segunda-feira, 30 de novembro de 2015

União da Juventude Comunista de São Paulo aplaude ocupações de escolas




Brasil - UJC - A União da Juventude Comunista de São Paulo saúda a rebeldia da juventude paulista e as mais de 200 ocupações de escolas públicas que já foram realizadas pelos estudantes em todo o Estado de contra a reorganização escolar promovida pelo Governo do PSDB.

Mais de 200 escolas estão ocupadas pelo alunado no estado de São Paulo, e o número cresce a cada dia. Foto: Diário Liberdade

As ocupações realizadas por jovens secundaristas – cuja grande maioria é adolescente – com o apoio de grande parte dos pais, professores e artistas, demostram também que a juventude continua mantendo sua tradição de combatividade e rebeldia contra o autoritarismo e o arbítrio.

As ocupações também vêm demostrando que as escolas geridas pelos alunos estão funcionando melhor do que quando administradas pelo Governo. Prova disso é o conjunto de atividades culturais e recreativas que vêm sendo realizadas nas ocupações, fruto da solidariedade da população com os estudantes.

Todos os dias estão sendo realizados saraus, shows musicais, peças de teatro, cineclubes, debates, aulas solidárias e um conjunto de atividades culturais nas escolas ocupadas. Eventos pouco vistos na educação pública do Estado. Na verdade, as ocupações têm se transformado num embrião de poder popular na educação, onde se está construindo uma escola diferente do modelo tradicionais.

A União da Juventude Comunista, através de seus núcleos secundaristas do Estado, e a Unidade Classista, por meio dos professores da rede pública estadual, estão presentes nesta luta, contribuindo de todas as formas possíveis na infraestrutura, no apoio militante e na mobilização de professores, de pais e mães de alunos e da sociedade em geral, para que as ocupações sejam ampliadas até que que o governo revogue esta medida arbitrária.

Ousar Lutar, Ousar vencer

Ampliar as ocupações e construir a unidade entre alunos, pais, mães e professores até a vitória.

União da Juventude Comunista de São Paulo

Comunistas argentinos rechaçam provocações de Macri contra Venezuela

                                

Comunistas argentinos, em 2010, no ato do Dia Nacional da Memória por Verdade e Justiça. wikimedia/Creative Commons Attribution 3.0.

Argentina - Diário Liberdade - Comunistas também fazem chamado pela defesa da integração latino-americano.

Em comunicado divulgado em seu site oficial, o Partido Comunista da Argentina (PCA) "rechaça as expressões de Mauricio Macri acerca da aplicação da cláusula democrática do Mercosul contra a nação irmã, República Bolivariana da Venezuela".

Para os comunistas, ao propor a tal cláusula, Macri - o presidente eleito na última eleição argentina - manifesta o caráter de dependência aos EUA de sua futura gestão.

Além de elogiar a democracia venezuelana, o PCA chama pela integração latino-americana e pela defesa da soberania venezuelana.

A nota:

"Pela integração latino-americana

O Partido Comunista da Argentina rechaça as expressões de Mauricio Macri acerca da aplicação da cláusula democrática do Mercosul contra a nação irmã, República Bolivariana da Venezuela.

Ao propor a tal cláusula, praticamente como primeira medida de governo, o presidente eleito manifesta o caráter de dependência dos EUA que terá sua política exterior, uma vez que a campanha de desestabilização contra o legítimo governo de Nicolás Maduro é dirigida desde Washington.

A cláusula democrática do Mercosul (Ushuaia 2) prescreve claramente que sua aplicação corresponde a casos de golpes de Estado ou de ruptura da ordem democrática, contra um governo constitucional. E, na Venezuela, os únicos golpistas são os amigos de Macri, que já fracassaram em várias tentativas nesse país.

Pelo contrário, a Venezuela ostenta o recorde de maior quantidade de eleições democráticas realizadas nos últimos tempos e já realiza os comícios parlamentares para próximo 6 de dezembro.

Evidentemente, a proposta macrista tende a intervir nesse processo eleitoral, que constitui uma ingerência ilegal nos assuntos internos de outro Estado. Faz também a apologia aos crimes de violência e homicídios pelos quais os tribunais venezuelanos condenaram cidadãos de seu país.

Porém, principalmente aponta contra o extraordinário processo de unidade e integração latino-americana e caribenha a que assistimos, com a criação da Unasur e da Celac, e com a ampliação do Mercosul, processo do qual a pátria de Bolívar tem sido protagonista.

Na verdade, o que se pretende é isolar a Venezuela por sua estratégia apontada ao Socialismo do Século XXI, pela recuperação da renda advinda do petróleo com o fim de colocá-la a serviço do povo trabalhador e por seu papel, tanto na nossa região, quanto entre os países exploradores de petróleo.

A vocação pró ianque do PRO e 'Cambiemos´ é expressada claramente em sua intenção de aproximar-se da Aliança do Pacífico, integrada pelos países que têm tratados de "livre comércio" com os EUA e a denominada "guerra contra o narcotráfico", que apenas deixou em seu rastro a repressão, a morte e mais delitos e insegurança, onde quer que tenha sido implantada, como no México e na Colômbia.

Faz 10 anos que derrotamos a ALCA, e agora pretendem retomar seu conteúdo pró imperialista e antipopular.

Apelamos a todas as forças populares e democráticas para que defendam a soberania nacional e a unidade latino-americana. E que combatam todas as tentativas de somar a Argentina ao coro de acólitos de Washington, em sua pretensão de derrotar a Revolução da Venezuela, iniciada pelo Comandante Hugo Chávez Frías.

Buenos Aires, 23 de novembro de 2015."

Tradução: blog da Resistência. (Com o Diário Liberdade)

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Curso de Formação Marxista


TV Brasil entrevistará Anita Prestes

                                                                                 
O programa Espaço Público, da TV Brasil, de terça-feira, 01/12, recebe a historiadora Anita Leocadia Prestes, autora da biografia política Luiz Carlos Prestes: um comunista brasileiro para uma conversa ao vivo, às 23 horas. 

A historiadora Anita Prestes é filha de Olga Benario Prestes e Luiz Carlos Prestes

A entrevistada do Espaço Público desta semana tem muito a contar da própria vida, sobre o pai, uma das mais importantes personalidades políticas brasileiras do século 20, e o país.

A historiadora Anita Leocádia Benário Prestes nasceu numa prisão nazista, em 27 de novembro de 1936, depois de a mãe, uma judia grávida de sete meses, ser enviada à Alemanha e entregue ao regime de Hitler pelo então ditador brasileiro Getúlio Vargas.

Olga Benario terminou morta em uma câmara de gás, em 1942. Devolvida à avó paterna com pouco mais de um ano, só aos nove Anita conheceu o pai, o líder comunista Luiz Carlos Prestes, que era mantido preso no Brasil.

Hoje, aos 79 anos, Anita Leocadia é autora de mais de uma dezena de livros e professora doutora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a UFRJ. No programa, ela vai falar daquela que talvez seja sua obra mais importante, além de a mais recente: "Luiz Carlos Prestes - Um comunista brasileiro", trabalho lançado há menos de dois meses, ao qual dedicou-se por mais de três décadas. 

Embora o pai seja o personagem central, o pano de fundo dessa história é o Brasil dos anos 1920 até 1990. E a historiadora - ainda comunista convicta, mesmo que sem filiação partidária – tem opiniões críticas e polêmicas sobre a realidade atual, nas quais não poupa a esquerda brasileira.

O Espaço Público é apresentado pelo jornalista Paulo Moreira Leite sempre às terças-feiras, às 23h.

Leia e divulgue O Poder Popular


quarta-feira, 25 de novembro de 2015

I Encontro Nacional do Coletivo Feminista Ana Montenegro

Marcada para viver. Entrevista com a ex-líder camponesa Elizabeth Teixeira

                                                                                                 
   
"Todos os dias, quando João Pedro saia, ele me abraçava e dizia: 'Minha filha, vão tirar minha vida' - e nossos filhinhos todos em volta. 'Você continua a minha luta?'. Eu nunca tive resposta para isso, ficava calada."

Da Revista do Nordeste 

Encontrar alguém com 90 anos de idade normalmente é uma experiência enriquecedora. Mas quando se trata de Elizabeth Teixeira, a história de vida quase centenária ganha contornos cinematográficos, literalmente. O filme “Cabra Marcado para Morrer”, de 1984, retrata a trajetória dela e de seu marido, o líder camponês João Pedro Teixeira.

Elizabeth liderou um movimento popular quando poucas mulheres tinham postura ativa na sociedade, foi perseguida e ameaçada durante a Ditadura Militar, viu seu marido e filhos serem assassinados como consequência da luta dos camponeses e a filha mais velha se suicidar pela tristeza de ter o pai morto e a mãe presa.


Como a senhora recebeu a comenda Margarida Maria Alves, na homenagem prestada pela Câmara Municipal de João Pessoa?

Conheço a história da luta da companheira Margarida Alves, que também foi assassinada. É triste saber que não só meu marido foi assassinado e me deixou abandonada com 11 filhinhos. Eu me sinto muito feliz com a minha história e a de João Pedro, foi ele quem deu toda essa ideia e entendimento.


Não deve ter sido fácil para uma viúva, com 11 filhos, assumir a liderança de um movimento popular.

No tempo de João Pedro só companheiros frequentavam as reuniões. Mas a partir da minha pessoa as mulheres começaram a estar presentes lá. Era movimento, meu filho. As mulheres também, companheiras do campo, se colocando a disposição da nossa luta. Nunca sofri preconceito nenhum por ser mulher. Pelo contrário, surgiram outras mulheres para ajudar e lutar também.

Eu dei continuidade a luta de meu marido, João Pedro, mas eu pensava que iam tirar a minha vida também. Era tanto tiro quando iam me prender, tanto tiro em volta da casa. Me colocavam no carro, colocavam arma em mim. 

Chegou um momento em que oito trabalhadores do campo foram colocados para fora, eles vieram chorando na minha casa, pedindo para eu chegar até lá e falar com os donos dos engenhos. Eu cheguei lá e falei com eles, disse que um dos companheiros não poderia ser demitido, ele tinha oito filhinhos morrendo de fome, uma situação difícil, sem ele ter produto da terra para plantar e alimentar os filhinhos... Disse que muito difícil para ele sair; o dono do engenho calado estava e calado ficou. 

Também fui a outro engenho e a mesma coisa: falei com o proprietário que calado estava e calado ficou. Eles não deram uma só resposta sobre a minha palavra. Eu voltei para casa e quando eu chego em casa havia um carro cheio de policiais para me prender. Foi muito tiro ao redor da minha casa. A minha filha mais velha, Marluce, que já estava com 16 anos, disse: “Minha mãe, vão tirar sua vida, assim como tiraram a do meu pai. A senhora não vai ter o direito de voltar. Mainha, eu não lhe quero ver morta”. Eu disse a ele que iria presa, mas voltaria.

E de fato a senhora voltou.

Entrei no carro e fui presa para João Pessoa. Me levaram para o delegado, eu expliquei minha situação e ele disse que eu poderia voltar. O carro da liga camponesa já estava lá, eu não tive que voltar em carro de polícia. Quando eu cheguei ela tava morrendo na cama. 

Em cima da mesa tinha veneno e outras coisas que ela ingeriu. Aí o companheiro da liga camponesa que me acompanhou levou a gente para João Pessoa, para o médico. Quando chegamos em João Pessoa e fomos tirar do carro ela tava morta. Chamei o médico já na porta, ele foi examinou ela e confirmou a morte. Minha filha, Marluce Teixeira, suicidou-se. Voltei com o corpo para Sapé, cuidei do enterro dela e dei continuidade a luta de João Pedro.

Foram muitas perdas ao longo dos anos de luta. Quando assumiu a luta de seu marido, a senhora tinha noção do que enfrentaria?

Outros dois filhos meus foram assassinados. Zé Hildes e João Pedro Filho, que ainda eram crianças. Eles diziam que quando ficassem maiores iriam fundar um sindicato rural e dar continuidade a luta do pai. Na 4ª série eles disseram isso na escola e foram assassinados. Foi muito difícil para minha pessoa. Hoje eu penso como ainda estou viva. Já completei 92 anos. Como é que eu estou viva, com o que eu passei na vida depois do assassinato de João Pedro. Foram muitas prisões a minha pessoa, muita coisa. 

Todos os dias, quando João Pedro saia, ele me abraçava e dizia: “Minha filha, vão tirar minha vida” - e nossos filhinhos todos em volta. “Você continua a minha luta?”. Eu nunca tive resposta para isso, ficava calada. Eu não sabia que João Pedro tinha aquele espírito de luta todo. Ele gostava de ler o jornal... Um dia João Pedro disse que ia no engenho conversar com os trabalhadores... Ia de engenho em engenho tomando conhecimento da sobrevivência. Disseram que iam tirar a vida dele. Dia 2 de abril de 62, dois policiais em Café do Vento tiraram a vida dele. Deram tiros e acabaram com João Pedro. Eu fiquei só.

A senhora precisou ir embora do estado durante o período da Ditadura Militar. Como foi mais esse difícil capítulo da sua história?

Durante a Ditadura eu estava presa. Mas não pelos policiais, foi pelo exército. Passei oito meses de prisão no exército, mas eles me tratavam muito bem. Nenhum menino do exército me tratava mal. Me abraçavam, procuravam saber se eu estava me alimentando, se estava tomando meu cafezinho. O exército me tratou bem. Depois dos oito meses eles me liberaram, mas disseram que eu não poderia voltar para Sapé, porque a ditadura continuava e eu seria presa pelos policiais. 

Me lembrei de um amigo das lutas de João Pedro, do Rio Grande do Norte, que tinha boas condições. O major ligou para ele e pediu para que viesse até aqui. O major falou para ele me levar escondida para uma casinha desocupada que ele tinha em São Rafael, no RN. Deixei de ser Elizabeth, meu nome ficou como Marta Maria da Costa.

Fui para o Rio Grande do Norte, passei muito tempo lá para não ser mais presa, para ter mais tanta prisão a minha pessoa. Passei todos os anos restantes de ditadura lá. Não tinha conhecimento nenhum lá. Nem meus filhos sabiam onde eu estava. Lá eu era alfabetizadora. Tinham muitas crianças nas calçadas das ruas que não estudavam. Aí eu conversei com os pais, para saber se eles davam cadeira e mesa para começar uma alfabetização. Eles gostaram e eu fiquei todos os anos como alfabetizadora, recebendo uma salariozinho para me sustentar. Eu ensinava de manhã e de tarde. 


Depois de muitos anos, dois meninos que foram alfabetizados por mim se formaram em Direito. Mandaram até carta para mim. Quando acabou a ditadura entrei em contato com Eduardo Coutinho, que já tinha feito o filme “Cabra marcado para morrer”. Ele já ia muito na casa da minha filha, que era casada e já morava em João Pessoa. Ele me trouxe para João Pessoa, comprou essa casa onde eu moro e me deu de presente. Fui resgatada por ele. Voltei a ser Elizabeth Teixeira, uma mulher muito sofredora, que passou muitas noites sem dormir.


Eu penso assim: “É Deus, eu hoje ainda estar viva”. Passar as noites que eu passei sem dormir, pensando nos filhinhos que ficaram todos abandonados, as lágrimas que caíram pelos filhos que soube que foram assassinados. Meu Deus do céu, como é que eu ainda estou viva? É Deus ou não é? Sou uma velhinha muito sofrida nesse nosso país.

Como a senhora se tornou amiga de Fidel Castro?

Ele soube lá em Cuba por conta da luta de João Pedro porque foi uma luta reconhecida e quando João Pedro morreu eu assumi o lugar dele, fiquei conhecida também: a esposa de João Pedro Teixeira. Fiquei conhecida no Brasil todo. Fidel ficou sempre tendo contato comigo, procurando falar comigo. Me fez o convite para que eu fosse morar lá, ele me chamou para me ver e eu fui. Me apresentou a casa com todos os moveis pra eu morar lá. Só que eu só abraçava ele e dizia: "Fidel, meu filho, eu tenho um compromisso com a luta de João Pedro em nosso país”.

Ele convidou meus meninos; quando eu fiquei no exílio, ele convidou os meninos pra estudar lá. Abraão já ia se formar em jornalismo e disse que não ia. A menina mais velha disse que não ia também. Isaque foi, se formou em medicina e voltou e trabalhar aqui. Paulo já tinha se casado e morava em Recife. E Carlos foi morar no RN.

As ligas cumpriram o seu papel? Como a senhora vê a Reforma Agrária no atual contexto do Brasil?

Não existe a luta mais não. Eu vejo que a luta de João Pedro foi muito difícil e muito pesada. Ele dizia que iam tirar a vida dele, mas a reforma agrária ia ser implantada e, quando mataram ele, naquele ano ele dizia pra eu ficar tranquila que a reforma agrária ia ser implantada. Que os trabalhadores de terra iam ter condições de sobrevivência da terra. 

Quantos anos do assassinato de João Pedro? E Reforma Agrária nada. Não vai ser implantada em nosso país e os sem terra não tem direito a terra para sobrevivência. Eles vivem do produto da terra e ficou muito difícil para o homem do campo sobreviver. (Com a página do MST)

terça-feira, 24 de novembro de 2015

As capitais do capitalismo

                                                                               
                                               
  Entrevista com David Harvey

Daniel Santini (*)

Os fenómenos da urbanização e da concentração urbana reflectem aspectos essenciais do desenvolvimento do capitalismo ao longo da sua história, mas a reflexão marxista não tem acompanhado esses fenómenos com o aprofundamento verificado noutras áreas. Esta estimulante e polémica entrevista de David Harvey, geógrafo que se reclama do marxismo, tem assim um interesse acrescido.


- A urbanização na China é um projeto maciço, com alta densidade populacional em conjuntos habitacionais de 50 andares, tudo conectado por trens rápidos. São centros construídos com matérias-primas importadas em larga escala, como ferro, que sai da Amazônia, que não serão alimentados por painéis solares ou usinas de vento, e, sim, por energia nuclear. Dentro de uma perspectiva ecológica, quanto tempo este modelo pode durar?

Não tenho a menor ideia. O que temos, neste momento, são algumas dessas formas absurdas de urbanização, como em Dubai [Emirados Árabes]. Existem coisas muito doidas acontecendo. Mas aí é preciso olhar para a macroeconomia. A única coisa que manteve o capitalismo vivo, no mundo, nos últimos anos, é a urbanização chinesa.

Se esse projeto maciço não tivesse acontecido e, se ele não tivesse sido acelerado, como foi depois de 2007/2008, grande parte da América Latina teria entrado em crise, naquele período. A China está imensamente endividada, não em dólares, mas consigo mesma. Os chineses morrem de medo do desemprego, e este foi também um projeto de absorção de força de trabalho.

A dinâmica de crescimento do capitalismo junto com a ideia de que é possível crescer assim eternamente são uma contradição, que vai chegar ao fim. E haverá consequências ambientais. Vi estatísticas que indicam que a China consumiu mais cimento, nos últimos cinco anos, do que os Estados Unidos no último século.

E cobrir um país com cimento não parece uma ideia muito ecológica… Mas é pertinente a questão sobre como tais cidades serão abastecidas em termos de energia; é um ponto crítico. Cidades são extremamente vulneráveis em relação a fontes de energia.

O capitalismo depende cada vez mais da urbanização?

Sim, e este é um ponto importante, porque as atividades mais lucrativas e produtivas estão cada vez mais ligadas à urbanização. Parte desse sistema é pura ficção porque é baseado no aumento de aluguéis, uma variante que é cada vez mais uma fonte de renda importante para a classe capitalista como um todo.

Não dá para continuar por esse caminho. Acompanhei o desenvolvimento urbano no Brasil, nos últimos 30, 40 anos. Estive em São Paulo, nos anos 1970, e também em lugares como Recife e Salvador. Eles foram totalmente tomados por arranha-céus e shoppings centers.

Todos, no Brasil, gostam de pensar que o país é especial – mas o que o Brasil tem de especial? É só capitalismo. E, generalizando, é sempre o mesmo. É isso de carros, avenidas, shoppings e condomínios. 

Se considerarmos que todas essas mudanças aconteceram nos últimos 30, 40 anos, e pensarmos no que vai acontecer nos próximos 30, 40 anos, dá para pensar no mundo em que vamos viver. É inimaginável. O que estamos vendo na China, hoje, é o futuro.

Neste contexto, o que pensa do conceito de desurbanização? Nós temos, como algo naturalizado, a transição do rural para o urbano, mas, talvez, em algum ponto, tenhamos de discutir como desurbanizar, de maneira planejada e democrática, não?

Bem, eu sou contra a desurbanização. Acredito que seria igualmente desastroso, em termos ecológicos, espalhar todos pelos campos. Especialmente, considerando as divisões de trabalho e os fluxos de commodities, acredito que formas eficientes de urbanização são cruciais.

Estamos falando de uma população que, em breve, será de 8 bilhões. Como espalhar toda essa gente em espaços pequenos e autônomos? E em que nível eles poderiam ser autônomos? Porque uma das coisas que o capital fez é, ao definir conexões e divisões de trabalho, estabelecer uma rede, em que comunidades locais não são mais tão vulneráveis a catástrofes. Bastava uma praga de gafanhotos para deixar uma comunidade morrer de fome.

No passado, antes das ferrovias, isso era bastante comum. E as ferrovias eliminaram, de maneira eficiente, a fome local. Se pensarmos em um mundo de comunidades autônomas autossustentáveis, cada uma delas vai ser vulnerável, de alguma forma. Então, um mundo descentralizado não parece, para mim, o mais razoável a seguir.

Isto posto, também não sou a favor de uma hiperurbanização, como a chinesa. A questão urbana é crucial, mas é por meio de formas mais radicais de urbanização que acredito que vamos resolver nossos problemas. Incluindo, é claro, muita ênfase em sistemas de agricultura urbana e similares. Hortas comunitárias e ideias do gênero podem funcionar bem.

Pequenas comunidades não seriam menos frágeis do que uma cidade como São Paulo, que depende de um só centro de abastecimento? Ficou tão naturalizada nos círculos de esquerda a ideia de urbanização que, mesmo em discussões sobre bem viver, um conceito indígena andino, falar em sair da cidade não é uma opção considerada…

O bem viver tem origens bastante rurais e não dá para todos viverem como populações indígenas da Amazônia.

Esta é a origem, a tradição, mas há muitos pensadores que formulam o conceito, de maneira mais aberta. Muitas vezes, as pessoas resumem tudo como “pachamamistas”, que querem voltar atrás; é uma crítica frequente, da esquerda e da direita.

Não concordo com essa crítica, mas tenho meu ponto de vista, sobre o qual escrevi em Spaces of hope. Entre outras coisas, entendo que certas partes do mundo poderiam ser deixadas para produção altamente industrializada de grãos e carne.

Parece bastante ineficiente cultivar trigo no próprio quintal. O que dá para cultivar são verduras, folhas, tomates. Às vezes, uma lesma pode fazer um estrago. Na Argentina, onde vivi por um ano, eu tinha um belo cultivo, mas acordei um dia e tudo tinha sumido. Encontrei uma trilha de formigas e fiquei muito antiecológico. Procurei o veneno mais poderoso e destruí o formigueiro. Desisti dessa coisa orgânica, sem sentido [risos]…

É claro que, se olharmos alguns aspectos da produção industrial, como a de carne, é nojento. Existem muitas evidências de que a maneira como a produção de frango é estruturada, hoje, favorece doenças. Estamos criando novos ambientes para novos patógenos. Então, a questão é: qual tipo de agricultura deve permanecer industrializado?

Acredito que a maioria da produção de grãos deve se manter industrializada porque é a maneira mais eficiente e efetiva. Não estou dizendo que a agricultura urbana vai resolver, mas pode ajudar. Esta ideia está relacionada com a noção de bem viver.

Pensa que o conceito pode ser útil na busca por soluções?

Acredito que, com frequência, nos encontramos trabalhando com o que eu chamo de termos vazios de significado – o bem viver, por exemplo. Todo mundo quer uma boa vida. Os bilionários querem uma boa vida, os indígenas querem uma boa vida.

A grande questão não é nem o bem viver em si e, sim, como as pessoas preenchem esse conceito com um significado particular. E eu acredito que o que os indígenas querem dizer com esse termo não funciona bem, quando traduzido como bem viver. Ninguém vai dizer que é contra o bem viver. É um desses conceitos em relação aos quais todos vão ser a favor.

Sustentabilidade é outro exemplo. Ou direito à cidade. Todo mundo quer ter direito à cidade. A questão é: direitos de quem? Pelo que as pessoas se esforçam, qual é o sentido da luta? Devemos parar de falar no bem viver e começar a falar sobre pautas específicas – habitação, por exemplo. O quanto antes começarmos a falar sobre programas reais e objetivos, melhor.

Sobre habitação, no Brasil, vemos casas construídas pelo programa Minha Casa, Minha Vida que parecem caixinhas enfileiradas, todas iguais. É possível fazer algo diferente, quando se pensa em programas em larga escala?

No geral, existe essa percepção das pessoas de que projetos habitacionais são, necessariamente, feios e ruins. Mas, se olharmos os construídos em Londres, em 1960, há alguns muito bonitos, que têm uma qualidade fantástica. Tanto que, depois que eles foram privatizados, boa parte da burguesia se apropriou deles. Então, não há nenhum motivo para que projetos sociais de habitação sejam parecidos com o que você descreveu.

Mas é possível construir projetos assim, considerando os custos e os aspectos econômicos?

Primeiro, a questão de custo vai depender do valor dos terrenos, e acredito que este é um ponto em que o Estado tem um papel importante, em coibir a especulação, como parte de uma política de garantir acesso à moradia. Depois, é preciso redirecionar recursos públicos.

Por exemplo, se você taxar cada propriedade da burguesia e cobrar impostos de habitação da classe média e da classe alta, redirecionando o que for obtido para a habitação social, vai haver muito mais recursos para projetos habitacionais para as massas.

O problema é que, muitas vezes, o sistema funciona ao contrário. Em Nova York, arranha-céus dificilmente pagam impostos, por conta de subsídios que receberam nos anos 1970. Bilionários vivem em condomínios livres de impostos. Bill de Blasio [prefeito de Nova York, do Partido Democrata] está tentando mudar isso.

De Blasio é um progressista, que assumiu a Prefeitura de Nova York depois de [Michael] Bloomberg e outros de direita. Quais possibilidades ele tem?

Muito poucas, porque questões fiscais ficam majoritariamente com o Governo do Estado. Andrew Cuomo é o governador do Partido Democrata, mas pretende chegar à Presidência e, por isso, não vai incomodar Wall Street. Assim, acaba se opondo a tudo que De Blasio propõe e este fica com pouco espaço de manobra. Logo depois da eleição, De Blasio passou a sofrer ataques da imprensa e sua popularidade despencou. Os movimentos sociais não estão mais nas ruas ameaçando Wall Street ou algo assim, então, ele não tem apoio.

E as pessoas que foram para as ruas, em 2011, como o Occupy Wall Street?

Elas se perderam, em muitos aspectos, acredito. Os movimentos sociais, que estavam diretamente ligados e ao redor do Occupy, eram muito fragmentados e diferentes. Quando o Zucotti Park foi fechado, tudo ficou descentralizado e com menos visibilidade. A única aparição foi quando veio o Furacão Sandy e o Movimento Occupy foi o primeiro a organizar ajuda, de maneira supereficiente, com sua autonomia de sair e auxiliar diretamente as pessoas.

Mas a política disso é terrível, em um sentido de que eles ajudaram as pessoas a voltarem e reconstruírem suas casas, dentro de regras de propriedade privada e todo o resto. De repente, perceberam que estavam reconstruindo a forma de vida individualista e capitalista – que haviam se tornado um grupo supereficiente de suporte às vítimas, mais do que uma força política transformadora.

E movimentos como os Indignados na Espanha, as forças que surgem em Barcelona, na Grécia, na Turquia, no Sul da Europa? Estamos vivendo um momento de esperança, em que dá para imaginar mudanças?

Sim, eu acredito que é um momento interessante, em muitos sentidos. O Occupy é um movimento que acabou influenciado por sentimentos anarquistas e autonomistas, e isto resultou na falta de interesse em poder político stricto sensu. Era como se o movimento considerasse que o aparelho estatal não teria relevância.

Havia essa insistência de que tudo fosse horizontal e não hierárquico. Estive em discussões com eles por algum tempo e escrevi um artigo em que, de maneira amistosa, ataquei os anarquistas. Brinquei com o “Escuta, Marxista!”, do [anarquista estadunidense] Murray Bookchin, e publiquei o “Escuta, Anarquista!”, tentando apontar que muitas coisas boas vieram do anarquismo, mas também falhas cruciais.

E temos de estar preparados para ir além do que os anarquistas fazem, e fazer parte dos governos. Isto é o que parece estar ocorrendo, e aí as eleições, na Espanha, são muito importantes. Vemos um nível de ativismo que, obviamente, é crítico ao Estado, mas não ignora o poder do Estado.

Então, a questão dos movimentos alternativos e seu papel político é a agenda, hoje. Vemos isso sendo expresso na maneira como as coisas aconteceram, em Barcelona ou Madri. É um momento emocionante e de esperança. Mesmo que ainda haja uma ideia forte, em muitas organizações de esquerda, de não querer nenhuma relação com o aparelho estatal. E há todos esses estudantes que me classificam como stalinista porque defendo que não deveríamos descartar negociar com o Estado.

(*) Daniel Santini é coordenador de projetos na Fundação Rosa Luxemburgo. Texto organizado com base em transcrição feita por Sarah Lempp. A entrevista coletiva (versão em inglês) foi realizada em 12 de junho de 2015 no auditório da organização, em São Paulo. (Com odiario.info)

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Morre aos 90 anos líder guerrilheira Zilda Xavier Pereira



Zilda Xavier e Carlos Marighella: a primeira-dama da guerrilha e o revolucionário

Em janeiro de 1970, prenderam Zilda no Rio e a torturaram à exaustão, mas nenhuma informação sobre a guerrilha foi obtida. A companheira de Marighella disse mais tarde que ele não era homem para ser traído


São Paulo – Morreu ontem (22), em Brasília, Zilda Xavier Pereira, militante contra a ditadura civil-militar que integrou o comando da Ação Libertadora Nacional, maior organização guerrilheira do país. Seus filhos Iuri e Alex Xavier Pereira, também guerrilheiros, foram assassinados por agentes da ditadura. 

Zilda, que completava 90 anos neste domingo, foi companheira do revolucionário Carlos Marighella, assassinado por policiais comandados por Sérgio Paranhos Fleury, aos 56 anos, em 1969, na capital paulista.

Zilda Paula Xavier Pereira nasceu no Recife em 22 de novembro de 1925. Em maio de 1945, recém-chegada ao Rio, entrou para o Partido Comunista Brasileiro (PCB). O partido foi declarado ilegal em maio de 1947, e ela adotou o nome de guerra Zélia, reverência à sua camarada Zélia Magalhães, assassinada a bala por policiais em maio do ano anterior, quando participava de um protesto no largo da Carioca.

Zilda foi uma das dirigentes da Liga Feminina da Guanabara até a associação ser banida pelo golpe de Estado de 1964. Na casa dela, Marighella reuniu-se com sargentos antes do encontro deles com o presidente João Goulart, em 30 de março daquele ano.

Em 1967, Zilda, o ex-marido e os filhos acompanharam Marighella na ruptura com o PCB. A família foi pioneira da Ação Libertadora Nacional. No Rio, a ALN se estruturou em torno dos Xavier Pereira. Eram guerrilheiros, empenhados nas ações armadas e na logística da ALN, Zilda, seu ex-marido, João Batista, e os filhos Iuri, Alex e Iara. Todos Xavier Pereira. Na ALN, a identidade de Zilda era Carmem.

Segundo narra  o blogueiro Mário Magalhães, depois de abril de 1964, é possível que ninguém tenha passado tanto tempo com Marighella quanto Zilda. O último “aparelho'' dos dois, no bairro carioca de Todos os Santos, jamais foi descoberto pelos agentes da ditadura. Zilda zelava pela segurança de Marighella na clandestinidade.

Mário Magalhães diz que das pessoas que conheceu, poucas tiveram perdas como Zilda: Marighella, em 4 de novembro de 1969, quando o guerrilheiro foi fuzilado em São Paulo. Ela estava no exterior.

No final de janeiro de 1970, prenderam Zilda no Rio e a torturaram à exaustão, mas nenhuma informação sobre a guerrilha foi obtida. Depois, ela diria que guardou seus segredos para honrar a memória de Marighella: “Eu via o Marighella na minha frente. Pensava: 'Carlos Marighella não é homem para ser traído, eu jamais trairei Carlos Marighella'''. Ele já estava morto.

Zilda sentiu dores nos joelhos, decorrentes do pau-de-arara, até o fim da vida. Com ajuda de companheiros e amigos, escapou do hospital em que a haviam internado, depois da simulação de surto de insanidade. Era 1º de maio de 1970, e ela só regressaria do exílio em 1979.

Quando Zilda estava fora do Brasil, agentes da ditadura mataram seu filho Alex, aos 22 anos. Em seguida, Iuri, com 23.

(Com informações do Blog do Mário Magalhães)

Unesp lança livro sobre obra de Lenin e o disponibiliza para download gratuito


A Unesp (Universidade Estadual Paulista) lançou este mês de novembro o livro “Lenin: teoria e prática revolucionária” e o disponibiliza para download gratuito em seu site.

O livro surgiu a partir da realização do “VI Seminário Internacional Teoria Política do Socialismo – Lenin 90 anos depois: política, filosofia e revolução”, em novembro de 2014.

Organizado pelos professores Anderson Deo, Antonio Carlos Mazzeo e Marcos del Roio, a obra tem seus capítulos produzidos a partir da experiência do evento, nas trocas de conhecimento e debates realizados pelos conferencistas durante o seminário.

A Faculdade de Filosofia e Ciências da Unesp informa que “o livro é uma importante iniciativa para o resgate e difusão da problemática teórica e prática proposta por Lenin, sobretudo entre as novas gerações”.

Para fazer o download do livro, clique aqui. E clique aqui para saber como adquirir o livro impresso.

A morte de Marco Antonio Coelho 1926-2015

                                                                   
                                                                        
Uma ironia do destino acabou juntando biografo e biografado num mesmo desfecho.  O jornalista mineiro Marco Antonio Coelho, autor de uma história do rio Doce, morreu, aos  89 anos, no mesmo mês em que o rio ao qual ele dedicou anos de estudo foi declarado agonizante em consequência de um desastre ambiental provocado por uma mineradora.

Marco Antonio Tavares Coelho nasceu em 1926 em Belo Horizonte, formou-se em direito mas foi no jornalismo que ele encontrou a sua grande paixão profissional.  Militante político comunista foi um dos dirigentes do PCB na época do golpe militar de 1964, quando era deputado estadual no Rio de Janeiro. Teve seu mandado cassado e foi preso em 1975, quando foi torturado barbaramente por ser o editor do jornal, Voz Operária,  do Partido Comunista Brasileiro.

Após a redemocratização continuou no jornalismo, foi editor da revista do Instituto de Estudos Avançados, da Universidade de São Paulo ( USP) e autor de dois livros. Uma autobiografia com o titulo de “A Herança de um Sonho” , e uma obra histórica sobre o rio Doce e a a mineração em Minas Gerais. 

O livro ” Rio Doce, a espantosa evolução de um Vale”,  lançado em 2011 já aponta riscos ambientais que acabaram se materializando tragicamente no desastre de Mariana. (Com o Observatório da Imprensa)

Raimundo Santos: Marco Antônio Coelho e a política das soluções positivas

No sábado passado faleceu o comunista Marco Antônio Coelho. Ao lado de Caio Prado Jr., Armando Lopes da Cunha e Armênio Guedes, Marco Antônio Coelho foi um dos principais formuladores da política contemporânea do PCB. Dois textos de Caio Prado são bem expressivos. O primeiro é “Os fundamentos econômicos da revolução brasileira”, publicado em fevereiro de 1947 na Tribuna de Debates da Voz Operária preparatória do IV Congresso do PCB, quando da sua primeira convocatória (o congresso só veio a realizar-se em 1954).

Nesse artigo o historiador valoriza a construção do capitalismo no Brasil daqueles anos, desde a perspectiva das duas reestruturações da nossa formação social (a da “vida econômica” e a da “vida política”) com as quais ele definia a "revolução brasileira” (expressão sempre usada por ele).

O segundo é Diretrizes para uma política econômica brasileira, publicado em 1954. Neste livro, o militante discute as teses desenvolvimentistas da CEPAL e interpela Keynes, desde o ponto de vista dos interesses do conjunto da população, a que deve servir a economia nacional, defendendo uma industrialização menos “eventual”,menos “artificial”, como a que teve lugar por meio do processo de substituição de importações, e que fosse mais estruturada, capaz de incorporar a força de trabalho nacional de modo realmente produtivo.

Os textos formulativos de Armando Lopes da Cunha e Armênio Guedes foram publicados por ocasião dos debates no PCB sobre a denúncia do estalinismo feita por Kruchev no XX Congresso do PC soviético em 1956; e o de Marco Antônio Coelho foi escrito depois da Declaração de março de 1958 que anunciou a nova politica do PCB.

Armando Lopes da Cunha publicou na Voz Operária de 27/10/56 o artigo “O Programa e os caminhos do desenvolvimento do Brasil”, no qual rompeu direta e abertamente com visão estagnacionista da tese do “Brasil-colônia dos Estados Unidos”. 

Era esta visão terceiro-mundista trazida da III Internacional que sustentava o sectarismo do Manifesto de Agosto de 1950 e que ainda continuava presente no Programa do PCB aprovado no IV Congresso de 1954, com a tese: “O desenvolvimento do país e a conquista da plena independência do país só serão possíveis após a derrubada do ‘atual governo’” (Dutra e Getúlio), governo visto como expressão pura e simples dos latifundiários e dos grandes capitalistas serviçais dos imperialistas norte-americanos.

Lopes da Cunha chamava a atenção para o fato de que, naqueles anos 1950, era inegável que o país se desenvolviae podia avançar na sua independência nacional bem como na própria modificação do governo, “nos quadros da atual Constituição”. 

Esse reconhecimento impunha tanto mudanças programáticas como o abandono completo da “tática estreita, sectária e exclusivista”; e exigia uma ampla frente única que unisse todos os setores interessadas no desenvolvimento nacional.

Armênio Guedes publicou em setembro de 1957 na revista Novos Tempos, editada por um grupo de renovadores após serem derrotados na discussão sobre o XX Congresso, um artigo chamado “Algumas ideias da frente única no Brasil”, no qual desconstrói a mentalidade dogmática que impedia divisar a realidade brasileira, e delineia os contornos da estratégia de convergência de forças progressistas e democráticas. 

Esse traços da estratégia de frente única vão se notar na redação da Declaração do Comitê Estadual do PCB da Guanabara, de março de 1970, texto emblemático da política de resistência democrática ao regime de 1964, a partir da atuação na conjuntura, atentando para os seus problemas e os processos e tendências em curso. 

Guedes também publicou logo após a Declaração de março de 1958, na Voz Operária de 28/06/58,o texto “Uma positiva das forças nacionalistas”, seguindo com o tema da frente única ao analisar um momento bem específico do governo JK.

Essa reorientação teve mais uma contribuição com o artigo de Marco Antônio Coelho publicado na Tribuna de debates preparatória do V Congresso de 1960, chamado justamente de “A tática das soluções positivas”. 

Neste texto, Marco Antônio Coelho refere os contornos da nova estratégia à postura agregativa do PCB na sua perspectiva das “reformas estruturais” do capitalismo, neste ponto dialogando com as teses (que ele cita) de Palmiro Togliatti apresentadas ao IX Congresso do Partido Comunista Italiano, em 1958.

Com os traços expressos nos textos dos quatro formuladores, podemos dizer, com a distância do tempo, que, antes de ter obsessão pelo poder, o PCB transformou-se em um partido de mentalidade reformista, comprometido com a política de frente única, por meio dela foi consolidando sua definição democrática. 

Ao longo de anos, afastando-se da disputa doutrinal como forma de afirmar identidade, o PCB se concentrou em buscar uma orientação de natureza política, lúcida e eficaz nas questões postas pela conjuntura, visando balizar o seu agir, paciente e determinado, sempre trabalhando com perspectiva e com o hábito da avaliação das suas táticas, autocrítica e retificações.

Esse pecebismo contemporâneo já foi reverenciado por Hélio Jaguaribe que certa vez afirmou (esta é uma observação de Gildo Marçal Brandão) que os comunistas tinham uma prática responsável (e uma “péssima teoria”, disse também o isebiano histórico, referindo-se ao marxismo-leninismo dos comunistas). O próprio Armênio Guedes reconheceu que o seu partido comunista entre 1950 e 1970 formou boa parte quadros políticos que (em 2000, ano deste seu comentário) exerciam funções dirigentes no país.
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[Texto de Raimundo Santos, domingo, 22 de novembro de 2015. Especial para o blog Democracia política e novo reformismo].