Igor Waltz e Cláudia Souza
O ex-presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Maurício Azêdo, morto em outubro de 2013, recebeu in memoriam a Medalha Dinarco Reis, concedida pelo Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro (PCB) a grandes nomes que integraram as fileiras do Partido. Azêdo, que foi militante do PCB entre os anos 1960 e 1980, deixou o partido junto com Luiz Carlos Prestes, por divergências em relação ao Comitê Central, mas sempre se manteve próximo ao partido onde iniciou sua carreira na política.
A medalha, entregue em uma cerimônia na sede da ABI no último dia 28 de março, já foi concedida a nomes como David Capistrano, Carlos Marighella e João Massena. De acordo com o secretário-geral do PCB, Ivan Pinheiro, a Casa do Jornalista sempre teve um papel importante na condecoração desses personagens.
“A maioria das cerimônias de entrega da Medalha Dinarco Reis foi na ABI com a presença de Maurício Azêdo, que inclusive presidiu algumas mesas. Foram homenageados ‘camaradas’ que passaram sua vida no PCB e também os que romperam formalmente com o partido, mas que se mantiveram firmes em suas convicções e não traíram a classe operária. Esse foi o caso de Azêdo”, explicou.
De acordo com Pinheiro, a escolha do jornalista foi simbólico, pois apesar de a homenagem ter acontecido in memoriam, ele teve a oportunidade de saber em vida que seria laureado. “Eu estive na comissão que veio à ABI dar a notícia ao Azêdo e pude perceber que foi uma das maiores emoções da sua vida. Ele perdeu a voz, ficou muito emocionado. Ele já não estava no partido há muito tempo, mas sempre o respeitou”, contou o secretário-geral.
A viúva do ex-presidente da ABI, Marilka Azêdo, recebeu a medalha das mãos de Dinarco Reis Filho. Na ocasião ela leu um depoimento escrito por Maurício Azêdo à Comissão de Anistia, em 2004, em que ele relata a tortura à qual ele foi submetido enquanto esteve preso, em 1976, nas dependências do 1º Batalhão da Polícia do Exercito, no bairro da Tijuca, sede do Doi-Codi.
No documento, ele descreve que foi preso a uma cadeira e ligado por fios a um aparelho elétrico. Maurício Azêdo foi submetido a sessões de aplicação de choques elétricos por dez dias, mas se manteve firme e não revelou informações sobre atividades do PCB.
“Ele foi barbaramente torturado, mas não delatou o PCB. Ele permaneceu calado. Nós honraremos sua memória e continuaremos lutando por um Brasil melhor. Ele doou seu tempo de vida para lutar pela liberdade do País. Se vivo, ele estaria aqui muito emocionado”, disse Marilka.
Dinarco Reis filho também relembrou os anos em que conviveu com o jornalista, que segundo ele sempre teve um espírito combativo. “Eu conheci o Maurício Azêdo durante o Secundário e desde então ele já havia feito sua opção ideológica. Militamos lado a lado e ele sempre se entregava com afinco a todas as campanhas às quais se engajava, como a do Petróleo é Nosso”, relembrou.
A viúva de Maurício Azêdo, Marilka Azêdo (centro, com a medalha), e as filhas Ana Luísa (esq.),
Maria Clara (centro) e Maria Ilka (dir.) (Crédito: Alcyr Cavalcanti)
Debate sobre os 50 anos do golpe
Durante a cerimônia, também houve um debate sobre os 50 anos do golpe civil-militar que implantou o regime autoritário no Brasil. Na ocasião, jovens militantes do PCB levantaram cartazes com nomes de militantes do partido mortos pelas forças estatais de repressão.
O historiador e professor da UFRJ José Paulo Netto defendeu o importante papel das comissões da verdade para que o horror do anos de chumbo não seja esquecido. “Até há pouco tempo, falava-se na imprensa de Revolução de 31 de Março de 1964, e não de Golpe do 1º de Abril. Hoje os mesmo jornais que apoiaram o golpe tentam lavar seu passado e fazer uma mea culpa. Por isso eu tenho uma visão otimista do ano de 2014, pois começamos a vencer uma importante batalha na política brasileira, que é a batalha da memória. Quando se restaura a memória, a estrada para o futuro fica mais visível”, afirmou Netto.
O advogado e político Marcelo Cerqueira, por sua vez, lembrou os depoimentos do coronel reformado do Exército Paulo Malhães às Comissões da Verdade Nacional e Estadual do Rio, sobre o destino do corpo do ex-deputado Rubens Paiva e das vítimas da Casa da Morte em Petrópolis, Região Serrana Fluminense. “Malhães ainda serve ao Exército. Com essas declarações, o recado que ele tenta passar é de que não é necessário abrir arquivos do tempo da ditadura. Mas a nós, ele não engana. O Exército terá que prestar contas com o passado”, defendeu.
Para Zuleide Faria de Melo, professora aposentada da UFRJ e uma das lideranças históricas do PCB, a luta contra o autoritarismo e o avanço do capital não cessou com o fim do regime. “Hoje estamos vivendo um período difícil da Humanidade, quando o grande capital financeiro está devorando a dignidade dos povos. O que enfrentamos hoje é mais do que uma ditadura. Eu creio que todos temos uma tarefa maior de denunciar e combater esse inimigo invisível”, acredita Zuleide. (Com a ABI)
Nenhum comentário:
Postar um comentário