Carlos Morais (*)
Neste texto, destacado dirigente político galego, fala-nos da dificuldade da luta na Galiza e como o revisionismo ainda reinante e o aparecimento de um esquerdismo estéril e inconsequente, dificulta a luta revolucionária.
Uma das consequências da crise estrutural do capitalismo senil na Galiza é o profundo terramoto sofrido pela quase totalidade das organizações situadas no campo popular.
Refiro-me à crise permanente que sangra a esquerda nacionalista tradicional, à implosão sofrida pela esquerda independentista, ao eclodir das mal denominadas novas forças políticas que provocaram uma alteração do mapa da esquerda na Galiza, ao fora de jogo permanente em que se colocou o sindicalismo de classe, à ausência de movimentos populares de orientação subversiva para além das inofensivas declarações e propaganda na rede.
Mas um fenómeno novo tem acompanhado esta etapa de refluxo do movimento de massas provocada pelo ilusionismo eleitoral que tem congelado a luta popular, as greves, a conflituosidade social, contribuindo assim para estabilizar o regime do capitalismo espanhol na Galiza.
Refiro-me ao aparecimento de grupos que, reclamando-se do marxismo, pretendem ocupar e organizar a esquerda revolucionária.
Porém, por muito boas intenções de boa parte das pessoas que os promovem, estes grupos estão à partida esterilizados para se consolidarem como força subversiva, como vanguarda revolucionária.
Por um lado reproduzem um paradigma espanhol semelhante ao da burguesia que afirmam combater. Embora evoquem e até mesmo recolham no seu programa o direito de autodeterminação, nada fazem para que se concretize.
Este direito aparece desde os primeiros anos de fundação no programa do PCE e das suas cisões dos anos sessenta, setenta e oitenta do século passado, como uma mera formalidade democrática, que a sua prática nega diariamente, agindo como agentes da assimilação espanhola que promove a oligarquia.
A negação da Galiza como quadro nacional de luta de classes, portanto não aplicando o princípio de auto-organização da classe operária galega num partido comunista próprio, constata as limitações congénitas do seu chauvinismo espanhol, ideologia antagónica com os interesses objetivos da classe operária e com o conjunto do povo trabalhador.
A carência de uma formação ideológica sólida, alicerçada no estudo e reflexão da teoria de Marx e Lenine, da trágica evolução da Revolução bolchevique, de suas deformações e degenerações, faz com que, frente à linha conciliadora eurocomunista instalada no comunismo espanhol, à sua consabida prática social-democrata e colaboracionista, optem por identificar o estalinismo como a vacina frente ao processo de aceleração da coexistência pacífica, renúncia à luta revolucionária emanada do XX Congresso do PCUS, e suas nefastas consequências nos partidos comunistas tradicionais. Como se a orientação do PCUS desde os anos trinta fosse um exemplo a seguir! Recordemos que Lenine já em 1921 definiu a URSS como um “estado operário burocraticamente degenerado”.
Sem qualquer dúvida é necessário recolocar a luta de classes na centralidade da política galega, desmascarar sem tréguas o cancro do “cidadanismo” e dos “interesses da gente”. Combater a história nacionalista espanhola e a lógica da alternância política da ditadura burguesa que une PP, PSOE, Podemos, IU e C’s.
Mas também a narrativa do nacionalismo e independentismo essencialista galego que nega na sua acção teórico-prática a luta de classes, insistindo em que a contradição principal é Galiza-Espanha, através de uma leitura estreita e idealista do País. E obviamente destacar o relativismo dessa falsa nova esquerda articulada nas Marés que não representa mais do que a renovação da narrativa e da prática social-democrata, totalmente inofensiva para o capitalismo.
A totalidade da esquerda reformista e até mesmo da chamada esquerda radical, tem interiorizado as categorias e conceitos do capital, usando terminologia idêntica à da burguesia, reproduzindo assim a ideologia dominante no movimento popular, domesticando a classe operária, desarmando o seu potencial antagónico, fazendo de muro de contenção das reivindicações e lutas, canalizando-as pela fracassada via eleitoralista.
A mínima expressão de rebelião, de exercício de autodefesa, é imediatamente abafada e condenada por questionar os “mecanismos democráticos”. Esta é a esquerda que a direita necessita para perpetuar sob a fachada democrática a exploração e dominação da maioria social.
Não nos deixemos seduzir por essas discursos, enganar por estas iniciativas, que aparentemente pretendem articular a partir do auto-ódio uma alternativa revolucionária desde o campo do “marxismo-leninismo”, mas sempre formatado em Madrid e / ou tendo como referência a capital do Ibex 35.
A classe trabalhadora da Galiza necessita de um partido comunista com capacidade de direção política, de mobilização de massas, que organize e prepare a revolução. Que nos dias de hoje lamentavelmente não existe!
Para garantirmos o êxito desta tarefa imensa é necessário acreditar nas nossas forças como povo, como nação, nas especificidades e caraterísticas próprias da morfologia social galega, só a partir das quais é possível construir essa ferramenta de luta e combate que deve ser o partido comunista. No nosso caso um partido comunista que tenha como uma das suas tarefas prioritárias a libertação nacional da pátria de Benigno Álvares, O Piloto, Luís Soto e Moncho Reboiras.
Nisso andamos desde que em 1996 se fundou a Primeira Linha.
(*) Carlos Morais é membro do Comité Central de Primeira Linha e da Direcção Nacional de Agora Galiza
Fevereiro de 2016
Tradução do Galego para português de Guilherme Alves Coelho
(Com odiario.info)
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