O cinegrafista teve morte cerebral decretada (Crédito: Acervo Pessoal/TV Band)
Igor Waltz*
Santiago Ilídio Andrade, cinegrafista da TV Bandeirantes atingido por um rojão durante um protesto contra o aumento das passagens, teve morte cerebral diagnosticada nesta segunda-feira, 10 de fevereiro. A informação foi divulgada pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro. O repórter de 49 anos estava internado desde a última quinta, dia 6, no CTI do Hospital Souza Aguiar, no Centro.
Andrade havia sofrido afundamento do crânio e foi submetido a uma cirurgia de aproximadamente quatro horas. Desde então, estava em coma induzido no CTI da unidade e seu estado de saúde era considerado grave.
A explosão foi registrada por fotógrafos, cinegrafistas e câmeras de vigilância instaladas nas proximidades da Central do Brasil. No sábado, 8 de fevereiro, pós a divulgação das imagens, o estudante universitário e tatuador Fábio Raposo, de 22 anos, se apresentou à 17ª DP (São Cristovão) e confirmou à polícia ter passado o rojão ao homem que acendeu o artefato que atingiu o cinegrafista, mas disse não conhecer sua identidade. Ele deve cooperar com a polícia na identificação do responsável em troca do benefício da delação premiada.
No domingo, 9 de fevereiro, a Polícia Civil do Rio de Janeiro prendeu Raposo, indiciado como coautor da explosão que matou o cinegrafista. Ele foi detido na casa dos pais, no Recreio dos Bandeirantes, e levado na manhã desta segunda-feira para o Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, na Zona Oeste. A polícia pedirá que seja feito um retrato falado na tentativa de identificar e localizar o responsável.
Pela explosão que feriu gravemente o profissional da Band, Raposo foi indiciado por homicídio qualificado pelo uso de artefato explosivo e pelo crime de explosão. Se condenado, ele pode receber uma pena de mais de 30 anos de prisão. Ele teve prisão preventiva decretada por 30 dias. Seu advogado afirmou que já tem a identidade do outro envolvido, mas não revelou o nome.
Carreira
Cinegrafista há mais de 20 anos, Santiago trabalhava na Band havia 10. Na emissora, participou de diversas reportagens sobre as dificuldades enfrentadas pelos usuários de transporte público na cidade. A cobertura jornalística do tema – que motivou o início dos protestos no Rio em 2013, após o anúncio do reajuste da tarifa de ônibus – lhe rendeu dois prêmios jornalísticos de Mobilidade Urbana, em 2010 e 2012, ao lado do repórter Alexandre Tortoriello.
Desde 2013, ele registrou para a TV Bandeirantes diversas manifestações na cidade e estava escalado para participar da cobertura jornalística da Copa do Mundo este ano.
Além disso, Santiago Andrade participou de grandes coberturas, eventos esportivos e incontáveis reportagens sobre a “guerra” contra o tráfico de drogas nos morros cariocas. No final de 2013, o cinegrafista participou do curso para jornalistas em áreas de conflito, ministrado pelo Exército.
O cinegrafista também atuou na área de cultura. Em 2012 e 2013, foi convidado para fazer reportagens, ao lado da repórter Camila Grecco, sobre o carnaval de San Luiz, na Argentina.
Carioca, criado em Copacabana, na Zona Sul do Rio, Santiago tinha outras duas paixões, além do jornalismo: o Flamengo, seu time de coração, e a música. Aficionado por discos, ele falava com orgulho da época em que foi DJ.
O profissional deixa uma filha e três enteados. Em entrevista emocionada, a mulher do cinegrafista, Arlita Andrade disse que “falta amor” às pessoas responsáveis por ferir gravemente seu marido. A declaração foi dada antes da divulgação da morte cerebral do cinegrafista. Eles destruíram uma família. Uma família que era unida, muito unida mesmo”, lamentou Arlita Andrade.
A ocorrência na última quinta motivou notas de repúdio e pedidos de investigação por parte de sindicatos de jornalistas e associações ligadas à imprensa.
Entidades pedem punição
Os presidentes da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert), Daniel Slaviero; da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Schröder; e da Associação dos Repórteres Fotográficos e Cinematográficos do Rio (Arfoc), Luiz Hermano, defenderam nesta segunda-feira, dia 10, punição aos responsáveis pelo ataque ao cinegrafista da TV Bandeirantes.
“Nós, jornalistas de imagem, exigimos que as autoridades de segurança do estado do Rio de Janeiro instaurem imediatamente uma investigação criminal para apurar quem defende, financia e presta assessoria jurídica a este grupo de criminosos, hoje assassinos, intitulados black blocs, que agridem e matam jornalista e praticam uma série de atos de vandalismos contra o patrimônio público e privado”, diz o texto da Arfoc, assinado por Hermano.
A Abert e a Fenaj também se manifestaram sobre o caso após participarem, no Senado Federal, de uma reunião temática do Conselho de Comunicação Social (CCS) do Congresso Nacional. O presidente da Comissão Temática da Liberdade de Expressão do CCS, Alexandre Jobim, que é representante das empresas de imprensa escrita, vai pedir ainda a aprovação de nota de repúdio contra as agressões a trabalhadores da imprensa, na primeira reunião do órgão, no Senado. Após a aprovação pelo conselho, os conselheiros pretendem encaminhar a nota ao presidente do Congresso, senador Renan Calheiros, ainda nesta segunda-feira, dia 10.
Relatório da conselheira Wrana Panizzi, discutido pela Comissão Temática da Liberdade de Expressão na manhã de hoje, recomenda ainda a aprovação de três projetos de lei em tramitação no Congresso que prevêem o uso de coletes à prova de bala por profissionais da comunicação. São eles os projetos de lei do Senado (PLS) 743/11 e 699/11 e o Projeto de Lei 2.658/11, em tramitação na Câmara dos Deputados. Pelas propostas, os coletes teriam que ser fornecidos pelas empresas empregadoras quando o profissional fosse cobrir operações policiais. O relatório ainda precisa ser aprovado pela plenária do conselho. A intenção da comissão temática é evitar casos como o da agressão ao repórter cinematográfico da TV Bandeirantes
Para o presidente da Abert, o governo deve punir exemplarmente os responsáveis pela agressão. “Toda vez que um profissional de imprensa é impedido de exercer sua atividade, quem mais perde é a sociedade brasileira por deixar de ser informada”, disse Slaviero.
Celso Schröder lamentou a morte do jornalista e disse que o fato “não pode passar desapercebido, não pode ser mais uma estatística”. “Exigimos do Estado brasileiro uma pronta reação para barrar esse tipo de violência. Seja quem for – as investigações já têm um suspeito –, mas seja quem for o autor, é preciso chegar a um fim. Todos os mandantes, os responsáveis, todos os autores intelectuais ou físicos dessa morte devem ser punidos”, declarou.
Para o jornalista, “a democracia foi atingida” com a morte de Santiago. “A base democrática da informação foi atingida. Temos que reagir a isso”, disse.
A Abert, a Fenaj e a Associação Nacional de Jornais (ANJ) pediram uma audiência com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para discutir o assunto. “Queremos externar nossa preocupação com essa escalada de violência e escutar do Poder Executivo quais são as medidas que eles pretendem tomar para que isso não ocorra mais no nosso país”, disse Slaviero. A audiência ainda não foi marcada, de acordo com o presidente da Abert.
O Conselho de Comunicação Social também poderá marcar uma audiência pública com presença dos ministros Cardozo e Maria d o Rosário (Direitos Humanos). “Queremos que o governo também crie e adote politicas e procedimentos necessários para que garanta o trabalho dos profissionais e dos manifestantes que têm pacificamente demostrado a sua insatisfação e não desse grupo minoritário de baderneiros e arruaceiros”, afirmou Slaviero.
(*) Com informações do G1, UOL, revista Exame e Agência Câmara.(Com a Associação Brasileira de Imprensa)
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