise. Saudamos o povo palestino, em sua saga duradoura e dolorosa no enfrentamento ao sionismo que o sufoca e reprime, ocupa seu território, derruba suas casas, prende seus melhores filhos e impede seu direito a um Estado soberano.

Saudamos nossa querida Cuba Socialista em sua luta contra o cruel bloqueio ianque. Saudamos nossos Cinco Heróis. Saudamos os processos de mudanças na América do Sul (Venezuela, Bolívia e Equador), neste momento decisivo, uma encruzilhada entre o avanço dos processos ou sua derrota.

No entanto, estamos muito preocupados com o verdadeiro cerco militar que o imperialismo promove na América Latina. A reativação da IV Frota norte-americana, com um poderio bélico maior do que a soma de todas as forças armadas dos países latino-americanos, traz ameaças à soberania e à paz na região. 

O estabelecimento de dezenas de bases militares dos EUA na região inquieta os latino-americanos. A considerar ainda a construção de um aeroporto militar ianque no Paraguai, que possibilita o controle da tríplice fronteira (Brasil, Argentina e Paraguai) e onde se assenta a maior reserva mundial de água doce, o Aquífero Guarani.

Mas não é só o imperialismo estadunidense que cerca a América Latina. A OTAN construiu, em 1986, na Ilha Soledad do Arquipélago das Malvinas, a grande base militar de Mount Pleasant, que dispõe de aeroporto e porto naval, onde atracam submarinos atômicos e foram construídos silos para armazenar armas nucleares e instalações para aquartelar milhares de efetivos militares. Essa fortaleza contraria expressamente, a Resolução 41 da ONU, que considera o Atlântico Sul zona de paz e cooperação, isenta de armamentos e engenhos nucleares.

A ocupação militar imperialista no Atlântico Sul permite o controle das rotas marítimas que unem a América do Sul à África e sua conexão com o continente da Antártica e com os países do Pacífico, através do Estreito de Magalhães. Além disso, permite o controle dos inúmeros recursos naturais da plataforma continental da América do Sul. É assim que a América Latina está cercada por terra e por mar pelas forças militares imperialistas, com a omissão da grande maioria dos governos locais.

O governo do capital e as lutas sociais

Com relação ao nosso País, gostaríamos de enfatizar que temos um governo que se apresenta internacionalmente como progressista, mas objetivamente trabalha para o capital, deixando para o povo apenas algumas migalhas da política de compensação social. No Brasil, nunca os banqueiros, as empreiteiras, o agronegócio e os monopólios tiveram tanto lucro. 

A política econômica e a política externa do estado brasileiro estão a serviço do projeto de fazer do Brasil uma grande potência capitalista internacional, nos marcos do imperialismo. As empresas multinacionais de origem brasileira, alavancadas por financiamentos públicos, já dominam alguns mercados em outros países, notadamente na América Latina.

Hoje, o governo brasileiro é o organizador da transferência da maior parte da renda e da riqueza produzida pelo país para as classes dominantes, através do pagamento dos juros e do sistema tributário altamente regressivo. Cerca de 50% do orçamento se destina a pagar os juros e a amortização da dívida interna e externa, para satisfação dos rentistas e dos grandes monopólios nacionais e internacionais.

A crise mundial também chegou ao Brasil. Ainda sem a profundidade que ocorre nos países centrais, a crise econômica, social e política é uma realidade em nosso País. A economia vem registrando um crescimento baixo, apesar das privatizações generalizadas realizadas pelo governo Dilma, disfarçadas sob a denominação de concessões público-privadas. Agora mesmo, estão entregando ao capital privado a  maior jazida de petróleo do País num ato de verdadeira lesa-pátria  contra os interesses da população brasileira.

Do ponto de vista social, a situação não é das melhores: a população convive diariamente com o caos urbano, representado por um sistema de transporte caótico, que faz os trabalhadores perderem cerca de quatro horas para ir e vir do trabalho. O setor de saúde foi privatizado e o que resta de saúde pública é tão indigna que não merece esse nome: as pessoas são obrigadas a ficar dias em filas nos postos de saúde e os doentes são jogados em macas pelo chão de praticamente todos os hospitais públicos. A falta de moradia faz com que 25 milhões de pessoas vivam em favelas  e habitações precárias, sem infraestrutura e saneamento básico,  com esgoto a céu aberto, sem água encanada e coleta de lixo.

Foi contra essa estado de coisas que milhões de brasileiros se manifestaram nas ruas de mais de 600 cidades do País em junho deste ano. Essas  manifestações foram resultado de um acúmulo de problemas sociais, econômicos e políticos que vinham se gestando por longos anos no interior da sociedade e foi exatamente essa situação que alimentou a fúria dos manifestantes. Milhões de jovens e trabalhadores despertaram com indignação para a luta e foram às ruas demonstrar sua insatisfação contra a ordem dominante e o governo social-liberal do Partido dos Trabalhadores. 

Em nosso entendimento, as manifestações de junho iniciaram um novo ciclo de lutas sociais e políticas no Brasil. Podemos dizer que agora as massas estão completando a sua experiência com o governo do PT e buscam novas alternativas para resolver seus problemas concretos. Se torna cada vez mais claro para as massas que o PT governa para o capital monopolista nacional e internacional, para os banqueiros e o agronegócio e que suas organizações de massa, como a Central Única dos Trabalhadores, foram cooptadas pelo governo e não cumprem mais nenhum papel na mobilização dos trabalhadores, tanto que essa instituição não teve qualquer relevância nas mobilizações de junho.

Com as manifestações, uma geração inteira se integra de forma ativa à luta de classes em todo o País. As manifestações também demonstraram uma enorme crise de representatividade no Brasil. O aparato institucional, representado pelo Executivo, Legislativo e Judiciário não é reconhecido pela populaçãon como sua representação, em função da falta de resposta às reivindicações populares e da truculência com que o Estado e as forças policiais tratam a população mais pobre e os trabalhadores. Os partidos políticos burgueses, em sua grande maioria, estão também desmoralizados pela corrupção, pelas negociatas e pelas promessas não cumpridas.

O Partido Comunista Brasileiro entende que as manifestações de junho representaram uma extraordinária jornada de lutas do povo brasileiro. Estamos apenas no início de um ascenso das lutas sociais, cujo desdobramento não é ainda possível vislumbrar. Temos consciência que a luta apenas começou. A população brasileira perdeu o medo e a passividade e começou a aprender que a luta nas ruas gera conquistas e representa uma força gigantesca Uma segunda onda da luta social poderá vir em breve e nós estamos trabalhando duro para que nessa jornada, a esquerda revolucionária tenha um papel protagonista.

Viva a luta internacional dos trabalhadores!

Partido Comunista Brasileiro (PCB)" (Os grifos são meus, José Carlos Alexandre)


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