domingo, 6 de abril de 2014

Revelações de um ex-agente da CIA

                                      
Raul Capote, alvo de recrutamento por parte da CIA
Os planos da CIA na Venezuela e no mundo

Raúl Capote

Raul Capote. Raúl Capote é cubano. Mas não um cubano qualquer. Na sua juventude foi cooptado pela Agência Central de Inteligência (CIA) dos Estados Unidos. Ofereceram-lhe uma quantidade sem limite de dinheiro para conspirar contra Cuba. Mas surgiu algo inesperado para os EUA. Capote, na realidade trabalhava para a segurança nacional cubana. Desde então, actuou como um agente duplo. Conheça a sua história através de uma entrevista exclusiva com Chávez Vive, que concedeu em Havana. 

"EU ERA O LÍDER DE UM MOVIMENTO ESTUDANTIL E A CIA CAPTOU-ME" 

Como foi o seu processo de recrutamento ? 

Foi um processo de muitos anos, de vários de anos de preparação e de cooptação. Eu era o líder de um movimento de juventude em Cuba que, na época, deu origem a uma organização, a Associação Cultural de Hermanos Saiz, uma associação de jovens criadores, jovens pintores, escritores, artistas. Eu trabalhava numa cidade do sul de Cuba, centro-sul de Cuba, Cienfuegos, cujas características, para o inimigo, eram muito interessantes, porque era uma cidade onde na época se estava construindo um grande centro industrial. 

Estava-se construindo uma central eléctrica, a única que se ia instalar em Cuba e havia muitos jovens a trabalhar na obra. Uma cidade com muitos jovens engenheiros formados na União Soviética. Estamos falando do final dos anos oitenta, quando houve todo aquele processo da perestroika. Muitos engenheiros cubanos, que chegaram a Cuba naquela época, graduados lá, eram pessoas que vinham com a ideia de perestroika. Portanto, era um território interessante, onde havia muita gente jovem. E o facto de eu ser um jovem líder de uma organização cultural, que movimentava um sector importante dos engenheiros que estavam interessados nas artes, foi interessante para os americanos que começaram a frequentar as reuniões a que nós assistíamos. Nunca se identificando como inimigos, nem como agentes da CIA. 

Eram vários ou sempre a mesma pessoa? 

Vários. Nunca se apresentavam como agentes da CIA nem como pessoas que viessem para prejudicar. 

- E quem vocês supunham que fossem? 

Apresentavam-se como pessoas que vinham nos ajudar no nosso projecto, e que tinham a possibilidade de financiá-lo. Que tinham a capacidade de o tornar realidade. A proposta, como tal, parecia interessante porque, bem, um projecto no mundo da literatura exige que se conheça um editor, que se tenham relações editoriais. É um mercado muito complexo. E vinham em nome de editoras. O que acontecia é que durante o processo de contacto connosco, parecia bastante claro o que eles realmente queriam. Porque, uma vez que faziam o contacto, uma vez que começavam a frequentar as nossas reuniões, que começavam a prometer os financiamentos, vinham, em seguida, as condições para sermos financiados. 

A CIA TEM UM ORÇAMENTO INFINITO 

Que condições exigiam? 

Diziam-nos: temos a capacidade de colocar o mercado à vossa disposição, de levá-los ao mercado do livro, ou do filme, ou das artes plásticas ou qualquer outra coisa, mas queremos a verdade, porque o que se vende no mercado é a imagem de Cuba. A imagem de Cuba tem que ser uma visão realista, das dificuldades, do que acontece no país. Queriam viciar a realidade de Cuba. O que estavam pedindo é que fizéssemos uma critica da revolução, com base nas linhas de propaganda contra Cuba, que eles manejavam. 

A quanto pode ascender o orçamento dessa gente? 

Eles vinham com uma quantidade infinita de dinheiro, porque a origem do dinheiro, é claro, com o tempo conseguimos saber de onde vinha. Por exemplo, havia a USAID, que era o maior patrocinador, a maior contratadora de todo o orçamento, que era canalizado através de ONGs, que muitas vezes eram inventadas para Cuba. Eram ONGs que não existiam, que foram criadas exclusivamente para esse tipo de trabalho em Cuba e estamos a falar de milhares e milhares de dólares. Eles não trabalhavam com orçamentos pequeninos. Para dar um exemplo, num dado momento, a mim ofereceram-me dez mil dólares, apenas para incluir elementos de propaganda contra Cuba no romance em que eu estava trabalhando. 

De que ano estamos falando? 

Estamos em 1988, 89. 

Quantas pessoas poderiam ter sido contactadas por essa gente ou cooptadas? 

Realmente não tiveram muito sucesso, porque em Cuba havia uma cultura de confronto para tais coisas e as pessoas tinham muito presente que poderia haver algo por trás dessa história de querer-nos ajudar. Não era novo na história do país e, por isso, era muito difícil chegarem a nós. Num dado momento, já em 92, tivemos uma reunião com todos os membros da organização e foi decidido expulsá-los. Não permitir mais a assistência a qualquer das nossas reuniões. 

Essa gente, que já estava chegando com propostas concretas e também condicionando a ajuda financeira que nos estavam dando. O que acontece é que, quando fizemos isso e os rejeitámos, os expulsámos da sede da associação, em seguida, começaram a particularizar. Começam a visitar-me, a mim em particular e a alguns camaradas jovens. Com alguns foram bem sucedidos, ou seja, alguns deles conseguiram, inclusive, levá-los para fora do país. 

Que perfil procuravam eles, mais ou menos, se se pode especificar um perfil? 
Eles queriam, especialmente naquela época, apresentar Cuba como um país que estava no caos. Que o socialismo em Cuba havia falhado em atender às necessidades da população e que Cuba era um país que o socialismo levara à pobreza absoluta e que, como modelo, não agradava. Foi a chave para o que se pretendia, especialmente naquela época. 

NA VENEZUELA TRABALHOU UMA AGENTE EXPERIENTE EM DERRUBAR GOVERNOS 

Quanto tempo esteve como agente da CIA? 

Estivemos nessa história até ao início do ano de 94. Porque em 94 eu venho para Havana, volto para a capital e aqui, vou trabalhar no Sindicato dos Trabalhadores da Cultura, um sindicato que representa os trabalhadores da cultura na capital, o que me tornou ainda mais interessante para eles, porque deixava de ser um líder de uma organização de jovens com 4.000 membros, para passar a liderar uma organização sindical com 40.000 membros. Ou seja, uma união com 40.000 membros, apenas na cidade de Havana. Então isso tornou-se muito mais interessante. Eles continuaram os contactos. Naquele momento apareceu um novo professor universitário que veio com a missão de promover a produção de meu trabalho literário, para se tornar o meu agente, para organizar eventos. 

Pode dar o nome ? 

'. Não, porque usavam pseudónimos. Nunca nomes reais. E esse tipo de trabalho, de me promover como escritor, era no que eles estavam muito interessados, porque queriam tornar-me uma personalidade dentro desse mundo. Promovendo-me agora, e comprometendo-me com eles de maneira não directa. E então, em 2004, chega aqui a Havana uma pessoa que é bem conhecida na Venezuela, Kelly Keiderling . Kelly chega a Havana para trabalhar como Chefe do Gabinete de Imprensa e Cultura. Preparam uma reunião. Preparam um cocktail e neste cocktail eu tenho uma reunião com doze funcionários norte-americanos e europeus.
                                                                     

Não eram só americanos. Todos pessoas que tinham experiência, alguns com experiência mesmo dentro da própria União Soviética, outros tinham participado em acções de formação e preparação de gente na Jugoslávia, nas Revoluções coloridas, e estavam ansiosos por me conhecer. Kelly torna-se uma pessoa muito próxima. Começa a preparar-me. Começa a instruir-me. Eu começo a receber dela uma formação muito sólida: a criação de grupos alternativos, a criação de grupos independentes, a organização e formação de jovens líderes, especialmente em projectos culturais, mas que foram sempre alternativos, que não participaram nos trabalhos das instituições culturais. Isso foi no ano de 2004-2005. 

Kelly sai praticamente de cena em 2005-2006. E começo a trabalhar, ela apresenta-me, coloca-me em contacto directo com funcionários da CIA. Supostamente, eu já estava comprometido com eles, estava pronto para a próxima missão, e colocam-me em contacto com Renee Greenwald, um responsável da CIA que começa a trabalhar comigo directamente, e com um senhor chamado Mark Waterhein que era, naquele tempo, o chefe do Projecto Cuba, da Fundação Pan-americana para o Desenvolvimento. 

CENTENAS DE JOVENS VENEZUELANOS FORAM COOPTADOS PELA CIA 

'. Esse senhor Mark , além de dirigir o Projecto Cuba, tinha uma ligação directa com Cuba, na questão do financiamento de projectos contra a Revolução e também estava envolvido em tarefas contra a Venezuela. Quero dizer, ele era um homem que, como muitos de sua equipe, funcionários do famoso projecto, também trabalhou contra a Venezuela na época. Eles estavam intimamente ligados. Às vezes tinha dificuldade em diferenciar quem trabalhava com Cuba, e quem não, pois muitas vezes alternavam. Por exemplo, havia venezuelanos que vinham trabalhar comigo, que trabalhavam em Washington, que estavam subordinados à Fundação Pan-Americana e à CIA e vinham a Cuba para treinar-me e trazer suprimentos. Daí sai a ideia de criar uma fundação, um projecto, que se chamou Génesis. 

Génesis é, talvez, a matriz, como ideia, de muitas das coisas que aconteceram no mundo de hoje, agora mesmo, porque Génesis é um projecto destinado a estudantes universitários cubanos. Estavam fazendo algo semelhante na Venezuela. Porque, o que acontece? A ideia era transformar as universidades – que sempre tinham sido revolucionárias, que tinham produzido revolucionários, de onde haviam saído muitos dos revolucionários de ambos os países – e convertê-las em fábricas de reaccionários. Então, como fazer isso? Formando líderes. O que começaram a fazer na Venezuela? Enviavam estudantes para a Jugoslávia, financiados pelo Instituto Republicano Internacional (IRI) , que era financiado pela USAID e pelo Instituto Albert Einstein, enviados em grupos de dez, com o seu professor. 

Conhece os nomes dos venezuelanos? 
Não, estamos falando de centenas. Eu falava com o professor e via que um grupo se seguia a outro. Porque eles estavam trabalhando a longo prazo. O plano era o mesmo contra Cuba. Génesis promovia, dentro da universidade, um sistema de bolsas para a formação de líderes para alunos cubanos e professores cubanos. O plano era muito similar. Mesmo em 2003, eles prepararam, aqui em Havana, um curso na Secção de Interesses dos Estados Unidos, chamado "Derrubando um líder, derrubando um ditador", que se baseava na experiência da Otpor para afastar Milosevic do poder. E é a ideia, dentro da universidade cubana, de que estão trabalhando a longo prazo, porque todos esses projectos sempre têm um longo prazo, para ter resultados. Por isso, também começaram cedo na Venezuela. Eu acho, embora não tenha provas, mas acredito, que na Venezuela começou antes do governo Chávez, porque o plano de transformar as universidades latino-americanas, que sempre foram centros de processos revolucionários em universidades reaccionárias, é mais velho que o processo venezuelano para reverter a situação e criar uma nova direita. 

A CIA TRABALHA EM TODA A VENEZUELA 

A CIA só trabalha em Caracas? 

Não, em toda a Venezuela. Naquela época, Génesis tinha em Cuba um plano de bolsas para formar líderes. Propunham aos estudantes uma bolsa de estudos numa universidade dos EUA, ou uma grande universidade europeia para os treinar como líderes, com tudo pago. Pagavam as despesas, pagavam bolsas completas. Estamos falando do ano de 2004-2005. Era muito evidente. Então, esses líderes voltariam para a universidade em algum momento. São estudantes. 

Vão acabar a sua carreira. Esses líderes, quando terminem as suas carreiras, vão ocupar diferentes cargos, diferentes possibilidades, como engenheiros, como graduados em diferentes sectores da sociedade cubana, mas outros vão ficar constantemente preparando líderes dentro da universidade. Uma das missões mais importantes dos líderes da universidade, era ocupar a liderança das principais organizações de jovens. 

No caso de Cuba, nós estamos falando da União de Jovens Comunistas e da Federação Estudantil Universitária, ou seja, não se tratava na época da criação de grupos paralelos, mas tornarem-se líderes de organizações que já existiam em Cuba. Simultaneamente, formar um grupo de líderes nas estratégias de golpe suave. Ou seja, treinar gente para quando o momento fosse oportuno, no momento certo, poder efectuar as famosas revoluções coloridas ou guerras não violentas que, como se sabe muito bem, de não violentas, não têm nada. 

Que perfil procuram num professor, para ser cooptado? 

Professores é muito fácil. Identificar na universidade professores que eram pessoas descontentes com a instituição, pessoas frustradas, por considerarem que a instituição não lhes garantia, ou não reconhecia o seu mérito. Se eram mais velhos, ainda melhor. Não especificavam. Escolhem pessoas mais velhas, para que as selecciones. Se lhe envias um plano de bolsas de estudo, ou ele recebe um convite para participar de um grande congresso internacional de determinada ciência ele vai ficar-te eternamente grato, porque foste o único que descobriu o seu talento, que nunca havia sido reconhecido pela universidade. 

Então, a esse homem que tu, que estás na sua universidade, levaste a estudar fora, a participar de um grande evento e lhe vão publicar a obra e lhe constroem um currículo, quando esse homem voltar para Cuba, regressa com um enorme currículo, porque ele participou de um evento científico de primeira classe, passou em cursos nas principais universidades e o seu currículo quase atingiu o tecto, portanto, a influência que poderia ter na universidade era maior, porque poderia ser reconhecido como uma figura no seu campo, embora na prática o homem fosse um ignorante. 

REALMENTE EU NÃO ERA UM AGENTE DA CIA, ERA UM AGENTE DA SEGURANÇA CUBANA 

E qual a eficiência e eficácia de tais cooptações, dessas missões que eles vinham promover aqui? 
No caso de Cuba, não lhes deu muito resultado. Primeiro, porque havia uma razão importantíssima: quem estava liderando o projecto era eu e eu realmente não era um agente da CIA, era um agente da Segurança Cubana, portanto, todo o projecto passou pelas minhas mãos, e deveria ser o único a executá-lo e o plano passava sempre pelo trabalho que eu podia fazer e o que fizemos foi entorpecê-lo ao máximo ao termos conhecimento do que estava sendo planeado. Mas note-se que eles estavam calculando o fim do seu plano para o momento em que desaparecessem as figuras históricas da Revolução. Eles estavam calculando um período de cinco ou dez anos, para Fidel desaparecer da cena política e desaparecerem de cena Raul e as figuras históricas do país. Era esse o momento que estavam à espera e quando acontecesse eu devia sair da universidade, com todo o apoio da imprensa internacional e com o total apoio de ONGs, USAID e todas essa gente que trabalhava em torno do dinheiro norte-americano da CIA, e emergiria uma organização para se apresentar ao público como uma alternativa ao que estava fazendo a Revolução. Isso é o que estava acontecendo com a Fundação para a Liberdade Génesis. 

Que Fundação é essa? 

A Fundación Génesis para la Libertad devia ter um discurso aparentemente revolucionário, porque a ideia era confundir as pessoas. A ideia era dizer que eram revolucionários, que queriam fazer mudanças no governo, mas quando se ia para a prática, quando se ia para a essência do projecto, quando se perguntava, o que é o projecto? O discurso e o projecto eram exactamente os mesmos que os da direita tradicional, porque as mudanças que promoviam eram as mudanças que a direita, até há algum tempo, estava promovendo no país. 

Na prática, quase se lhes dá uma grande oportunidade, no critério deles, em 2006, quando saiu a notícia na televisão de que Fidel, por causa da doença, deixava as responsabilidades que tinha no governo e eles sempre tinham dito que a Revolução Cubana caia no dia em que Fidel morresse. Porque a Revolução era Fidel e no dia em que Fidel não estivesse cá, se morresse ou deixasse o Governo, no dia seguinte, a Revolução caía, e calcularam que haveria confrontos internos, que ia haver descontentamento com isto e com aquilo. Cálculos, que não sei de onde raio os tiraram, mas em que acreditavam. E nesse momento eles acreditavam que era hora de começar a agir. 

CIA: O MELHOR QUE PODE ACONTECER É QUE MATEM UM OPOSITOR 

Estamos falando de 2006. E qual era o plano? 

Chamam-me automaticamente. Reunimo-nos, o chefe da estação da CIA, aqui em Havana, também apareceram funcionários diplomáticos e um disse-me: "Vamos organizar uma provocação. Vamos organizar um levantamento popular num bairro no centro de Havana, que haja uma pessoa disposta a erguer-se pela democracia, e vamos executar um conjunto de provocações, em lugares diferentes, de modo a que as forças de segurança cubanas sejam forçadas a actuar contra essa gente e então vamos montar uma grande campanha de imprensa". E começa explicando como tudo isso iria funcionar. 

A coisa interessante e que chamava muito a atenção, era como seria possível que um funcionário da Secção de Interesses dos Estados Unidos tivesse o poder de convocar a imprensa e que as pessoas obedecessem com esse servilismo. Foi muito marcante. A ideia era, e eu disse-lhe mesmo, "o que estás dizendo é um disparate. Quero dizer, esse homem que me mencionaste, chamado Alci Ferrer – o jovem que tinham escolhido; um agente jovem, médico, tinha sido escolhido para ser o líder da revolta – eu disse que esse rapaz não moverá ninguém. 

Ninguém se vai levantar no centro de Havana. A data escolhida é, nada mais nada menos, que o aniversário de Fidel e querem esse dia! Olha amigo, se esse homem, nesse dia, aparece fazendo proclamações, ou a querer levantar alguma coisa no centro de Havana, as pessoas vão reagir forte, inclusive, é possível que esse homem seja morto. Porque, como é num bairro de trabalhadores humildes, para fazer essas coisas, os vizinhos..." E ele diz-me, literalmente, "a melhor coisa que nos pode acontecer, a nós, é que o homem seja morto; se matam esse homem, será perfeito", e explica o que vai acontecer. "Só é preciso que ele provoque. Que saiam à rua e haja aí um confronto. Se isso acontecer, a imprensa será encarregada de construir o resto". E disse, "vamos montar uma grande campanha de mediática para mostrar que em Cuba há caos, que em Cuba há ingovernabilidade, que em Cuba Raul é incapaz de manter as rédeas do governo, que está matando civis, que está reprimindo os estudantes na rua, as pessoas na rua e a polícia está cometendo crimes". Qualquer semelhança com a Venezuela, não é por acaso. É assim. 

Então, o que deveria acontecer em tais circunstâncias? 

Uma vez criadas todas as matrizes de opinião e que todos os meios de comunicação tivessem construído essa imagem, que o mundo inteiro tivesse a visão de que em Cuba havia uma grande confusão e estavam matando as pessoas, que estava acabando tudo, então, a minha organização deveria cumprir a tarefa final. 

A CIA TRABALHA DIRECTAMENTE COM AS EMBAIXADAS DOS EUA NA AMÉRICA LATINA 

Qual era a tarefa final? 

Bem, chamar a imprensa internacional e, na minha qualidade de professor universitário, na minha condição de escritor, na qualidade de líder dessa organização, eu vinha publicamente pedir ao Governo dos Estados Unidos a intervenção em Cuba, para garantir as vidas de civis e para trazer paz e tranquilidade ao povo cubano. Falar ao país em nome do povo cubano. Imagine-se! 

Esse plano fracassa. Não deu resultado, mas é quando se vê, mais tarde, como se arma a guerra na Líbia e a maneira como ela é construída. Mais de 80% da informação que vimos, foi construída, foi fabricada. Fazem o mesmo na Síria e o mesmo estão a fazer na Ucrânia. Eu tive a oportunidade de conversar com muitos ucranianos, que estavam na base. Pessoas que são a favor da adesão à Europa. Procurei falar com eles nesses dias. Procurando, perguntando, como são esses processos? E eles ficaram impressionados com as imagens que o mundo transmitiu. O que passou em Miami, e eles mesmos dizem, nós estávamos reclamando aí, mas essas coisas que aparecem na televisão, isso era um grupo, ou seja, havia sectores, havia lugares onde havia grupos de direita, de muito extrema direita, onde havia este tipo de incidentes e onde se incendiava, mas a maioria das manifestações, não tinha tais características. Ou seja, esta é, mais uma vez, a repetição do esquema, usando todos os meios de comunicação. 

Então a relação entre a CIA e as embaixadas dos respectivos países são directas? 
Sim, completamente. Em cada embaixada na América Latina, todas as embaixadas americanas têm agentes da CIA trabalhando dentro delas, usando a fachada de funcionários diplomáticos. 

Pelo que conhece, onde há maior presença da CIA na região? 
Bem, num determinado momento, o Equador foi uma potência forte na matéria onde havia uma forte concentração e, claro, Venezuela, porque em 2012, quando eu assisto à Feira do Livro em Caracas, toda essa gente que tinha trabalhado comigo em Cuba, todos esses agentes da CIA, incluindo Kelly Keiderling, estavam em Caracas nesse momento. E eu participo num programa de televisão, na Venezolana de Televisión, onde discutimos esta questão, tendo muito cuidado, porque estávamos falando de dois países que têm relações. Esse não é o caso de Cuba, ou seja, Cuba não tem relações com os Estados Unidos. Esse é um inimigo declarado. Mas estávamos falando de funcionários que tinham relação diplomática e era muito complicado fazê-lo, sem ter provas concretas que pudesse apresentar. No entanto, a entrevista foi realizada e a denúncia do que estava acontecendo foi feita. Kelly Keiderling é uma especialista neste tipo de guerra. Eu não tenho a menor dúvida. Basta ver o percurso que ela tem. Os países onde esteve e quando esteve nesse tipo de conflito. 

AS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS DE NOTÍCIAS SÃO INFILTRADAS PELA CIA 

Ela tem um percurso por uma série de países onde ocorreram situações semelhantes à que tentou criar na Venezuela. E quando se analisa a Venezuela e o que aconteceu nos dias de hoje e a forma como eles agiram, eu acho que na Venezuela a característica é que eles têm sido extremamente agressivos na manipulação da informação. A tal ponto que há imagens que são óbvias que não são na Venezuela. Eu estava olhando para uma muito famosa, onde aparece um soldado com um jornalista com uma câmara, que são coreanos. Esta é uma imagem da Coreia. São asiáticos. Não se parecem nada com venezuelanos. Até pelos uniformes usados. Eles têm sido muito agressivos com a imagem que é projectada para o mundo sobre o que está acontecendo na Venezuela. Eles controlam a comunicação. A imagem que maioria das pessoas no mundo está vendo é a imagem que eles estão interessados em dar. 

Eles controlam os meios de comunicação. Você conhece algum caso de algum jornalista, conhecido ou desconhecido, que tenha visto nos processos de treino? 
Não. 

CNN , por exemplo? 

Não. Houve um individuo que teve um vinculo comigo num dado momento, que serviu de ligação para conhecer um agente da CIA, que foi Antony Golden, que era da Reuters, mas um membro independente da Reuters. A CNN sempre esteve intimamente ligada a todas estas coisas. A CNN, desde o seu primeiro período de trabalho, especialmente nesta última etapa, e, especialmente, a CNN em espanhol, foi uma ferramenta inestimável para o trabalho dessa gente, mas o problema é que tem que se entender uma coisa, para compreender o que está acontecendo: para montar uma campanha destas, hoje, não existe nenhuma cadeia de televisão que actue por si só. 

Existem conglomerados e grupos de comunicação. Quem os dirige? Quem é o proprietário, por exemplo, da Time Warner e AOL e todos essas grandes empresas de comunicação, TV cabo, filmes de televisão, televisão em geral? Ah! é a Westinghouse, é a General Electric. As mesmas que fabricam um avião de combate. A mesma indústria de armas dos EUA são os mesmos que possuem hoje as cadeias de televisão, das produtoras de cinema, dos jornais, a gente que produz livros. Então, os mesmos tipos que produzem um avião de combate, um doce que vais comer à noite, que te apresenta um artista, são os mesmos que dirigem os jornais em todo o mundo. A quem responde essa gente? 

Quando você vê o que está acontecendo na Venezuela e compara com o que se planeou aqui, a que conclusão pode chegar? 

É uma estratégia nova, que foram desenvolvendo com a experiência que tiveram no mundo, mas eu estou convencido que só lhes deu resultado nos lugares onde as pessoas não apoiavam a revolução. Conseguiram-no com Milosevic, porque Milosevic era um líder na Jugoslávia que tinha muito fraca imagem, pelas coisas que haviam acontecido na Jugoslávia. É o mesmo na Ucrânia, porque Yanukovich era um homem que tinha muito pouco apoio popular e deu resultado em outros lugares, pelo fraco apoio que tinham os governantes. Onde quer que tenha havido um governo legítimo, um governo forte e pessoas para defender a revolução, o plano falhou. 

EUA CONTINUARÃO CONSPIRANDO E APERFEIÇOANDO A SUA CAPACIDADE DE DESTRUIR 

E que fase se segue quando esse plano falhar? 
Vão continuar a fazê-lo, vão continuar a aperfeiçoar. Nós somos o inimigo. Por outras palavras, Venezuela, Cuba, tudo o que está sendo feito na América Latina como alternativa. Nós somos os dissidentes do mundo. Vivemos num mundo onde o capitalismo domina. Onde domina esta nova maneira de ser do capitalismo, que já nem sequer se pode chamar imperialista, é algo novo, algo que vai muito além do que os estudiosos do marxismo escreveram, anos atrás. É algo novo, uma novidade. É um poder praticamente global, das grandes transnacionais, dos megalopólios que foram criados. Então, o inimigo somos nós. Estamos apresentando um projecto alternativo. A solução que o mundo nos propõe não é isso. Sabemos como fazê-lo e Cuba, Venezuela, os países da ALBA, têm demonstrado que se pode fazer. A Revolução Cubana tem 55 anos de existência. Está validada por 55 anos de existência e, com vontade política, tem conseguido coisas que os EUA, mesmo com todo o dinheiro do mundo, não conseguiram fazer. Então, isso é um mau exemplo. 

Eu dizia aos meus alunos "vocês imaginam que os Indignados da Espanha, que milhares e milhões de trabalhadores que não têm trabalho em Espanha, que os gregos, que todas as pessoas em todo o mundo, sabem o que estamos fazendo? Imaginam que as pessoas sabiam quem era Chávez? Ou, quem é Fidel? Ou as coisas que estamos fazendo aqui? E as coisas que estamos fazendo com tão poucos recursos, apenas com a vontade de fazer a revolução e repartir a riqueza? O que aconteceria com o capitalismo? 

Quanto duraria o capitalismo, que tem que gastar milhares de milhões de dólares todos os dias, para construir a sua imagem e enganar as pessoas? E se as pessoas soubessem quem realmente somos? O que é realmente a Revolução Cubana e o que é, realmente, a Revolução Venezuelana?" Falas com um espanhol e perguntas por Chávez e ele dá uma opinião péssima de Chávez, porque é o que construíram na sua mente; e encontras uma pessoa desempregada que diz que Chávez é um tipo terrível, porque a Comunicação Social o tem convencido que assim é, mas se as pessoas soubessem o que é realmente... Então eles não podem permitir que inimigos tão formidáveis, como nós, possam estar ali à porta. 

Do ponto de vista da soberania nacional dos nossos povos, como se pode travar o trabalho da CIA? Já falámos da consciência do povo, que é fundamental neste tipo de acção, mas, em concreto, como se pode prever o trabalho da CIA? O que se pode fazer? Que recomendações faria ? 

Eu acho que há uma coisa que disse Chávez, e Fidel sempre disse, que é a chave para derrotar o Império, que é a unidade. Não é um slogan, é uma realidade. É a única maneira que se tem de derrotar um projecto como este. Projecto surgido a partir dos Serviços Especiais e surgido a partir do capitalismo. Somente se pode conseguir com a unidade do povo. 

Estaríamos falando do cívico-militar ? 

Sim, a unidade em todos os sentidos. A unidade baseada na diversidade, nos povos, mas a unidade como nação, a unidade como projecto. Onde quer que as pessoas estejam divididas, há outra realidade. 

KEIDERLING COMO AGENTE DA CIA CHEGOU BEM LONGE NA VENEZUELA 

Onde temos que nos concentrar? Em que área terá que se concentrar a força para nos defendermos deste tipo de acções, desse tipo de ataque? 

O exército para derrotá-lo é o povo. Eu acho que a experiência cubana o ensinou muito bem. Há experiências no mundo que marcam muito. O que aconteceu no mundo quando o povo não foi o protagonista da defesa da revolução? E quando os povos têm sido o protagonista, o que aconteceu? É o caso de Cuba. Conseguimos derrotar a CIA e o Império milhões de vezes, porque o povo tem sido o protagonista. 

A CIA usa as bases de dados de redes sociais e esse tipo de coisas, para definir os seus planos ? 
Eles são os proprietários. Bem, aí estão as denúncias de Snowden e tudo o que saiu do Wikileaks, que não são segredo para ninguém, porque se suspeitavam, mas agora está demonstrado. Mostra-se que os servidores internet, são deles. Todos os servidores do mundo acabam por morrer nos servidores norte-americanos. São a mãe da Internet e todas as redes e serviços são controlados por eles. Eles têm acesso a toda a informação. E não se perecebe no momento da gravação. O Facebook é uma base de dados extraordinária. As pessoas colocam tudo no Facebook. Quem são os amigos, o que gostam, que filmes vêem, o que bebem. E isso é uma fonte de informações em primeiríssima mão. 

Já esteve em contacto com Kelly Keiderling depois do que aconteceu na Venezuela? 

Não, não tive contacto com ela. Não sei qual foi o seu destino final depois do que aconteceu (Foi expulsa da Venezuela por reunir-se e financiar terroristas). 

Com a experiência que ela tem, até que ponto poderia ter penetrado na Venezuela e nas universidades venezuelanas? 

Eu tenho a certeza de que chegou bem longe. É uma agente muito inteligente, muito bem preparada, muito capaz e muito convencida do que está fazendo. Kelly é uma pessoa convencida do trabalho que está sendo realizado. Convencida da justeza, do seu ponto de vista, do que está fazendo. Porque é uma representante incondicional do capitalismo. Porque provem da elite do capitalismo. É parte da acção que está fazendo. Não há nenhuma contradição. E, com base na experiência do seu trabalho, na sua capacidade, eu tenho a certeza de que chegou muito longe, conseguiu ir muito longe e deu continuidade a um trabalho que não é novo, é um trabalho que vem fazendo desde há muito tempo para reverter o processo nas universidades venezuelanas. Até que ponto o conseguirão, a longo prazo, é o que vai mostrar o processo bolivariano, à medida que as pessoas estejam cientes do que pode acontecer. Se essa direita fascista se tornar incontrolável, vai alcançar o poder novamente. 

TEMOS QUE TREINAR OS NOSSOS LÍDERES 

Qualquer pessoa com contactos, que tenha como chegar ao povo, como um activista de um movimento, pode ser cooptado pela CIA? 

Vão encontrá-lo, vão tentar fazê-lo. Se é jovem e é um líder, vão tentar cooptá-lo para os seus interesses. Temos que formar os nossos líderes. Não podemos deixar isso à espontaneidade, nem podemos deixar isso para o inimigo. Se deixarmos isso ao inimigo é o inimigo que ocupa os espaços. Projecto alternativo que nós deixemos sem vigilância, projecto alternativo que não estejamos conscientes da necessidade de abordá-lo, é um projecto em que o inimigo vai tentar, por todos os meios, que seja feito por ele. Usando a grande quantidade de dinheiro que tem para isso, que não tem limite, em termos de recursos para usar, porque se eles estão jogando o futuro, sobretudo, os jovens são a chave. 

A coisa boa é que os jovens são o presente da América Latina. A revolução latino-americana que está aí, que está em toda parte, é jovem. Se não, bem, nunca iria resultar e se conseguires que esses jovens pensem diferente, se conseguires que estes jovens acreditem que este capitalismo selvagem é a solução para todos os seus problemas, então não há revolução para a América Latina. Tão simples como isso.


O original encontra-se em www.aporrea.org/actualidad/n247624.html . Tradução de Guilherme Coelho. 

Esta entrevista encontra-se em http://resistir.info/ .

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