Antonio Cruz/Agência Brasil
Governo é condenado por
fazer propaganda
da reforma da Previdência
A propaganda feita pelo governo Michel Temer para defender a reforma da Previdência é antidemocrática, pois usa dinheiro público para defender o posicionamento do PMDB sobre o tema. Esse foi o entendimento da juíza Marciane Bonzanini, da 1ª Vara Federal de Porto Alegre, ao proibir a gestão pemedebista de fazer qualquer propaganda ou anúncio em quaisquer mídias ou plataformas sobre a mudança nas regras previdenciárias.
Antonio Cruz/Agência Brasil
A decisão destaca que a campanha não tem caráter educativo, mas opinativo, e que isso desvirtua a função pública das propagandas governamentais. “Ao contrário, os seus movimentos e objetivos [da campanha], financiados por recursos públicos, prendem-se à mensagem de que, se a proposta feita pelo Partido político que detém o poder no Executivo federal não for aprovada, os benefícios que compõem o regime previdenciário podem acabar.”
Em caso de descumprimento, a multa estipulada foi de R$ 100 mil. O perigo ou risco de dano visto pela juíza no caso foi o gasto público com as peças veiculadas recentemente.
Para a juíza Marciane, o projeto apresentado ao Legislativo parte do partido que ocupa a presidência, e não do governo propriamente dito, o que foge da determinação imposta pelo 37, parágrafo 1º da Constituição, pois a proposta de reforma da Previdência não está na categoria de "atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos".
O uso de recursos públicos para enaltecer uma proposta destoa do modelo democrático, que tem no Legislativo o local para o debate de ideias que afetam a nação, diz a decisão. “O que parece destoar das regras democráticas é que uma das partes envolvidas no debate político busque reforçar suas posições e enfraquecer argumentos diferentes mediante campanha publicitária utilizando recursos públicos.”
E explica: “A campanha publicitária desenvolvida, utilizando recursos públicos, faz com que o próprio princípio democrático reste abalado, pois traz consigo a mensagem à população de que a proposta de reforma da previdência não pode ser rejeitada e de que nenhuma modificação ou aperfeiçoamento possa ser feito no âmbito do Poder Legislativo, cabendo apenas o chancelamento das medidas apresentadas”.
A Proposta de Emenda à Constituição 287/2016 fixa uma idade mínima de 65 anos para a aposentadoria de homens e mulheres. As novas regras, se aprovadas, valerão para trabalhadores dos setores público e privado. O trabalhador que desejar se aposentar recebendo a aposentadoria integral deverá contribuir por 49 anos.
Atualmente, para se aposentar com o teto, homens precisam ter 65 anos de idade e 35 de contribuição. Já mulheres obtêm o benefício máximo com 60 anos de idade e 30 de contribuição, conforme estabelecido pelo artigo 201, parágrafo 7º, da Constituição.
As novas regras só valeriam para homens e mulheres que, na data de promulgação da nova emenda à Constituição, tiverem, respectivamente, menos de 50 anos e menos 45 anos. Aqueles acima dessas idades serão enquadrados em regras de transição.
Um grupo de 28 deputados federais de oposição chegou a apresentar um Mandado de Segurança no Supremo Tribunal Federal contra a reforma da previdência proposta pelo governo. Eles, que pedem a anulação de todos os atos legislativos sobre a PEC 287/2016, alegaram que o Planalto não demonstrou o déficit do sistema, como é alegado na maioria das propagandas agora suspensas.
Em resposta ao MS, em fevereiro deste ano, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, determinou que os presidentes da República, da Câmara dos Deputados, da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e da Comissão Especial encarregada de analisar a PEC 287/2016 prestem informações sobre a falta de estudo atuarial que comprove o alegado déficit da Previdência.
Ele também exigiu dessas autoridades que explicações sobre o motivo de o teor dessa PEC não ter sido pré-aprovado pela Comissão Nacional de Previdência Social. Os envolvidos têm 10 dias para prestar informações ao STF. A decisão foi tomada no dia 17 daquele mês, mas até agora nenhum relatório foi apresentado, conforme o andamento processual do Mandado de Segurança 34.635.
O coordenador dos cursos de pós-graduação de Direito Previdenciário do Damásio Educacional, Theodoro Vicente Agostinho, elogia a decisão, e prevê que sentenças similares serão proferidas por todo o país.
"Trata-se de medida liminar importantíssima, pois demonstra que não só a sociedade, mas também o judiciário passou a visualizar as inverdades propagadas pelo governo federal e o pior, com propaganda pública paga por todos os contribuintes."
Segundo as associações nacionais dos Defensores Públicos Federais (Anadef) e dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco), a ideia do governo foge dos padrões brasileiros porque os pontos básicos apresentados na PEC 287/2016 usam níveis sociais dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que têm uma realidade bem diferente da brasileira.
A Unafisco exemplifica essas incongruências comparando a expectativa de idade no Brasil, que é de 75 anos, segundo a dados de 2015 da Organização Mundial da Saúde (OMS), com a média dos países da OCDE, que é de 81,2 anos. Partindo dessa premissa, a entidade destaca que se as novas regras, se aprovadas, darão ao aposentado 10 anos para aproveitar a inatividade. “Enquanto nos demais países esse tempo chegaria a 16 anos”, complementa.
Já a Anadef critica o modelo proposto porque são ignoradas as peculiaridades sistêmicas brasileiras, por exemplo, a baixa escolaridade da população e a economia sensível a crises. Também questiona as estatísticas usadas pelo governo para convencer a população de que há um déficit na Previdência.
“O argumento de que a reforma representa a única saída para diminuir o déficit é falho e camufla outras alternativas que precisam ser discutidas, como a recuperação das dívidas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a formalização de trabalhadores sem carteira assinada, o fim da isenção fiscal para diversos setores e a definição de outras fontes para o pagamento da dívida pública”, diz.
(Com o Consultor Jurídico)
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