Não queremos rosas, queremos a emancipação!
Chegamos ao 8 de março! O Dia Internacional da Mulher! Essa justa homenagem às mulheres foi proposta por Clara Zetkin – militante do Partido Comunista Alemão – em 1910. A data tem sido comemorada no Brasil e no mundo de uma forma bastante festiva, sobretudo, através da distribuição de presentes, como rosas e cosméticos, nos centros comerciais e shoppings das cidades.
Antes de qualquer coisa, é importante lembrar o motivo pelo qual o dia 8 de março foi escolhido como o Dia da Mulher. No Brasil e em alguns países da América Latina, é dito que a data relembraria um incêndio que matou mulheres operárias em uma fábrica estadunidense.
De fato, no dia 25 de março de 1911, irrompeu um grande incêndio na fábrica de tecidos denominada Triangle Shirtwaist Company, ocasionando a morte de 146 pessoas (dentre elas, 125 mulheres e 21 homens). É verdade que algumas trabalhadoras da Triangle tinham algum envolvimento com o movimento operário e de mulheres, efervescentes naquele contexto.
No entanto, no dia do incêndio, todas trabalhavam normalmente. A estrutura de madeira, a grande quantidade de tecidos e retalhos, a instalação elétrica precária e as portas trancadas durante o expediente facilitaram que o fogo tomasse o local. Após a tragédia, houve um funeral com a presença de mais de 100 mil trabalhadores e o pressionamento sindical alcançou vitórias, conquistando mudanças nas condições de segurança no trabalho.
Sem sombra de dúvidas, o episódio da Triangle merece estar em nossa memória, lembrando as péssimas condições dos locais de trabalho e as conquistas do movimento sindical. Entretanto, o Dia Internacional da Mulher foi escolhido pelas feministas somente na década de 1960, em homenagem a trabalhadoras russas do setor de tecelagem, que entraram em greve no dia 8 de março de 1917.
Essa greve de tecelãs deu início a diversos levantes, levando mulheres russas às ruas exigindo pão e o fim da guerra, que desembocariam na Revolução de Outubro. Portanto, independentemente das controvérsias em torno dessa data, trata-se de um dia em memória da trajetória de luta das mulheres. Uma luta por dignidade, igualdade de direitos e salários, e também por uma sociedade mais justa.
É reverenciando essa dura batalha e homenageando todas as jovens mulheres filhas da classe trabalhadora que escrevemos esse texto: a elas, que sobrevivem à dureza do patriarcado todos os dias e em todos os âmbitos da vida!
Não podemos esquecer que a opressão da mulher se inicia no ambiente familiar, e é aplicada por seus pais, irmãos e maridos, através do reforço da posição de submissão desde a sua infância, violência psicológica e mesmo física, aplicadas tanto em ambientes públicos quanto privados.
Lembramos, também, que mais de 50% dos homicídios de mulheres são caracterizados como feminicídios, ou seja, crimes envolvendo violência doméstica, menosprezo ou discriminação à condição feminina.
Mais de 30% das mulheres assassinadas no Brasil foram mortas por seus parceiros ou ex-parceiros, enquanto quase 100.000 procuram atendimento médico por violência física, sendo que a maior parte dos agressores são pessoas conhecidas.
O ambiente de estudo dessas mulheres também não deixa de ser um ambiente opressivo. No Brasil, a mulher só começou a frequentar a escola em meados do século XVIII (dois séculos depois dos homens) e, ainda assim, as escolas destinadas às meninas direcionavam o ensino para que essas se tornassem “boas mães e esposas”. Ainda hoje, o ambiente escolar é extremamente machista.
Os professores de modo geral e a educação formal reproduzem os estereótipos de gênero, considerando as meninas naturalmente menos preparadas intelectualmente, menos focadas, pouco aptas a algumas atividades físicas, etc.
Podemos estender essas características ao ambiente universitário, no qual as piadinhas depreciativas direcionadas às mulheres são uma constante. Tanto na escola quanto na universidade, o assédio sexual é uma realidade cotidiana – pode começar com um trote machista, passar pela cantada de um professor, uma situação de abuso na moradia estudantil e terminar em estupro.
Além disso, é notável que as professoras mulheres ainda ganham menos, dificilmente são contratadas em escolas prestigiadas, se apresentam como minoria nas universidades e são claramente arrastadas para o ensino infantil, reforçando o papel da mulher como cuidadora e reprodutora.
E o que dizer do trabalho feminino? As mulheres ainda ocupam os piores empregos, ganham menos que os homens pelas mesmas funções e são maioria no setor informal. Como se não bastasse, o assédio sexual é naturalizado em todos os ambientes de trabalho e utilizado como moeda de troca pelos patrões. Como se sabe, a presença expressiva das jovens mulheres no mundo do trabalho e a conquista de espaço na universidade não foram acompanhadas de distribuição das tarefas do lar. Portanto, a dupla ou tripla jornada é uma realidade.
Vale lembrar, no entanto, que boa parte das jovens trabalhadoras, por fatores econômicos, e pela sobrecarga de trabalho em seus empregos e ambiente doméstico, sequer podem sonhar em fazer um curso superior. Devido à cobrança do mercado por qualificação, são essas últimas que realizam os trabalhos menos valorizados na sociedade, nos setores de limpeza, vestuário e alimentação.
Na atual conjuntura, em que a classe trabalhadora está pagando a tão mencionada “crise” com arrocho salarial, demissões, aumento do valor das passagens do transporte público, inflação, alta dos preços dos alimentos, impostos, etc, a condição da jovem trabalhadora se agrava duplamente. No caso de desemprego, as jovens mulheres das camadas mais populares são aquelas que, majoritariamente, buscam sustento através da prostituição quando nessa condição.
A grande justificativa utilizada para não contratar mulheres está no fato de que o empregador não quer arcar com faltas e cobrir licença-maternidade. Nas entrevistas de emprego, as mulheres ainda são questionadas sobre a vontade de ter filhos e planos familiares. Das vagas com carteira assinada no setor privado, 59.6% são ocupadas por homens.
Observamos, com esses dados, que o cuidado das crianças ainda é visto como tarefa exclusiva da mulher. Para piorar, muitas empresas flexibilizam a licença-maternidade de 180 dias (tempo em que o bebê necessita de aleitamento materno como fonte única de alimentação) para 120 dias e, raramente, existem creches para as mulheres empregadas nesses locais. Esses problemas, muitas vezes, forçam pedidos de demissão e, quase sempre, levam à sobrecarga física e emocional dessas mulheres.
Da mesma forma, as mães estudantes (solteiras, na maior parte dos casos) não tem direito a matricular suas crianças em creches públicas durante o período de estudo. Nas universidades, devido à inexistência de uma politica de permanência para essas mães, o quadro atual é de alto índice de desistência.
Em contrapartida, nossa legislação referente ao aborto – que já era limitada – tende a retroceder ainda mais com os projetos de lei em curso. Além disso, o poder público não promove nenhum debate aberto sobre a questão, nem investe em politicas de planejamento familiar e educação sexual.
No país, as complicações do aborto ilegal ocupam o terceiro lugar dentre as causas de mortalidade materna. As vitimas? Mulheres jovens, pobres e negras, as quais não possuem condições socioeconômicas para realização de técnicas seguras e são submetidas aos procedimentos mais arriscados e precários.
Já as jovens que optam pela maternidade e que dependem dos serviços públicos serão vítimas de violência obstétrica, negligenciadas durante toda a gravidez, submetidas a cesáreas compulsórias e técnicas ultrapassadas no momento do parto.
Lembramos, também, das companheiras militantes. Como observamos nos parágrafos anteriores, há muitos entraves para que as mulheres se organizem e protagonizem as lutas. Esses obstáculos estão ligados à educação familiar, ao constante menosprezo de sua condição humana, mas também à sobrecarga com atividades do lar, do trabalho e ambiente de estudo.
Ainda, os espaços políticos onde essas mulheres militam não estão isentos de práticas e visões machistas. Desse modo, parabenizamos todas as companheiras engajadas na luta feminista e anticapitalista, e apontamos a necessidade de formar mais quadros mulheres no interior das organizações políticas.
Por fim, lembramos que não é só na data escolhida que a emancipação da mulher e o fim do capitalismo possuem nexo. Na verdade, é justamente no capitalismo que a utilização da opressão das mulheres torna-se mais indispensável do que nunca. O reforço do patriarcado, que aprofunda as relações de poder dos homens sobre as mulheres, colocando às últimas como inferiores e “naturalmente” incapazes, tem como fim último superexplorá-las e arrastá-las para as condições mais subalternas em nossa sociedade.
A opressão é um meio de ampliar os lucros da burguesia, como observamos acima. Essa obtenção de lucro, inclusive, pode manifestar-se de forma ainda mais nefasta, quando a mercantilização e a objetificação do corpo feminino são combinados – é o que ocorre na indústria pornográfica e no tráfico de mulheres e crianças.
Temos visto, com frequência, a exaltação de um feminismo “bem comportado”, o qual questiona a desigualdade entre homens e mulheres, sem tocar na raiz dessa opressão ou contestar a sociedade de classes. Perguntamos: nos limites do capitalismo, em que a subordinação das mulheres necessita ser reforçada, como é possível que todas elas conquistem sua autonomia completa? O único caminho possível para emancipação de todas as mulheres é o socialismo.
É com atenção a todos esses pontos, que o 8 de março não deve ser uma data de celebração da “feminilidade” ou de elogio às “características próprias da mulher”. Expressões que, em última análise, servem mais como justificativa para subjugar e oprimir.
O Dia Internacional de Mulher traz à luz a coragem de grandes feministas e comunistas que sacrificaram seu trabalho, sua família e suas próprias vidas para lutar pela dignidade de todas as mulheres e pela emancipação humana.
Também deve nos lembrar das dificuldades diárias de nossas companheiras, amigas, mães e irmãs, nos mostrando que ainda há muito a se fazer, e nos fortalecendo para, coletivamente, nos organizarmos e darmos continuidade a essa grande batalha.
Por isso lutamos e convidamos todas as jovens estudantes e trabalhadoras a lutarem conosco:
Pela denúncia e combate diário à violência doméstica! Abaixo o feminicídio!
Pelo fim de toda forma de machismo nas escolas e na universidade!
Pelo fim do abuso e do assédio sexual de mulheres no ambiente educacional e profissional!
Abaixo à cultura do estupro!
Salário e direitos iguais para trabalhos iguais! Melhores condições de trabalho! Chega de triplas jornadas!
Pelo fim das demissões e arrocho dos salários das jovens trabalhadoras!
Pelo aumento da licença paternidade e maternidade!
Por mais creches públicas, gratuitas e de qualidade!
Por politicas de permanência às mães estudantes!
Pela descriminalização do aborto! Pelo fim da violência obstétrica!
Por uma sociedade em que tenhamos direito à vida! Pelo socialismo!
Não queremos rosas, queremos a emancipação!
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