O programa institucional do PcdoB, exibido na televisão na última quinta-feira, revela sem disfarce seu reformismo e oportunismo, além de sua falta de escrúpulos. Assistimos uma grosseira falsificação da história.
Se nosso Partido fosse legalista, poderíamos reclamar no Procon, no TSE, na justiça comum, contra a tentativa de seqüestro da história do PCB: propaganda enganosa, falsidade ideológica, estelionato político, apropriação indébita.
Todas as pessoas razoavelmente informadas, todos os intelectuais, historiadores, militantes políticos e sociais sabem que o PcdoB foi fundado em 1962, por uma insignificante minoria do Comitê Central do PCB, após ser fragorosamente derrotada no V Congresso do nosso Partido. Não foi o único partido maoísta (com nosso respeito ao inspirador político desta corrente) fundado no início dos anos 60.
Em quase todos os países, invariavelmente por iniciativa de minorias dos Partidos Comunistas fundados na década de 20, no bojo da Revolução Russa, surgiram novos partidos ligados ao Partido Comunista Chinês, então em divergência com o da União Soviética. Esses novos partidos adotaram como receita universal a experiência chinesa de revolução do campo para a cidade. Este também foi o caso do PcdoB que, aprofundando o afastamento das posições soviéticas, alguns anos depois se ligou ao Partido do Trabalho da Albânia, aderindo de corpo e alma às formulações teóricas de Enver Hoxha.
Num roteiro de farsa, o PcdoB, que em 2012 comemorará 50 anos anunciou que completará 90, apropriando-se, de forma oportunista, de uma história que sempre repudiou e negou, sobretudo a ligação do PCB com o Partido Comunista da União Soviética, com o Movimento Comunista Internacional e inclusive com a Revolução Cubana, da qual esses dissidentes foram ferrenhos opositores.
Esta tática – de renegar hoje sua própria trajetória para tentar se apropriar da história que rejeitaram em 1962 - vem sendo aplicada em razão de uma realidade que os dirigentes desse partido nunca imaginaram possível: a reconstrução revolucionária do PCB. Com a transformação do PcdoB numa organização social-democrata na prática (na linha política e no caráter do partido), precisam fingir que são o PCB, fundado em 1922, confundindo a opinião pública.
Para falsificar a história, exibiram como membros do PcdoB camaradas que morreram antes da criação deste partido e outros que, na cisão de 1962, notoriamente ficaram com a maioria, permanecendo no PCB.
A manipulação mais grosseira, absurda e desrespeitosa foi a de querer reivindicar os legendários Luiz Carlos Prestes e Olga Benário como expressões do partido que fundaram em 1962. Na verdade, os principais protagonistas dos embates políticos travados no momento desta cisão foram João Amazonas, que liderou a fundação daquele PCdoB original, e Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança, que ficou no PCB e foi seu Secretário Geral até 1979, quando saiu do Partido, por divergências com a maioria de sua direção.
Se o verdadeiro comunista João Amazonas estivesse vivo ficaria envergonhado de assistir à manipulação de sua própria história e pelo reformismo que tomou conta do partido que criou, pensando que seria revolucionário.
No conteúdo político do programa o reformismo aparece com toda a sua expressão. Em 2011, exibem um programa eleitoral voltado para as eleições de 2012! Como todos os partidos da ordem, passam os anos ímpares se preparando para as eleições dos anos pares!
Com efeitos especiais, exibiram cinco atuais parlamentares que já estão em campanha para prefeituras, uma manobra comum a todos os partidos eleitoreiros. No meio de seus mandatos, sem risco de perder nada, senadores e deputados federais se candidatam a prefeitos de grandes cidades. Ganham de qualquer forma. Vencendo as eleições, se tornam prefeitos. Se as perdem, antecipam em dois anos a campanha para sua reeleição ao parlamento.
O discurso pasteurizado apresentado por esses candidatos não tem qualquer diferença com o de qualquer político profissional da burguesia. Eis os adjetivos com que definem como serão as cidades que governarão, caso eleitos: limpas, tranqüilas, planejadas, de paz, organizadas, humanas, sustentáveis, dignas, justas.
Em 10 minutos de programa, não houve menção alguma ao imperialismo e ao capitalismo. Parece que, para esse partido, nem o imperialismo está inventando guerras contra os povos nem os trabalhadores do mundo estão lutando contra as retiradas de seus direitos, em meio à crise sistêmica do capitalismo. Pelo contrário, a principal proposta apresentada pelo presidente nacional do partido é uma conciliação de classe: um pacto social para um maior desenvolvimento capitalista do Brasil, envolvendo, numa união nacional, o governo, os trabalhadores e o empresariado.
Jovens, certamente aspirantes a vereador, aparecem no programa se dizendo socialistas (não comunistas) e explicam o que significa ser socialista. Segundo eles, ser socialista “é fazer as cidades mais justas”, “é ser ético sempre”, ”é tratar as pessoas com dignidade”, “é ser responsável com o dinheiro público”.
Aliás, por falar em dinheiro público, o PCB, na crítica política e ideológica que faz ao PcdoB, não centrará suas divergências nas recentes denúncias contra o Ministro dos Esportes. Ficamos com o benefício da dúvida, aguardando os desdobramentos do caso e a apuração das denúncias, pela CGU, MPF, Polícia Federal, Procuradoria Geral da República, STF e inclusive pelo TCU, sobre supostos desvios, no total de R$49 milhões, que teriam ocorrido em 67 convênios do Ministério dos Esportes com entes públicos e privados, entre os quais muitas Ongs, algumas de fachada. Esta pode ter sido, inclusive, a principal motivação da candidatura do deputado Aldo Rabelo a Ministro do TCU.
Mas, como dissemos, nossa discussão é no campo político, na tática e na estratégia que devem adotar os que se reivindicam comunistas.
Até porque não somos falsos moralistas e não entramos na onda da direita que trabalha o tema da corrupção (inerente à política institucional na sociedade capitalista) para afastar os trabalhadores de seus verdadeiros partidos e da luta política, indispensáveis para acabar com a exploração. Estimulam o onguismo e o movimentismo, de forma a que os cargos públicos sejam ocupados majoritariamente pelos de cima, alguns originários das classes dominantes, outros terceirizados.
A luta do PCB contra a corrupção é aberta e radical, no sentido de ir às raízes do problema. É parte da luta contra o capitalismo. Dizemos claramente que a corrupção é inerente ao capitalismo, é sistêmica. De alguma forma, mais ou menos ”esperta”, é usada por todos os partidos que apostam e jogam no cassino da democracia burguesa, onde a concorrência depende de financiamentos privados e caixas dois.
Nas eleições de 2010, o PcdoB recebeu doações da Coca-Cola, do Bradesco e do MacDonald's, empresas patrocinadoras das Olimpíadas de 2016 e da Copa do Mundo de 2014, eventos coordenados pelo Ministério dos Esportes.
Independente dos resultados da apuração das denúncias, um fato já é cristalino: integrado ao sistema, o PcdoB, durante os nove anos em que dirige o Ministério dos Esportes e outros espaços de poder, se enredou na promiscuidade com esquemas, públicos e privados, e com delinquentes como o que hoje acusa o Ministro, mas que já foi filiado e candidato pelo mesmo partido do acusado. Não se armam esquemas de financiamento eleitoral sem sujar as mãos, sem acordos pragmáticos e espúrios que levam partidos com história de luta a conciliarem com o agronegócio e o capital em geral, com torturadores e assassinos, com as multinacionais do petróleo. Um partido que se diz comunista mas que participa acriticamente dos governos burgueses que lhe abram as portas, se torna um bombeiro da luta de classes, refém de seu oportunismo, para não perder seus cargos.
É notório que, como nos casos de Ministros caídos e por cair, independentemente de seu partido, sempre há fogo amigo ou inimigo. Os políticos profissionais e a mídia burguesa trabalham com dossiês contra todos, inclusive aliados de ocasião; não se sabe o dia de amanhã! Mas só é abatido na luta pelo poder no estado burguês quem tem telhado de vidro. Não adianta vir agora evocar o anticomunismo como causa das atuais denúncias, até porque não se comportam como comunistas, apesar do nome. Os cinco Ministros que já foram abatidos no governo Dilma eram de partidos da ordem. Um deles era da cota pessoal do maior dos oligarcas brasileiros, o indefectível José Sarney. E assim mesmo caiu!
Na década de 80, eram poucas as diferenças entre o PCB e o PCdoB. Ambos eram reformistas e apostavam tudo na questão eleitoral, em aliança com partidos burgueses. A diferença é que, enquanto a militância do PCB, em 1992, derrotou seus reformistas, no PcdoB os reformistas não só ficaram mais reformistas como se multiplicaram, alguns já sendo deformados desde a juventude, para garantir o reformismo futuro. A UNE, de saudosa memória, transformou-se numa escola de quadros e parlamentares reformistas.
A causa da voracidade por “recursos não contabilizados” é o reformismo deslavado. A prioridade na ocupação de cargos públicos, seja de que esfera ou instância for, é de tal ordem que até a atuação dos seus militantes de base nos movimentos populares (muitos deles honrados e combativos, alguns ainda comunistas) está atrelada aos objetivos eleitorais de um partido que incha, que filia pela internet futuros candidatos, venham de onde vierem, mesmo do PMDB, PSDB ou DEM e até criaturas sinistras que depois se voltam contra seus criadores, por questões de partilha.
Esperamos que um partido intitulado comunista não caia na vala comum dos partidos burgueses, abatido por aqueles que querem o Ministério dos Esportes não para acabar com a promiscuidade, mas para administrá-la. Ou o PcdoB se depura e corrige seu rumo ou que mude de nome, o que seria uma atitude de respeito aos verdadeiros comunistas.
O desgaste provocado pela degeneração do PcdoB tem sido muito grande para a luta dos comunistas e outros revolucionários, permitindo à mídia hegemônica criar uma imagem de que todos são “farinha do mesmo saco”, inclusive os comunistas.
O PCB não pode e não deve abrir mão de se diferenciar dos reformistas e oportunistas, para que os trabalhadores não os confundam com o nosso Partido. Não podemos deixar de zelar pela memória de todos nossos camaradas que honraram o PCB , muitos pagando com a própria vida, e por uma história de 90 anos de luta, heróica, cheia de erros e acertos, de vitórias e derrotas, de perseguições e acusações de toda sorte, mas sempre de mãos limpas.
VIVA OS 90 ANOS DO PCB!
PCB – Partido Comunista Brasileiro
Comitê Central
25 de outubro de 2011
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